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Artigo: Captura da ANS avança a passos largos

Pedro Paulo de Salles Dias Filho, Carlos Octávio Ocké-Reis e Isabela Soares Santos *

A autonomia da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) face aos agentes econômicos é fundamental para a fiscalização do mercado de planos de saúde, prerrogativa essencial no rol de suas funções regulatórias.

Desse modo, causa preocupação entre os sanitaristas e os órgãos de defesa do consumidor a indicação na Comissão de Assuntos Sociais do Senado do presidente da Confederação Nacional de Saúde (CNS) para a direção da ANS.

Uma vez capturada pelo poder econômico, a ANS sancionaria a autorregulação do mercado de planos de saúde, em detrimento do direito do consumidor, da concorrência regulada e do interesse público.

É inquestionável a vasta experiência do indicado, dirigente que já presidiu a Federação Internacional dos Hospitais. Entretanto, é prudente nomear o representante de uma entidade que atacou à Lei de regulamentação dos planos de saúde no seu nascedouro?

A CNS foi autora da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 1931-8, questionando o ressarcimento aos cofres públicos dos atendimentos dos usuários de planos realizados e pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Supremo Tribunal Federal não acolheu, em 2003, o requerimento da CNS relativamente à inconstitucionalidade do ressarcimento. Contudo, deu provimento parcial ao recurso, suspendendo a prerrogativa de a ANS autorizar reajustes anuais das mensalidades dos planos de saúde individuais contratados anteriormente à Lei 9.656 de 1998.

Nessa linha, foi celebrado um acordo para a aplicação de tais reajustes tendo como base a variação do custo médico-hospitalar (VCMH). Esse índice não espelha a variação dos custos dos prestadores, mas, na verdade, a variação dos gastos das operadoras com consultas, exames e internações (exceto os dispêndios comerciais e administrativos).

Cabe destacar, a aplicação da VCMH fere a ideia de se praticar uma regulação por desempenho – modelo praticado hoje pela agência reguladora em relação ao reajuste de preço dos planos individuais novos – o qual procura eliminar os excessos de assimetria de informação, para evitar que as ineficiências das operadoras sejam repassadas aos consumidores, sem o perigo adicional de se alimentar a indexação de um setor importante da economia.

Segundo dados da ANS, isso afeta 1,4 milhões de usuários de planos antigos (dez. 2013), contratados, em geral, por idosos que utilizam com frequência bens e serviços privados de saúde. Sem o amparo da Lei, esse grupo tem sofrido reajustes de preço abusivos, pois mesmo ‘protegidos’ por Termos de Compromisso assinados entre a ANS e algumas operadoras (como no caso da Amil, Bradesco Saúde, Sul América, Itaúseg e Golden Cross), os reajustes têm superado o índice autorizado pela ANS para os planos individuais contratados a partir de 1999:

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É gritante a disparidade entre os reajustes autorizados para os planos individuais novos e para os planos antigos dessas cinco operadoras que assinaram Termos de Compromisso com a ANS: o poder de barganha de tais empresas acaba evidenciando a baixa capacidade regulatória da agência no plano econômico-financeiro.

Esse foi o triste legado da CNS para os consumidores, de maneira que resta totalmente inadequada a indicação de seu dirigente máximo para ocupar uma das diretorias da ANS, sob pena de suspeição no trato da regulação dos planos privados de saúde, em última instância, sob a responsabilidade do governo federal.


* Pedro Paulo de Salles Dias Filho é economista e mestre em Saúde Coletiva pelo IMS-Uerj, Carlos Octávio Ocké-Reis é técnico de planejamento e pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Diest/Ipea) e Isabela Soares Santos vice-presidente do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) e Pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz).

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