O professor Elias Rassi Neto do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás, elaborou o editorial da mais recente edição da revista Cadernos de Saúde Pública. Elias foi o presidente do 11º Congresso Brasileiro de Saúde Pública, o Abrascão 2015. No editorial, Elias aponta como o momento político vivido pelo Brasil desde 2013, junto com o resgate das bandeiras do movimento da reforma sanitária, definiram o tema desse congresso: Saúde, Desenvolvimento e Democracia: O Desafio do SUS Universal.
Confira aqui o a íntegra do Editorial:
A Saúde Coletiva brasileira no Abrascão 2015: Goiânia, Capital do Cerrado
Em novembro de 2012, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, a assembleia final do 10o Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, mais conhecido como “Abrascão”, aceitou a proposta para realizar sua 11a edição em Goiânia. Naquele momento, já com os resultados das eleições municipais, o cenário parecia indicar um fortalecimento das políticas mais à esquerda. O governo Dilma estava na metade.
Nas eleições subsequentes, uma vitória apertada reelegeria a presidente Dilma Rousseff no segundo turno. Pela primeira vez no período pós-ditadura, uma reeleição presidencial se deu com margem tão reduzida (3,28%), muito embora margem reduzida também ocorrera em 1989 (7,08%) com a eleição de Fernando Collor de Mello. Os momentos posteriores estão ainda muito vivos e certamente farão parte marcante da história do Brasil.
Aliado à grande insatisfação e reprovação do governo, nesse momento apareceram expressivos sinais de descolamento das populações com as diferentes representações políticas. Os parlamentos também demonstraram a sua incapacidade para articular, conduzir ou mesmo catalisar processos de encontros com a vontade popular.
As grandes manifestações de 2013 precederam as eleições presidenciais e, pelo menos até agora, explicitam uma profunda e ainda não resolvida crise do nosso sistema representativo e apontam para a necessidade de novas formas de organização política.
Parecem expressar uma busca de novos modelos que resgatem a representatividade e alguma coerência entre os parlamentos e as ruas, ou que condicionem os executivos federal, estaduais e municipais às necessidades populares e recoloquem a sociedade na arena política. Essa é uma tarefa difícil para tempos confusos e de parcos recursos.
Tudo indica que 2013 ainda está no ar, e é nesse cenário que ocorreu o 11o Abrascão, em Goiânia. Muito embora essa discussão já fizesse parte da preparação do congresso, qualquer certeza antecipada configuraria mero exercício de futurologia.
Em fevereiro de 2014 realizamos em Pirenópolis, Goiás, um primeiro seminário preparatório, que associava ao processo de maturação temática para o nosso congresso o propósito de fortalecer a 15a Conferência Nacional de Saúde. Foi esse o motivo para que o Abrascão, tradicionalmente realizado às vésperas natalinas, fosse antecipado para o final das férias escolares de julho, coincidindo também com o período de baixa ocupação hoteleira na Capital do Cerrado.
Inspirados no papel do movimento da reforma sanitária e nas bandeiras expressas como “saúde e democracia” durante as décadas de 1970 e 1980, decisivas para a reconquista do direito de escolha dos brasileiros, a diretoria, junto aos diversos e inúmeros fóruns da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), definiram o tema desse congresso:Saúde, Desenvolvimento e Democracia: O Desafio do SUS Universal.
As decisões que conduziram os passos organizacionais foram baseadas no propósito de partilhar com os diversos grupos de trabalho e comissões as definições temáticas e os convidados para as 118 mesas-redondas e palestras, e a organização das sessões de comunicações orais, verdadeiros colóquios entre pesquisadores, profissionais e estudantes. Foram 479 sessões com a apresentação de 3.509 trabalhos, além de 60 cursos e oficinas de trabalho.
Saímos desse congresso com mais força e energia para este ano, decisivo na manutenção dos princípios fundantes do Sistema Único de Saúde (SUS) e aprofundamento da democracia brasileira.
Os ataques ao SUS são e serão também vigorosos. Apostam na desinformação, na crise e na sedução mercantil da assistência à doença. Insistem na medicalização como fonte de novos financiamentos públicos e privados.
Os fóruns da Abrasco têm capacidade de influenciar decididamente os rumos das políticas de saúde e, nesta edição do Abrascão, que ocorreu às vésperas da 15a Conferência Nacional de Saúde, acumulamos forças para este período de lutas e novas conquistas democráticas.