A Política Nacional de Vigilância em Saúde (PNVS) – Resolução nº588, foi aprovada por unanimidade durante a reunião mensal do Conselho Nacional de Saúde (CNS) em 12 de julho. O documento foi construído por militantes da saúde de todos os estados e territórios brasileiros e apresentado durante a 1ª Conferência Nacional de Vigilância em Saúde, que ocorreu entre os dias 27 de fevereiro e 2 de março de 2018. A consolidação da Política foi feita pela Comissão Instersetorial de Vigilância em Saúde do CNS e norteará as ações de vigilância do Ministério da Saúde. O lançamento ocorreu junto ao debate ‘Os Desafios na Construção da Política Nacional de Vigilância em Saúde (PNVS)’, promovido pelo 12º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva (Abrascão) que aconteceu dos dias 26 a 29 de julho, na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com cerca de dez mil pessoas no Rio de Janeiro (RJ).
Ronald dos Santos, presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), mencionou que o tema da mesa poderia ser substituído por ‘Desafios da implantação da Política Nacional de Vigilância em Saúde’ já constituída. Atribuiu a conquista à participação popular movida em torno de três palavras: território, proteção e democracia. “Hoje o Brasil tem uma política construída a partir de uma gestão participativa e da demanda social provocada por um mosquito, que comoveu o Brasil inteiro em 2016 com o zika e nos permitiu ter força popular e política para colocar em prática aquela tarefa de fazer a mudança do modelo de gestão e atenção à saúde que começou há 30 anos. O que tivemos em troca foi a reafirmação da saúde como direito, apontando a necessidade de mudança do modelo de atenção, que nos permitiu construir uma trajetória que aprovou com as mais diferentes visões, construir a reafirmação de uma agenda de defesa do SUS, do trabalho, da necessidade de integração não só entre as vigilâncias, mas trazendo a vigilância como elemento central em um modelo de atenção a saúde”, comemorou. O presidente do CNS também apontou como principal obstáculo para implantação da PNVS o desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS). “Ao mesmo tempo que conquistamos a PNVS, estão acabando com a Política de Saúde Mental, aniquilando a Política Nacional de Atenção Básica, estão destruindo completamente a nossa capacidade regulatória”, disse.
Durante a sua fala, Ronald convidou Fernando Pigatto, representante dos usuários e usuárias pela Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam), para falar sobre a intensa participação social no processo de construção da política. “É uma conquista e tenho dito isso a todo momento. Quando começamos essa discussão, o grande desafio era incluir a participação de usuários e usuários nesse processo. Por isso, desde o início procuramos no documento orientador, levar em consideração a bibliografia, uma linguagem acessível, que todos pudesse ler, se engajar. Também realizamos as conferências livres, que foram outra forma de buscar a participação da pessoas, incluindo moradores de rua. Com isso, tivemos a participação de 50% de usuários na Conferência Nacional. Essa construção dialogada só será realidade se a gente continuar fazendo debate, fazendo enfrentamento, controle social e que PNVS se faça viva na vida das pessoas. Não é só discurso e teoria que se faz uma política”, afirmou Pigatto.
Desafios
Carmem Fontes de Souza, pesquisadora da Universidade Federal da Bahia (Ufba) fez um breve histórico sobre a discussão da vigilância no Brasil. Segundo ela, já se pensava na construção de uma política desde a década de 1980. Ela chamou atenção para as inúmeras políticas existentes no cenário atual e alertou para que a PNVS não fique apenas no papel. “Os governos não investiram nas mudanças do modelo assistencial e essas mudanças no modelo de atenção propostas pela vigilância acabam sendo atropeladas pela manutenção do modelo medico hospitalocêntrico. Por isso é muito importante como estratégia de resistência construir essa política, mas isso não é suficiente. Nosso desafio é a implementação dessas propostas, o que vai exigir a participação de todos. Tem um documento que significa um avanço, na tentativa de manter os programas de controle de doenças, de epidemias, o programa de cobertura vacinal, mas isso é pouco. O que vamos fazer depois desse congresso para continuar avançando?”, questionou Carmem.
Jorge Mesquita Machado, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Brasília, fez algumas provocações para mostrar que ainda existem “coisas inacabadas”. Ilustrou como uma imagem nebulosa o contexto atual de insegurança e incerteza. “O maior desafio para a implantação da PNVS depende da radicalização da integração das ações de vigilância em saúde e do grau de uma ação integrada, moldada com a participação social e pelos problemas definidos no território de sua abrangência de ação”, argumentou. Jorge também sugeriu a criação de Redes de governanças de vigilância em saúde agindo de forma integrada, organizando os processos de informação, formação e intervenção para garantir a implementação da Política. “A partir da organização de uma prática de informação para ação definidora de processos de intervenções interativos com ações participativas, setoriais e intersetoriais acompanhadas por mecanismos de gestão e governança participativa é que colocaremos em prática a PNVS”, disse.
Por fim, o conselheiro nacional de saúde Vanilson Torres, da Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), recitou o cordel “Que danado é vigilância em saúde”.