A Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco – e a demais entidades da sociedade civil marcaram presença na Audiência Pública da Câmara de Deputados que discutiu a extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – Consea Nacional. Convocada pela Comissão de Direitos Humanos, a atividade aconteceu na manhã da quinta-feira, dia 25 de abril, em Brasília (DF).
A extinção desse importante instrumento de cidadania indutor e fiscalizador do direito humano e constitucional à alimentação adequada e saudável e da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) foi decretada numa das primeiras ações do governo federal, com a publicação da Medida Provisória 870/19, em 1º de janeiro deste ano.
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A audiência foi mais uma entre diversas atividades promovidas pelo Parlamento e que questionam a reorganização do cargos e atribuições do Executivo Federal definida pela MP 870/19 e que, entre outras coisas, esvaziou as atribuições da Funai, deixando ainda mais vulneráveis os povos indígenas. Na tarde do dia 24, a Comissão Mista que analisa a Medida Provisória realizou uma audiência pública, logo após foi reinstalada a Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e Nutricional, que também foi seguida uma reunião da sociedade civil para discutir o tema. No dia seguinte, nova audiência reuniu os atores estratégicos.
“Não me coloco na função de presidente [do Consea] pois não quero ser viúva desse processo. Quero estar no presente e o presente é que a Medida Provisória 870 extinguiu sim o Consea e, mais do que extinguiu, ela [MP] liquidou com uma lei que foi aprovada nesta Casa por unanimidade por reconhecer que o direito humano à alimentação adequada é mais do que urgente. Um país como o Brasil não pode mais conviver nem com fome, nem com má alimentação”. Com essa forte declaração, Elisabetta Recine, professora da UnB, integrante do Grupo Temático Alimentação e Nutrição em Saúde Pública (GTANSC/Abrasco) e que presidiu o Conselho até a MP 870/19, iniciou sua participação na Audiência, reforçando que o Conselho encontra-se desativado e que foi paralisado bem no momento em que iniciava os debates para a realização da 6ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e para a revisão do 3º Plano Nacional de SAN.
Elisabetta destacou as inúmeras ações abraçadas e lideradas pela sociedade para a defesa do Consea Nacional com a compreensão de bem público representado e promovido pelo órgão. “A realização do direito humano à alimentação adequada é um direito que atende a todos e todas as pessoas, no qual a fome é a violação maior, mas é apenas a ponta de um iceberg”.
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Gulnar Azevedo e Silva também foi uma das representantes da sociedade civil que participaram do debate. A presidenta da Abrasco destacou a importância do Consea Nacional por seu importante papel como sistema parceiro do SUS para a promoção da saúde pela garantia da SAN: “Da mesma forma que o SUS é concebido também é o Consea, que tem sua força e sua base no controle social. Se não há controle social, a gente não consegue avançar nas políticas públicas. O SUS está sendo atacado nas suas políticas essenciais, como Atenção Básica, Saúde Mental, Atenção à Saúde Indígena. Se a gente não se unir e não conseguir trabalhar conjuntamente em prol dessas políticas a gente fica muito fragilizado. Fico muito feliz mostrando que a Abrasco e o conjunto da sociedade reagem e estão atentos à defesa das políticas públicas ameaçadas, como a do direito humano à alimentação”.
A docente ressaltou a associação das políticas de austeridade com o quadro de insegurança alimentar, e que a defesa dos direitos cidadãos como expressos na Constituição é um importante papel da sociedade civil. “A austeridade mata e a fome mata, principalmente os mais vulneráveis. O maior índice de mortalidade infantil está associado ao quadro pós-neonatal, ou seja, as crianças estão morrendo de diarreia por conta das condições de alimentação insegura. Temos de defender e destacar que as conquistas da Constituição de 1988 a gente não pode abrir mão”, encerrou Gulnar.
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Além das participações da Abrasco, estiveram presentes Deborah Duprat, subprocuradora-Geral da República e Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC/PGR); Rafael Zavala,representante da FAO no Brasil; Naidison de Quintella Baptista, coordenador Nacional da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN); Valéria Burity, representante da Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (FIAN Brasil); Vanille Pessoa, representante do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), e integrantes de Conseas estaduais e municipais, como São Paulo, Goiânia e outras localidades. Clique e assista a Audiência Pública na íntegra, segmentada pelas participações.
Próximos passos: Para Elisabetta, a participação da Abrasco foi importante por recuperar o que tem sido feito em termos práticos para o desenvolvimento do Consea, bem como a interdependência do SUS com o SISAN. Os próximos passos envolvem o contato direto com os parlamentares que, em um primeiro momento, votarão a matéria na Comissão Mista e a ampliação da mobilização para quando a pauta for à plenário, ainda sem data agendada.
“É difícil prever o quanto foi e será possível sensibilizar os parlamentares que serão responsáveis pela apreciação da MP, mas saímos otimistas e cientes do tamanho do desafio, pois não basta reinstalar o Consea. É igualmente importante garantir a proporcionalidade da sua composição, com a presidência e a maioria de assentos para a sociedade civil, com forte representatividade e diversidade para que os setores titulares de direito e em situação de maior vulnerabilidade estejam presentes e diretamente envolvidos na garantia da SAN”, completa a docente.