Nas últimas semanas, a Abrasco teve o orgulho de receber o etíope Dereje Gebread e a bengali Sharmila Huda. Eles estiveram no Brasil por meio do programa de cooperação e intercâmbio internacional promovido pela Federação Mundial das Associações de Saúde Pública (WFPHA). A visita foi acertada durante o 14º Congresso Mundial de Saúde Pública, realizado em Calcutá, Índia, em fevereiro.
Dereje é funcionário da Secretaria Executiva da African Federation of Public Health Association (AFHA), fundada num encontro panafricano realizado na Costa do Marfim em 2011 . Formado em Ciências Sociais e com especialização em Estudos Diplomáticos, ele é responsável pela programação das atividades coligadas da federação com as entidades nacionais associadas, atualmente, em número de 25, e com sede em Adis Abeba, Etiópia.
Médica, mestre em Farmacologia e professora assistente no Blangladeshian Medical College, Sharmila é integrante da Public Health Foundation of Bangladesh (PHFBD), entidade não-governamental fundada em 2012 e que conta com pesquisadores, professores, profissionais e voluntários desenvolvendo ações tanto no campo das políticas públicas quanto em atividades de assistência para a população de Bangladesh.
Realizado pelo segundo ano consecutivo, o projeto de cooperação e intercâmbio da WFPHA visa a troca de conhecimentos entre as associações de saúde pública, possibilitando que dirigentes das entidades mais jovens conheçam as atividades das associações mais experientes, além de vivenciar os sistemas de saúde dos países visitados.
Dereje e Sharmila passaram seis semanas e conheceram quatro capitais: Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília e Salvador, onde tiveram oportunidade de conhecer hospitais, unidades de Saúde da Família, instituições de pesquisa e de ensino acompanhados de pesquisadores e docentes associados como Maria Fátima de Souza e Ana Valéria Mendonça (NESC/UnB); Lígia Bahia (IESC/UFRJ); Frederico Peres (ENSP/Fiocruz); Álvaro Matida (Cris/Fiocruz); Nelson Gouveia (DMP/FM/USP); Marco Akerman (FSP/USP); Isabela Cardoso Pinto (ISC/UFBA), entre outros, sempre supervisionados e apoiados pela Secretaria Executiva da Abrasco.
Sistema Universal e produção científica: Ambos os visitantes destacaram surpresa e entusiasmo com o conjunto de conhecimentos e informações aos quais foram apresentados. “De fato, a coisa mais interessante foi conhecer o SUS. Saber que qualquer pessoa aqui, mesmo sem dinheiro, possa ser assistido pelo Estado é algo novo para mim. No meu país, o governo concede alguns medicamentos de forma gratuita, mas não é para todos. É algo novo. Como membro da PHFBD, vou dividir esta experiência para pensarmos algo próximo ao SUS para ser levado às instâncias de governo”, contou Sharmila.
Já Dereje Gebread destacou o caráter constitucional das políticas de saúde no Brasil e a luta da Abrasco e das demais entidades da saúde em manter e ampliar essas conquistas. “Compreendi que a criação desse sistema universal foi fruto da pressão de associações profissionaisantes de 1988. A saúde é um direito que consta na Declaração Universal das Nações Unidas e que aqui foi constitucionalizada. Ouvi críticas, no entanto, deixo para vocês a pergunta se a oferta de serviços gratuitos corresponde a qualidade dos mesmos”.
Elogiaram também a receptividade e atenção recebidas. “Os docentes que nos receberam buscaram criar as condições de responder nossas dúvidas e questionamentos. As visitas foram modeladas para proporcionar os conhecimentos que desejávamos obter. Isso foi muito bacana”, elogiou a médica.
Eles estiveram também com a editora Cecília Minayo em visita a sede da revista Ciência & Saúde Coletiva, no Rio. “Achei importante conhecer o trabalho de uma publicação que dá espaço tanto para as produções individuais de pesquisadores como as de grupos de pesquisa”, comentou Dereje. Ele destacou que todas as associações ligadas à AFHA são reconhecidas pelos seus respectivos governos e contam com apoio em pesquisas, mas no entanto, ressaltou a dimensão da troca das publicações brasileiras com o Ministério da Saúde na utilização de evidências para orientar políticas públicas. “Na associação etíope e nas demais, não temos periódicos do gênero, algo que realmente faz falta”. Sharmila completou a análise. “É uma grande tarefa receber mensalmente textos, submetê-los a pareceristas que os analisam, pontuam e comentam. O percentual de 80% de recusas indica a alta qualidade da publicação”.
Novidades e diferenças: Vindos de culturas tão distantes e diferentes, é natural haver estranhamentos e dficuldades. Nossos visitantes falaram que foram pequenas e que, com ajuda, souberam facilmente sair de situações embarosas. Dereje citou as belezas naturais do Rio de Janeiro e de Salvador e a arquitetura de Brasília como paisagens marcantes e o respeito dos brasileiros às leis de trânsito. “Todos param nos sinais vermelhos, e em São Paulo, quando se avança a faixa, os carros também param. Isso não acontece na Etiópia”.
“Como sou mulçumana, sigo a tradição de comer carnes apenas que foram abatidas segundo nossos preceitos religiosos. O professor Marcos Akerman foi muito atencioso em me ensinar em português como pedir apenas peixe, salada e legumes nos restaurantes”, riu Sharmila, que andou com a “cola” gravada em seu celular para não esquecer.
Ambos ressaltaram os aprendizados aqui encontrados. “Achei a Abrasco uma associação muita ativa e influente na sociedade brasileira. Gostaria que nossas associações e federação tenham um dia o mesmo poder de interlocução, trabalhando por melhoras em nossos sistemas de saúde”, destacou Dereje. Sharmila ressaltou a diversidade de pessoas e de atividades. “Por trás dessa força da Abrasco, percebi muitas atividades simultâneas e um corpo de pesquisadores atuante em diferentes pesquisas em saúde. Conheci o trabalho do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA) em Salvador e me surpreendeu o trato como eles lidam com os participantes das pesquisa, oferecendo presentes como forma de estímulo à participação. Vou dividir com os membros da nossa associação essas formas de criar esses laços”.