A edição dessa semana da revista científica The Lancet (Volume 384, Issue 9944) traz uma matéria sobre a inserção da Saúde no cenário das eleições presidenciais brasileiras, apontando o peso que o setor vem tomando na disputa e no interesse do eleitorado. Com o título Upcoming election could rekindle health debate in Brazil – Próximas eleições podem reanimar o debate da saúde no Brasil – em livre tradução, a matéria do jornalista Michael Kepp faz uma análise geral sobre o setor no cenário político brasileiro a partir das manifestações de junho de 2013.
Dos primeiros protestos motivados pelos aumentos das passagens e que rapidamente deram fôlego para cobranças sobre demais políticas públicas e condições de vida da população frente aos investimentos priorizados para a Copa do Mundo até a repercussão do programa Mais Médicos, a reportagem aborda as condições do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Programa Estratégia Saúde da Família (ESF) e ouviu especialistas no assunto, entre eles, três abrasquianos: os professores José Noronha, do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (ICICT/Fiocruz); José Sestelo, do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA), e Ligia Giovonella, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz).
Ao abordar o cenário popular das manifestações por melhores condições de saúde, Noronha, que foi presidente da Abrasco entre os anos 2000 a 2003, cita a mobilização do movimento Saúde + 10, que recolheu mais de 2 milhões de assinaturas em todos os estados brasileiros solicitando a aprovação do Projeto de Lei Popular (PLP 321/2013) que propõe o repasse efetivo e integral de 10% das receitas correntes brutas da União para o setor.
O professor Sestelo destaca a carência de leitos da rede pública e a prática da rede privada em escolher pacientes para os leitos vinculados ao SUS. “Essa nebulosa interface nos serviços entre hospitais públicos e privados necessita ser mais transparente, melhor delimitada e regulada para evitar que o sistema privado tenha vantagens financeiras frente ao público”, disse Sestelo.
Já a professora Ligia afirma que a ESF é subfinanciada. “Ainda que o governo tenha investido para reformar, expandir e melhorar as unidades de saúde da família, isso não é suficiente para acompanhar o crescimento populacional. Também não há investimentos necessários em policlínicas para prover cuidados em saúde e serviços diagnósticos especializados. Esse é um dos motivos que os hospitais públicos estão tão lotados”, disse Ligia, destacando também que os profissionais médicos preferem residir nas grandes cidades ao invés de desenvolver o ESF nas cidades pobres periféricas e nas zonas rurais, o que leva também à grande rotatividade de profissionais, devido às melhores condições financeiras possíveis nas atividades particulares.
O professor Noronha também aborda a prática da maioria dos profissionais médicos brasileiros ao comentar o programa Mais Médicos, do governo federal, criado para organizar profissionais brasileiros e estrangeiros dispostos a participar do ESF. “O Mais Médicos tem impulsionado a Atenção Primária nas áreas rurais e urbanas que têm baixo suporte médico, capacitando estrangeiros que aceitam receber salários que a maioria dos profissionais brasileiros das grandes cidades dispensa”, completou. Outros dois entrevistados são Arthur Chioro, Ministro da Saúde, e Luís Fernando Correia, ex-chefe da emergência do Hospital Samaritano, no Rio de Janeiro. Confira aqui a matéria na íntegra, em inglês.