Quarenta cidades brasileiras realizaram nesta quarta-feira (27) o Banquetaço” contra o fim do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e em apoio à luta pela produção de alimentos agroecológicos. Milhares de refeições foram preparadas com alimentos doados por coletivos, associações e movimentos populares e distribuídas em praças públicas pelo país. Junto com a fartura de alimentos, também marcaram presença a conscientização, a cultura e a luta pelo retorno do órgão. Confira na galeria de imagens acima alguns registros dos diversos banquetaços – veja também nas redes sociais aqui
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Desde o anúncio do fim do Consea, lideranças e movimentos da ligados à alimentação, saúde, de produtores locais e/ou orgânicos e de comunidades religiosas de matrizes africanas e indígenas iniciaram a mobilização de forma autônoma, horizontal, afinada e comprometida com a construção coletiva. Isso se viu na diversidade de mesas, rostos, movimentos e, principalmente, cores e sabores. Cada cidade teve um horário, uma proposta própria, uma atividade de cor local, mas sempre apontando para o tema central: a importância do Consea como promotor e fiscalizador de políticas públicas nas áreas da alimentação, nutrição, alimentação escolar, distribuição e acesso de alimentos e água, entre outras atuações.
Em Salvador, o Banquetaço Bahia aconteceu no Porto da Barra, a partir das 8 horas e contou com uma roda de conversa no sofá da Casa Ninja, com a presença da professora Sandra Chaves, da Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e membro do COMSEA Salvador; Carlos Eduardo Leite, o Caê, coordenador do Serviço e Assessoria de Apoio a Organizações Populares Rurais (SASOP) e militante da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), e Leomárcio Araújo, do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA).
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Para Caê, é preciso resistir não só à extinção do Consea, mas à extinção do Sistema Nacional de Segurança Alimentar (SISAN). “Cortaram a cabeça do sistema, que é o Consea. Se não conseguirmos reverter, temos que construir uma alternativa com a sociedade, criar um Consea paralelo.
Já em São Paulo, a atividade foi realizada na Praça da República, no Centro histórico da capital paulista. Vera Villela, integrante do Conselho Municipal de Segurança Alimentar em São Paulo (SP), avaliou que, sem o Consea, o país poderá viver um período de retrocesso no debate sobre alimentação e nutrição: “Nossa preocupação com a extinção do Consea é que, como não tem mais um órgão que propõe as diretrizes e que faz o monitoramento dessas políticas, a gente tenha uma esgarçamento e uma perda em vários espaços, seja federal, estadual ou municipal”.
Diversos chefs paulistanos colaboraram com o banquetaço paulistano cozinhando alimentos doados por parceiros, como o projeto Hortas Urbanas e pequenos agricultores da região metropolitana. A cooperativa de Ibiúna, de produtos orgânicos, forneceu berinjela, batata doce, milho e cebola. A cooperativa dos índios guaranis de Parelheiros também enviou vários quilos de alimentos, que foram preparados na Escola Brasileira de Ecogastronomia.
Uma das marcas da atividade foram a presença e doações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que contribuíram com alimentos sem agrotóxicos e sem poluentes vindos de diversos assentamentos da Reforma Agrária. Em São Paulo, a Armazém do Campo, nome das lojas e café do MST, doou 100 quilos de arroz orgânico para a ação na capital. Já em Alagoas, foram doadas.160 quilos de batata orgânica produzida pelo movimento.
“Nós defendemos a polítoca nacional de segurança alimentar que temos no Brasil desde a década de 90. Com o golpe nós retrocedemos até nesse tema, logo, a fome voltou a ser uma ameaça no país. Diante disso, entendemos que sem uma política de segurança alimentar – que na verdade é bem abaixo dos que os movimentos populares exigem, pois lutamos pela soberania alimentar – não conseguiremos sequer pautar o assunto. O direito universal de acesso ao alimento já está sendo e deve ser cada vez mais restrito, por isso, toda essa mobilização é tão importante. Saímos do mapa da fome durante o governo Lula e não podemos retroceder ao ponto de ver a população passando fome novamente”, afirmou Carla Bueno, dirigente do Movimento Sem Terra e uma das coordenadoras da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida.
No Recife (PE), mil refeições foram servidas em frente às instalações do futuro Armazém do Campo na capital pernambucana. “Por mais de 10 anos, o Consea foi um instrumento importante para a construção do debate sobre a alimentação no Brasil. Então, deixar de ter esse Conselho é deixar de ter um espaço institucional para discutir a alimentação por dentro do Estado brasileiro, fazendo diálogo com a sociedade civil”, lamenta Jaime Amorim, da direção nacional do movimento.
Cerca de uma tonelada de alimentos foram recebidos pela organização do evento em Pernambuco, por meio de doações de pequenos agricultores da região. Os produtos foram utilizados para o preparo do tradicional cozido pernambucano, em uma versão vegana. “A decisão de servir o cozido partiu desse pressuposto de ser uma comida de identidade pernambucana, que está no prato do pobre e do rico, e que faz lembrar aconchego familiar”, explica a chef Andrea Runca.
Para a agricultora do Movimento da Mulher Trabalhadora Rural do Nordeste (MMTR-NE), Josefa Ferreira, a importância do evento está no seu potencial de transformar hábitos e consciências. “Acredito na força das organizações populares e na força das mulheres. Nós, camponeses, temos nossa tarefa, que é a de produzir alimento saudável, e a sociedade que vive na cidade tem a de consumir produtos saudáveis, produzidos de forma agroecológica”, finaliza.
No Rio de Janeiro, foram servidas 2 mil refeições com produtos da agricultura familiar e agroecológica no Largo da Carioca, região central. “Foi muito lindo e emocionante! As gotas de suor disfarçavam os olhos marejados de emoção. Para a ACT e Aliança, é uma honra ter participado desse coletivo que organizou tudo para promover a distribuição de Comida de Verdade e interagir com a diversidade do público pelo retorno do Consea” disse Paula Johns, dirigente da ACT e da coordenação da Aliança