Um dos maiores especialistas em saúde pública do Brasil, o médico e professor da Unicamp Nelson Rodrigues dos Santos afirmou nesta terça-feira, 26, no Auditório da ADunicamp (Associação dos Docentes de Campinas) que o Brasil tem dinheiro para jogar fora e que poderia facilmente pagar vários SUS (Sistema Único de Saúde) com melhor qualidade.
O professor Nelson Rodrigues dos Santos participou do programa Studio ADunicamp Sala Abertaao lado dos médicos Gustavo Cunha, da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, e Carina Almeida Barjud, doutoranda em medicina, também na Unicamp. O professor Gastão Wagner, presidente da Abrasco, também participaria do debate, mas por problemas na agenda não lhe foi possível estar presente.
Nelson dos Santos, que é professor colaborador da Unicamp, presidente do Instituto de Direito Sanitário Aplicado (Idisa), membro do Conselho Consultivo do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) e foi consultor da OPAS/OMS (Organização Mundial da Saúde), afirmou que os recursos produzidos pelo Brasil não são repassados para a sociedade, mas sim apropriados por uma minoria por meio principalmente de benefícios e sonegação fiscal. “Aí vem a questão de a sociedade se apropriar do seu Estado. Hoje o Brasil vive uma crise de representação. Os SUS foi ‘desfinanciado’ por todos os presidentes da República até hoje desde 88”, afirmou.
Para o professor, as riquezas da sociedade estão sendo sugadas por uma minoria. “Vimos há poucas semanas as malas do Geddel. Mais isso é gorjeta perto do que as empreiteiras colocaram nos últimos processos eleitorais, que foi R$ 4 bilhões. Mas eles perdem também para a sonegação que são R$ 500 bilhões, parte dessa está no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), que recebe das empresas as justificativas para a sonegação. E aí vai: 0,06% da população tem isenção fiscal, com decreto presidencial de 1995, de dividendos no exterior, que somaram, em 2012, R$ 600 bilhões em benefício fiscal. E mais uma comparação, que eu mesmo fiquei aturdido: o Brasil é o quarto país do mundo cuja elite põe dinheiro em paraíso fiscal. A suíça estima que o valor é por volta de R$ 1,3 trilhões”, explica o professor.
Além de tudo isso, os poucos recursos deixados para a saúde pública são apropriados pela iniciativa privada. “Há 30 anos o SUS quase zerou a compra de equipamentos e construção de hospitais. Hoje o SUS compra, no setor privado, com dinheiro público, 65% das internações hospitalares. Os exames laboratoriais, diagnóstico, procedimentos sofisticados, onde se concentra a tecnologia e o interesse das empresas privadas, o SUS compra 92% do mercado. Somente 8% são públicos. O setor privado emprenhou o SUS”, ressalta.
A médica Carina Barjud, que também participou do debate, relatou várias experiências da situação do médico diante dos planos de saúde e lembrou da nova normativa da ANS (Agência Nacional de Saúde), a normativa 424. “Ela determina que agora os convênios podem negar uma conduta médica. Os planos vão escolher médicos e, um deles, dará um voto final”, afirmou. Assim, é o plano que vai dizer se o procedimento indicado pelo médico será aprovando ou negando ao paciente.
O professor da Faculdade de Medicina da Unicamp, Gustavo Cunha, também lembrou da distorção no sistema tributário brasileiro, que impede um bom financiamento da saúde pública, além do lobby para prejudicar a população. “Uma grande empresa brasileira de plano de saúde foi comprada recentemente por uma empresa de seguro norte-americana. O dono da empresa americana disse, após a compra, que a legislação brasileira era inadequada e que deveria mudar”, diz. Para ele, a normativa da ANS pode já ser uma mudança. A medicina preventiva também foi tema do debate.
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