Os trabalhadores da saúde têm sido alvo de diversas homenagens e elogios por conta do árduo trabalho que estão desenvolvendo no cenário de pandemia da Covid-19. Entretanto, mais do que elogios e homenagens, eles precisam de condições dignas e apoio para realizarem seu trabalho de forma plena. Essas condições de trabalho fizeram parte do debate do colóquio Trabalhadores de Saúde e a pandemia de Covid-19 realizado pelo Grupo Temático Trabalho, Educação e Saúde da Abrasco no dia 5 de maio no espaço da Ágora Abrasco. Os debatedores expuseram questões relativas ao trabalho na área da saúde antes e durante a pandemia e também fizeram projeções sobre o que precisa ser feito quando a situação de emergência for encerrada, contando com a coordenação de Marina Peduzzi, professora da Escola de Enfermagem da USP (EE/USP).
O antes, o durante e o depois
A primeira debatedora a falar foi Isabela Cardoso, professora do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA), destacando o trabalho que tem sido realizado pela Rede Covida com relação às questões dos trabalhadores da saúde. A professora destacou que “a saúde dos trabalhadores é fundamental para garantir a continuidade e qualidade dos processos de trabalho normais nos diversos níveis para controlar a disseminação da Covid-19”. Ela apontou ainda o aumento de casos de depressão, ansiedade e angústia entre os profissionais e a necessidade treinamento para lidar com a situação atual. As precárias relações de trabalho são motivo de angústia para os profissionais que viram sua área sendo desvalorizada por longo período. Isabela avalia que a “pandemia explicita as consequências de um Estado mínimo. Como garantir alguma proteção aos trabalhadores que estão sendo contratados agora?”
+ Confira a apresentação de Isabela Cardoso, exibida em slides
Mônica Angelim, professora da Faculdade de Medicina da UFBA (FM/UFBA), fez uma análise dos cenários de antes, durante e depois da pandemia. Segundo a professora, “o que víamos antes da pandemia era a precarização das condições de trabalho no setor da saúde” com a “pjotização [contratação como pessoa jurídica], que é uma forma de terceirização, uma fraude na relação com o trabalhador”. Foi nessas eram condições que os trabalhadores tiveram de lidar com a crise sanitária e, em seguida, colapso do sistema de saúde, fato que se deu pela primeira vez em décadas. Além disso, com o quadro de subnotificações que, segundo Mônica, é estrutural, o cenário de pós-pandemia será de inomináveis, que morrem sem luto e são enterrados sem presença de familiares, e inumeráveis porque não saberemos os números exatos nem depois disso.
+Veja as anotações que nortearam a apresentação de Mônica Angelim
Saúde mental e violência fazem parte da rotina
As questões relativas à saúde mental foram aprofundadas por Andréa Tenório, professora das Faculdade de Medicina da USP e da Faculdade de Medicina de Jundiaí. Segundo levantamento, “no pré-pandemia, 16% dos profissionais comprovavam depressão, enquanto a população de São Paulo tem cerca 9% de adoecimento por depressão”. Andrea chamou atenção para a violência a que estes profissionais estão expostos, sejam xingamento, agressões verbais ou físicas. Uma pesquisa com trabalhadores da saúde no Rio de Janeiro apontou que “60% dos profissionais sofreu algum tipo de violência nos últimos 12 meses. No estudo da OMS, que analisou 7 países, o resultado foi 40% de profissionais que sofreram violência no mesmo período”. O acompanhamento dos profissionais no pós-pandemia foi apontado como fundamental por Andrea: “Cabe destacar que estamos lidando com uma situação de estresse pós-traumático, que é causador de depressão, ansiedade e suicídio. Então temos que ter um acompanhamento dessas pessoas”.
As faltas de condições de trabalho adequadas, a contratação de profissionais por regime de pessoa jurídica e a falta de recursos humanos para lidar com a pandemia foram alguns pontos levantados por Alexandre Telles, presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro (SindMed/RJ). Segundo Telles, a falta de profissionais interfere inclusive nos leitos disponíveis para atender a população: “No Rio de Janeiro, temos mais de 1300 leitos inativos por falta de recursos humanos. São mais de 10 anos sem contratação federal para a área da saúde na cidade que tem a maior rede federal do país”. Além da sobrecarga pela falta de profissionais e do estresse pela situação de emergência, o assédio moral é outra questão presente no cotidiano da categoria: “as chefias pressionam para que profissionais assumam plantões furando escalas e fazendo deslocamento. Profissionais estão adoecendo e aqui no Rio tivemos 16 mortes de médicos”, relatou Alexandre.
Outros debatedores participaram do debate e apontaram a importância da Covid-19 ser colocada como uma doença causada pelo trabalho e a necessidade de garantias trabalhistas para os trabalhadores que vivem sob grande incerteza de seu futuro. A coordenadora do GT Trabalho, Educação e Saúde da Abrasco, Jandira Maciel, apontou também a importância de “dar mais visibilidade a tudo isso que está sendo feito em termos da experiência dos trabalhadores, como tem feito o sindicato”. Para finalizar, Gulnar Azevedo, presidente da Abrasco, fez questão de ressaltar a total solidariedade da entidade com os trabalhadores da saúde.
Assista a íntegra do colóquio abaixo: