Em coluna de opinião publicada em 14 de janeiro, Raquel Rigotto, professora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará; coordenadora do Núcleo Trabalho, Ambiente e Saúde – Tramas/UFC, e membro do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), trava diálogo científico com João Pratagil Araújo, pesquisador da Embrapa, na temática dos agrotóxicos.
De forma analítica e contundente, ela desmonta os argumentos de Pratagil que tentam justificar “os Limite Máximo de Resíduos (LMR)” utilizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) como indicador de segurança, o que já foi comprovado cientificamente por diversos estudos compilados no Dossiê Abrasco: Um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde, obra cuja a docente é uma das co-autoras. “Há, entretanto, duas razões fortes para defender o uso de agrotóxicos: para a indústria química, garantir um mercado que, no Brasil, supera os 11 bilhões de dólares; para os produtores de commodities agrícolas, aumentar a produtividade e engordar seus lucros. Você oferece sua saúde para ajudá-los nesses propósitos?”, encerra Raquel Rigotto.
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Comer alimentos com agrotóxicos é seguro?
A legislação brasileira define o termo agrotóxicos, e não “defensivos agrícolas”
O POVO publicou, em 12 de janeiro, artigo de pesquisador da Embrapa Defensivos agrícolas: aliados para produção de alimentos seguros. Pelo menos cinco equívocos devem ser esclarecidos, por suas repercussões para a saúde:
1. A legislação brasileira define o termo agrotóxicos, e não “defensivos agrícolas”, no intuito de deixar claro seu potencial biocida e tóxico.
2. Não é possível o “uso correto” dos agrotóxicos: como implantar ações neste sentido junto às 16.567.544 pessoas ocupadas no setor agrícola? Agricultores familiares não têm acesso adequado à assistência técnica pública nem podem investir em instalações e equipamentos adequados para armazenamento, higienização e destinação das embalagens. Nas grandes empresas, a escala de uso de agrotóxicos é muito elevada e nem sempre “as boas práticas” são respeitadas. Os EPI podem ter efeito contrário e aumentar a exposição dos trabalhadores ao risco. E ainda: no Ceará não há Unidade de Processamento de Embalagens de agrotóxicos.
3. O Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos é uma iniciativa importante da Anvisa. Mas o Limite Máximo de Resíduos (LMR) não garante o consumo de alimentos sem risco à saúde. Por quê?
– a avaliação de risco é baseada em estudos toxicológicos com animais de laboratório ou in vitro, extrapolando os resultados para a saúde humana;
– os estudos avaliam em separado cada ingrediente ativo (IA), desconsiderando os efeitos à saúde nas condições de múltipla exposição – que é o mais frequente na prática – e suas possíveis interações;
– dos 527 ingredientes ativos registrados no Brasil, a Anvisa tem analisado apenas 235, excluindo até o glifosato, que responde por mais de 45% do consumo e que é provável cancerígeno.
4. Embora o receituário agronômico seja medida importante, raramente a sua ausência impede a compra de venenos: experimente numa loja!
5. O consumo de alimentos contaminados com agrotóxicos pode ser responsável por diversos cânceres – leucemias, linfomas, de pulmão, estômago, melanoma, próstata, cérebro, testículos e sarcomas. E mais: alterações neurocomportamentais, asma, hepatopatias tóxicas, infertilidade masculina, abortamento, malformações congênitas, além de desregulação endócrina e imunogenética.
Há, entretanto, duas razões fortes para defender o uso de agrotóxicos: para a indústria química, garantir um mercado que, no Brasil, supera os 11 bilhões de dólares; para os produtores de commodities agrícolas, aumentar a produtividade e engordar seus lucros. Você oferece sua saúde para ajudá-los nesses propósitos?