Em um ano em que os financiamentos da Capes foram suspensos para eventos científicos e as universidades têm sido retalhadas pelo governo federal nas liberações de recursos financeiros e por meio de chantagens e ameaças, a comunidade da Saúde Coletiva, em especial a das Ciências Sociais e Humanas em Saúde, deu uma demonstração de força, aglutinação e capacidade de produção de conhecimento. Em sua oitava edição, o Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde – 8º CBCSHS – mais do que dobrou o número de participantes e de trabalhos apresentados em relação às edições anteriores.
Ao todo, foram 2.168 congressistas credenciados que participaram de mais de 342 atividades da programação científica, entre mesas-redondas e suas rodas respectivas, debates emergentes, reuniões de GT e as atividade de celebração dos 40 anos da Abrasco.
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Esse mundaréu de gente apresentou um total de 1.216 trabalhos em 29 GTs, buscando relacionar o conhecimento e as experiências produzidos e vividos nas diversas instituições de ensino e pesquisa e nos mais variados serviços de saúde espalhados em todos os estados brasileiros com as temáticas e inovações propostas pelo Congresso. Houve ainda a participação de pesquisadores de Portugal, França, Afeganistão, Argentina e Botswana.
Rodas adentram a programação científica: Modelo conhecido e central às práticas dos grupos de Educação Popular, as rodas de conversa não ficaram restrita à Tenda Paulo Freire neste 8º CBCSHS e compuseram a programação científica do evento.
“A ideia das rodas é proporcionar um espaço para que discussões tratadas nos debates centrais possam continuar no dia seguinte, com ampla participação das pessoas interessadas, abrindo também a possibilidade de dialogar com os expositores de uma forma mais próxima” apresenta Tatiana Gerhardt, integrante da Comissão de Ciências Sociais da Abrasco e da Comissão Científica do evento.
O modelo já havia sido experimentado no seminário “O SUS diante das Violências – Vivências, resistências e propostas”, atividade preparatória do 12º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva – Abrascão 2018, realizada em abril daquele ano e que serviu de balão de ensaio para o Congresso de Ciências Sociais.
“A ideia é dar oportunidade para que, em roda, as pessoas possam falar mais à vontade de suas vivências. É um modelo viável, que não afronta as expectativas e modelos acadêmicos, e nem os participantes, que utilizam de fato a palavra” explica Ernande Valetin do Prado, da coordenação ao apoio institucional do CEFOR – Centro de Formação de Recursos Humanos, da Secretaria Estadual de Saúde da Paraíba (SES/PB), e um dos responsáveis pela supervisão das rodas no Congresso.
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O ineditismo do modelo nos Congressos da Abrasco fez desse primeiro ano uma experimentação. A programação inicial previu 3 salas dedicadas à atividade, com um conferencista em cada roda, na primeira faixa horária. No entanto, a manhã do domingo subsequente ao Debate Emergente “Epistemologias do Sul, Interculturalidade e Saúde Coletiva” contou com os 3 expositores – os docentes José Francisco de Melo Neto (UFPB); João Arriscado Nunes (CES/U. de Coimbra) e antropóloga e indígena Elisa Urbano Ramos, da etnia Pankararu – em uma única roda. Por conta da agenda dos participantes do Debate Emergente “A Perspectiva do Bem-Viver e a Defesa do SUS”, o apenas o professor Paulo Henrique Martins (UFPE) pôde participar da roda de conversa realizada na manhã de segunda-feira, dia 30.
Para ele, a experiência foi uma grata surpresa. “As rodas permitem o público se aprofundar numa série de discussões que não foram possíveis após o debate, pois o tempo era curto. As pessoas dormem, vêm com dúvidas e conseguem desenvolver novas questões, dando margem também para os expositores ampliar as reflexões”.
Mais espaço, novas linguagens: Concebido há 3 anos, com primeira realização na edição de Cuiabá, o GT Ampliando Linguagens chegou à João Pessoa com grande demanda e expectativa. De uma única sessão em 2016, nesta edição foram realizadas oito diferentes sessões, num grande salto quantitativo e qualitativo, o que demonstra o interesse e a vitalidade de promover formatos e suportes pouco explorados nos espaços acadêmicos da Saúde Coletiva.
“Estou absolutamente convencida da relevância desse GT porque propiciou um fecundo diálogo entre temas e linguagens; prazer e confiança nas apresentações; leveza e reflexão, expressando de maneira simbólica subjetividades que não seriam possíveis em outros formatos convencionais” ressaltou Mônica Nunes, uma das coordenadoras do GT.
A capacidade de diálogo entre conceitos e linguagens e a diversidade e riqueza de suportes foram outros aspectos marcantes para a docente. Nesta oitava edição foram apresentados trabalhos em vídeo, fotografia, esquete teatral e teatro do improviso, laboratórios do sentir, em cordel e produtos de manufatura coletiva, como colchas e mandalas, levantando diversas proposições durante a plenária final.
Repensar formas para melhor acolher tais trabalhos, propiciando melhores estruturas e organizando ‘saraus multilinguagens’ em espaços e momentos de maior visibilidade dentro do evento foram algumas das propostas apresentadas pela coordenadora, que ressaltou a liberdade da expressão artística como forma de sensibilização.
“As pessoas que trazem trabalhos nesses formatos precisam acreditar mais na linguagem que escolheram, deixando que elas falem por si, sem necessidade de explicação. Essas formas são potentes ferramentas para produção de metodologias problematizadoras que dão acesso a outras sensibilidades humanas capazes de ampliar a percepção do mundo, com crítica social e capacidade de transformá-lo” concluiu Mônica.