Cenário político, preços dos planos de saúde, descalabros nas políticas setoriais. Não houve assunto que não tenha entrado na pauta da entrevista com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, no programa Roda Viva, da TV Cultura, exibido em 27 de maio último. Integrante da Comissão de Política, Planejamento e Gestão da Abrasco, Lígia Bahia foi uma das entrevistadoras convidadas, questionando posições e falas recentes de Mandetta.
A primeira pergunta da abrasquiana abordou divergências entre o discurso e a composição da base política do governo Bolsonaro, arguindo a solidez de Mandetta no cargo e sua vinculação à “Velha Política” e ao chamado “Centrão”, conjunto de parlamentares que oscilam nas votações de acordo com interesses corporativos. Diplomático, Mandetta se disse partidário da “boa política”, reafirmando seu bom trânsito com o conjunto do espectro político.
“A saúde pública funciona bem, especialmente quando amparada em fatos científicos” destacou Lígia em sua segunda pergunta ao questionar Mandetta sobre a proibição da divulgação dos dados do 3° Levantamento Nacional sobre o Uso de Drogas pela População Brasileira, e reforçando que o problemas decorrentes do álcool são mais alarmantes do que a pseudo-epidemia de crack, que tanto propala Osmar Terra, ministro da pasta da Cidadania. “Essa obsessão pelo crack está drenando todos os recursos que temos para esse combate com dois erros: primeiro, por que o foco deveria ser o álcool, e não é; e segundo, o combate ao crack está baseado exclusivamente na abstinência, que cientificamente já se demonstrou incorreto”.
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Ao responder, Mandetta recorreu à Lei Seca norte-americana e à diálogos com a ministra da saúde da Rússia, porém afirmou que “é uma questão do mundo livre” conduzindo a resposta para programas de educação física, esportes e combate ao sedentarismo. “Vamos continuar colocando na agenda, mas é debate para a sociedade”, esquivou-se Mandetta.
O mesmo argumento que joga a responsabilidade centralmente nos indivíduos e na “livre escolha” foi utilizado pelo ministro ao responder sobre seu posicionamento frente à rotulagem frontal de alimentos ultraprocessados, ao qual repetiu posição dada em entrevista, colocando-se ao lado da proposta da indústria, remetendo a decisão novamente à sociedade e “ao Congresso” e defendendo todo e qualquer modelo contrário aos alertas adotados no Chile e que já demonstraram resultados na melhora da saúde da população.
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Qual a marca da gestão? Lígia Bahia questinou Mandetta novamente, mostrando que o Ministério da Saúde tem sim autonomia na definição de políticas, como o dos reajustes dos planos. “Tenho uma pergunta que não depende do Congresso”, disparou a abrasquiana, argumentando que o reajuste das mensalidades dos planos de saúde é definido muito acima da inflação e se, no caso, o Ministério não poderia estabelecer índices mínimos e máximos, tornando-se uma marca do novo governo e uma “boa notícia para os brasileiros, ou se continuaremos a rezar pela cartilha anterior, de ter aumentos dos planos surpreendentes”.
Mais uma vez, Mandetta remeteu o debate ao Congresso, dizendo que foi criada na legislatura passada uma comissão para rever a lei dos planos de saúde (9.656/1998), e, ao mesmo tempo questionando os cálculos do aumento dos planos individuais, mas justificando-os devido à inflação dolarizada do setor saúde.
A última participação da professora da UFRJ trouxe o tema dos descontos do Imposto de Renda para gastos em saúde e demais subsídios fiscais, proposta do ministro da economia Paulo Guedes, uma “novidade muito grande”, dando exemplo das altas contas que o mundo político paga nos hospitais mais caros do país e os subsídios do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (PROADI-SUS). Mandetta disse que o PROADI pode ser ajustado e melhorado, remetendo a essas instituições o aprendizado sobre gestão e a transferência de tecnologia, provocando: “Será que o SUS é Atenção só, ou tem gestão? Quem são as pessoas de gestão? É a academia teórica, que nunca pôs a mão na gestão? Ou é quem está gerindo e tentando agregar aqui dentro?”.
Mandetta levantou ainda a possibilidade de repensar os sentidos da integralidade, do acesso universal ao SUS, parcerias público-privada e da decisão de mudar o nome do antigo departamento de combate ao HIV/Aids. Lígia Bahia dividiu a bancada com Cláudia Collucci, repórter especial e colunista do jornal Folha De S.Paulo; Cristiane Segatto, colunista de Saúde do portal UOL; Fabiana Cambricoli, repórter de Saúde do jornal O Estado De S.Paulo; e Antônio Jorge de Souza Marques, psiquiatra e ex-secretário de Saúde de Minas Gerais. Assista abaixo o programa na íntegra.
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