O lançamento do Dossiê Abrasco contou ainda com a participação de representantes de organizações da sociedade civil e de agricultores para compartilharem suas experiências de vida. O cineasta Silvio Tendler, diretor de filmes centrais na compreensão da sociedade brasileira, dentre eles, O Veneno Está na Mesa, partes I e II, foi ovacionado pela plateia presente. Emocionado, fez uma curta saudação aos presente. “Eu é que agradeço a oportunidade de contar essas histórias e me colocar junto de vocês nesta luta, como diz a canção Todo artista tem de ir aonde o povo está “. De Goiás, veio o professor Hugo Alves dos Santos, da Escola Municipal São José do Pontal onde 29 crianças e oito adultos foram atingidos por pulverização aérea de agrotóxicos, em maio de 2013.
Hugo fez um depoimento emocionada e foi aplaudido. O professor contou o que tem passado desde aquela manhã de 3 de maio de 2013, quando um avião agrícola despejou uma chuva de Engeo Pleno (nome do agrotóxico aplicado) – um inseticida da Syngenta (empresa que comercializa o agrotóxico) que é constituído por uma mistura de lambda cialortrina e tiametoxan. Hugo reforçou que tragédias como esta onde ele se tornou personagem principal, só terão fim com o banimento da pulverização aérea de agrotóxicos no Brasil. “Estávamos no pátio quando vimos o avião, era hora do lanche e neste dia tínhamos galinha caipira com milho cozido, alguns meninos correram felizes pois nunca tinham visto um avião voando tão baixo, foi quando aquela chuva borrifou nosso almoço. Foi quando nos envenenaram. Minha aluna Vanessa foi internada 18 vezes, algumas meninas começaram a menstruar 3 vezes ao mês mas nenhum médico deu laudo de intoxicação. A Secretaria Municipal de Educação mandou dar banho em todo mundo, lavar a escola e depois retomou a aula, no primeiro dia de aula após o crime, das 60 crianças que vieram, 47 crianças passaram muito mal. Recebo ligações com intimidações, ameaças de morte. Ninguém nos ajudou e quando fomos ao senado fazer um depoimento, fomos humilhados. Estávamos estudando, tentando nos tornar melhores brasileiros. Aquilo não foi um acidente, foi um crime”, lembra Hugo.
Através de um depoimento em vídeo, feito para ser exibido exclusivamente aos participantes do lançamento, Maria Gerlene Silva Matos, viúva do trabalhador rural Vanderlei Matos – contaminado pela exposição crônica a agrotóxicos na Chapada do Apodi, trouxe emocionada as informações sobre a decisão judicial que condenou a multinacional Delmonte Fresh Produce pela morte de Vanderlei. A história de trabalho, contaminação e morte de Vanderlei é um dos casos, ainda raros no Brasil, de fundamentação científica que fazem o nexo causal da morte do trabalhador por agrotóxicos – as evidências científicas apontadas pela Universidade Federal do Ceará, bem como a perícia médica do Ministério Público, tornam “irretocável” a decisão que responsabiliza a empresa pela hepatopatia grave induzida por substâncias tóxicas.
A presidente do Conselho Nacional de Saúde, Maria do Socorro de Souza, gravou depoimento sobre a conjuntura política e a defesa da Agroecologia:
Também houve depoimento em vídeo de João Pedro Stedile, um dos principais líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em que afirma que a concentração de terras tem crescido e que a reforma agrária clássica realmente “saiu da agenda” nacional.
Segundo André Burigo, um dos organizadores do livro e que participou de toda a articulação para o lançamento, a mobilização das pessoas envolvidas foi o que permitiu a produção dos vídeos “Penso que conseguimos trazer um pouco da emoção da Gerlene, do João Pedro Stédile e da Maria Socorro nos depoimentos em vídeo, e agradeço a todos os envolvidos pelo trabalho bem feito que permitiu abrilhantar mais ainda a noite do lançamento” comemora André.