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Desafios para publicações científicas em tempos da pandemia

O painel “Publicação científica nos tempos da pandemia da Covid-19”, da Ágora Abrasco, aconteceu no dia 4 de junho, com a coordenação de Márcia Furquim, editora científica da Revista Brasileira de Epidemiologia (RBE) e professora da Faculdade de Saúde Pública na Universidade de São Paulo (FSP/USP). A atividade contou com as participações de Abel Packer, diretor científico do portal Scielo/Fapesp, Cláudia Medina Coeli, editora da Cadernos de Saúde Pública (CSP) e Leila Posenato Garcia, editora da revista Epidemiologia e Serviços de Saúde. Os participantes falaram sobre a produção e a publicação da ‘boa ciência’ em tempos de pandemia, quando tudo está acelerado.

A editora da RBE iniciou a atividade ressaltando a importância da adoção do fast-tracking por revistas científicas do mundo todo, por conta da pandemia do novo coronavírus. As publicações do Fórum de Editores de Saúde Coletiva da Abrasco também estão utilizando o método fast-tracking, que acelera o ciclo de avaliação por pares, fazendo com que os manuscritos sejam publicados mais rapidamente pelas revistas e facilitando a troca de questionamentos e resultados produzidos entre a comunidade científica. A professora destacou que a pandemia também é desafio para a área das publicações científicas, e ressaltou a nova forma de disseminação das publicações científicas, que são os repositórios de preprint, e a forma tradicional, de revisão por pares. Os preprints também aceleram a disseminação dos manuscritos, antes ou em paralelo à avaliação por pares e validação por periódicos científicos. “(Neste período), conseguimos publicar 42 artigos, o que mostra que a área está viva, está procurando entender a epidemia e contribuir para a sua contenção”, afirmou Márcia Furquim.

A professora da FSP/USP citou o caso dos estudos envolvendo os medicamentos hidroxicloroquina e cloroquina no uso terapêutico para o tratamento de pacientes com Covid-19. No Brasil, a utilização dos medicamentos é indicada pelo Ministério da Saúde para o tratamento de casos leves, mesmo sem comprovação científica da eficácia dos fármacos. A controvérsia dos estudos e a politização do uso dos medicamentos colocam em discussão a questão da agilidade das publicações, que servem como bases de evidências para tratamento e enfrentamento da epidemia.

Abel Packer falou sobre o conceito de ciência em aberta, do conhecimento científico como bem público, já que o acesso ao conhecimento é fundamental. “O acesso ao conhecimento científico é um determinante estrutural do desenvolvimento sustentável, especialmente na Saúde”, disse. Packer apresentou as linhas de ação e estratégias do Programa Scielo. Para comunicações científicas relacionadas à Covid-19, em abril, o Scielo disponibilizou em versão piloto o servidor Scielo Preprints.

Packer mostrou a base de dados LitCovid, que é uma base com curadoria promovida pela National Library of Medicine, classificada em grandes temas, onde é possível ver o número de artigos, os periódicos e países onde estão sendo produzidos os estudos. Baseado em um título de um artigo publicado na Nature, sobre se a pandemia alterará permanentemente a publicação científica, Packer pontuou que “Essa mudança de abertura agora, se é importante na época de uma pandemia, deve ser importante sempre”.

Packer falou sobre os desafios do atual momento e mostrou dados do portal Scielo Brasil. Sobre os preprints e acesso à ciência aberta, o diretor do portal Scielo destacou as mudanças, já que, além de validar o artigo da pesquisa, os periódicos passam, progressivamente, a validar se estão ‘de acordo’ com a ciência aberta. “Sugerimos que os periódicos a partir de 2020, 2021, atualizem a política editorial, aceitando o preprint. Vamos trabalhar com citação e referenciamento de dados. Uma mesma pesquisa pode produzir três objetos de publicação: dados, artigos sobre dados e artigos analíticos”, disse.

Cláudia Medina Coeli citou o curto intervalo de tempo de acontecimentos importantes nos tempos atuais, citando o caso do medicamento ibuprofeno. Logo no início da pandemia, houve recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS), a partir de uma carta publicada em um periódico importante, que o fármaco não fosse usado em pacientes com Covid-19. Depois, com a reação de pesquisadores e a falta de estudos e comprovação científica dos efeitos colaterais da medicação, a OMS voltou atrás.

A editora da Cadernos de Saúde Pública falou sobre a importância da proteção da integridade da pesquisa, para a manutenção do rigor metodológico e dos padrões da boa ciência. Cláudia Coeli falou ainda das transgressões em pesquisas, como más condutas, plágio, e práticas prejudiciais que comprometem os estudos. A editora da Cadernos de Saúde Pública destacou a cooperação e a colaboração como fundamentais em tempos da pandemia da Covid-19. “Mais importante que números é formar rede e trabalhar em cooperação”, disse.

Ainda sobre a rapidez em tempos de pandemia, Cláudia Coeli destacou as muitas informações disponíveis, muitas delas falsas e que há produção de muito ruído, citando as redes sociais na internet, onde não é possível a verificação das informações. A população está assustada e ávida por informações e os cientistas têm que se adaptar às mudanças e acelerações. “O cientista está acostumado com tempos mais lentos”, pontuou.

Na pandemia, a aceleração dos processos propicia aumento no número de artigos publicados e também de retratações. A editora da CSP destacou a importância dos editores assistentes durante a adoção de fast-tracking e que é preciso buscar alternativas metodológicas que permitam alcançar bons resultados em menor tempo. “É necessário não se afastar dos processos de boas práticas editoriais”, concluiu.

Leila Posenato Garcia, editora da Epidemiologia e Serviços de Saúde traçou um perfil histórico das publicações científicas, citando cenários de outras epidemias e a situação atual, com aumento no ritmo da publicação de artigos. Leila destacou a participação de pesquisadores em entrevistas na imprensa, esclarecendo dúvidas da população; o trabalho realizado pelas revistas da saúde coletiva; a iniciativa dos editores para colocar artigos sobre a Covid-19 em acesso aberto; e os esforços de sociedades científicas, entre elas a Abrasco, com a produção de posicionamentos oficiais e materiais jornalísticos, contribuindo para a divulgação da ciência. “Na pandemia, houve aproximação da ciência com o público, com a sociedade”, afirmou.

Outro ponto destacado por Leila Garcia foi o acirramento das desigualdades nas pesquisas em tempos de pandemia. Diante dos dados de publicação de manuscritos por gênero, a pesquisadora citou o impacto na produção acadêmica das mulheres. “Nos faz supor que as mulheres não conseguem desenvolver pesquisas tanto quanto os homens durante a pandemia”, ressaltou.

A editora da Epidemiologia e Serviços de Saúde falou sobre o investimento em divulgação científica. “Esse momento deveria servir para que se tivesse maior valorização da ciência e da publicação científica. Não sei se virá, mas o cenário nos mostra que é necessária”, disse.

Cláudia Medina Coeli comentou a questão da comunicação com a população, e afirmou ser de fundamental importância o letramento em ciência. “Nós, cientistas, estamos abertos a rever as nossas posições e isso não é tão natural para outros”, concluiu.

Veja o vídeo da Ágora Abrasco na íntegra:
[youtube https://www.youtube.com/watch?v=soi_5mYmOH0]

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