A data de 27 de outubro marca o Dia Nacional de Mobilização Pró-Saúde da População Negra. A ocasião propõe refletir e agir sobre as desigualdades raciais existentes no sistema de saúde brasileiro.
Dados do Ministério da Saúde mostram que negras e negros, maior parcela da população, são os mais afetados por doenças como a anemia falciforme, hipertensão arterial e diabetes mellitus tipo 2. Neste último caso, a incidência da doença em homens negros é 9% maior do que em brancos. Entre as mulheres, o número de negras acometidas é 50% maior do que o de brancas.
Informações obtidas pelo portal Gênero e Número mostram ainda que, a cada 100 mil mulheres pretas que deram entrada em uma unidade de saúde para ter seus filhos entre 2008 e 2017, 22 morreram. O número representa o dobro em relação às gestantes brancas, que morrem 11 a cada 100 mil internações para parto.
Pesquisador e membro do Grupo de Trabalho Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Luís Eduardo Batista afirma que dados como estes são exemplos de que a saúde também é uma área que precisa de ações de combate às desigualdades raciais.
Segundo Batista, é necessário promover políticas públicas conscientes sobre as consequências que desigualdades históricas causaram para a saúde da população negra.
“Principalmente os estudos sobre mortalidade têm nos mostrado que a população negra, por ter menor escolaridade, renda e acesso aos serviços de saúde de qualidade, acaba morrendo pelo que a gente chama de causas evitáveis, como a morte por diabetes, hipertensão, tuberculose, AIDS, e causas violentas”, explica.
De acordo com a última publicação do Atlas da Violência, no ano de 2017, pessoas negras representaram 75,5% das vítimas de homicídios – uma das causas de mortes violentas – no país. Em um período de dez anos, de 2007 a 2017, a letalidade entre negros cresceu 62,3%.
Política pública
Em 2009, o Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra. Entre suas diretrizes estão a promoção de ações de combate ao racismo e o incentivo à produção de conhecimento científico sobre saúde da população negra.
Dez anos após sua implementação, no entanto, somente 57 municípios do país, em um universo de mais de cinco mil, colocaram o plano em prática. O levantamento foi realizado por pesquisadores da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo e da Universidade de São Paulo (USP).
“Um serviço, um hospital que faça formação dos profissionais e não inclua a discussão do racismo no seu currículo, na formação dos profissionais de saúde, ele está incorrendo no racismo institucional. O racismo dificulta as ações no campo da saúde”, defende Batista.
Além da falta de implementação efetiva da política, o corte de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) também é avaliado como prejudicial à população negra. A Emenda Constitucional 95, decretada em 2016, que congela os gastos na área da saúde por 20 anos, é um exemplo.
“Se nós estamos falando da população mais vulnerável, que mais depende da atenção primária, da estratégia da saúde da família, dos Mais Médicos, então um corte de orçamento interfere diretamente sobre esse grupo populacional”, afirma.
Apenas nos dois primeiros anos de vigência da emenda (2018/2019), cerca de 10 bilhões de reais foram retirados da saúde pública.
Ainda segundo o pesquisador da Abrasco, é preciso defender o direito à saúde de grupos vulneráveis como a população negra e afirmar políticas que fortaleçam a equidade na saúde pública, não apenas no Dia Nacional de Mobilização Pró-Saúde da População Negra, mas permanentemente.
(Reportagem originalmente publicada no Brasil de Fato em 28 de outubro)