A data 19 de abril marca o “Dia dos Povos Indígenas” no Brasil, grupos que, historicamente, sofreram e sofrem os mais diversos tipos de violência e cerceamento de direitos, entre eles o direito universal à Saúde. Cenário que ainda hoje, após a Constituição Federal de 1988 e a regulamentação do Sistema Único de Saúde (SUS), continua existindo.
O Brasil ainda acompanha, por exemplo, a emergência sanitária dos Yanomami, consequência do avanço do garimpo e pesca ilegais e da invasão de territórios, durante a omissão e a falta de fiscalização do Governo Bolsonaro. Há ainda a tese do “marco Temporal”, mais uma ameaça aos direitos e também à Saúde, afinal, essa discussão não se dissocia da relação com o território.
Assim, neste 19 de abril, os pesquisadores Eliana Diehl, Felipe Tavares e Maurício Leite, membros da Coordenação Colegiada do GT Saúde Indígena da Abrasco, pontuaram alguns dos principais desafios para aprimorar as políticas em saúde voltadas para essas populações.
1 – Invisibilidade: a falta de produção de dados e informação
A invisibilidade e a escassez de dados epidemiológicos e socioeconômicos específicos para os povos indígenas constituem barreiras no desenvolvimento de políticas públicas efetivas. A falta de diagnósticos precisos e de uma avaliação robusta do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (Sasi-SUS) impede a formulação de estratégias de saúde que sejam adaptadas à complexidade e à heterogeneidade cultural, social e demográfica dos povos indígenas.
Para as/os indígenas que vivem fora dos territórios que fazem parte dos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs), a dificuldade de obter dados é ainda maior, pois depende dos registros sob responsabilidade dos municípios em todo o país. Sem dados adequados, as políticas tendem a ser genéricas e descontextualizadas, não atendendo às necessidades específicas de cada comunidade ou grupo étnico.
2 – Desassistidos: a inexistência da atenção diferenciada
A atenção diferenciada, princípio da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI), ainda não se concretizou, dado que o modelo ainda em curso não se articula com a concepção de saúde dos povos indígenas. Saúde para os indígenas é um campo relacional muito mais amplo (corpo e território entrelaçados). Um desafio para o planejamento e a gestão, portanto, é a construção coletiva de novas práticas em saúde, com ampla participação de indígenas (gestoras/es, trabalhadoras/es da saúde, especialistas nativos, população indígena em geral) em todos os níveis do processo, desde o planejamento até a execução e avaliação das ações de saúde.
3 – Gestão: recursos financeiros e humanos insuficientes
Os desafios institucionais e políticos são consideráveis, como a instabilidade dos financiamentos para a saúde indígena, a rotatividade de pessoal, a falta de educação e capacitações permanentes e adequadas para os trabalhadores da saúde indígena, e as flutuações nas políticas públicas que afetam a continuidade e a qualidade da atenção à saúde indígena. Esses fatores ampliam as dificuldades de implementar um modelo diferenciado de saúde, que verdadeiramente atenda às especificidades culturais e sociais dos povos indígenas.
Caminhos e possibilidades: a importância da participação social
Para aprimorar as políticas de saúde voltadas para as populações indígenas, é fundamental garantir e fortalecer a participação dessas comunidades em todas as instâncias decisórias. Isso inclui não só os conselhos de saúde, mas também a gestão, execução e avaliação das ações e serviços de saúde. Além disso, é essencial garantir a capacitação permanente de lideranças e trabalhadoras/es indígenas de saúde, possibilitando que ocupem posições de decisão e contribuam com seus conhecimentos.
Articular saberes indígenas aos conhecimentos e práticas biomédicos e desenvolver políticas baseadas em evidências coletadas diretamente das comunidades indígenas também são passos cruciais. Por fim, mecanismos eficazes de monitoramento e avaliação devem ser implementados, permitindo ajustes constantes nas políticas de saúde para atender às necessidades específicas dessas populações, garantindo a alocação adequada de recursos.