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Direitos reprodutivos e o HIV/Aids

Juana Portugal

O Brasil é reconhecido internacionalmente devido ao sucesso da política de tratamento gratuito e universal adotada no país no que se refere a DST/Aids. Por este motivo, o expressivo número de trabalhos brasileiros sobre HIV apresentados durante o Congresso Mundial de Saúde Pública era esperado. Entre eles, aqueles que abordaram os direitos reprodutivos dos soropositivos ganharam destaque por seu ineditismo e pela abordagem de um tema pouco usual.

A vontade de ter filhos

Portadores de HIV que não têm filhos, principalmente os mais jovens e, em sua maioria homens, desejam tê-los. É o que indica a pesquisa realizada por Vera Silvia Facciola, da USP, no estudo intitulado “Vontade de ter filhos entre homens e mulheres vivendo com HIV/AIDS: um desafio para os serviços de saúde”. A pesquisa, uma das poucas a tratar sobre o tema no país foi realizada em dois centros de referência para DST/AIDS na cidade de São Paulo, com 729 mulheres e 250 homens.

Dentro deste grupo, 27,9% dos participantes declararam o desejo de ter filhos. Entre os homens essa proporção chega a 50,1% (e o número aumenta entre os bissexuais), em contraste 19,2% das mulheres manifestaram a vontade de ser mães. Um dado que chamou a atenção da pesquisadora foi o conhecimento sobre a transmissão vertical (da mãe para o bebê) ser significativamente menor entre os homens.

Os resultados sugerem que o estigma e a discriminação no contexto da epidemia da Aids e a falta de envolvimento masculino na atenção à saúde reprodutiva são desafios importantes para a organização dos serviços de saúde.

Gravidez Indesejada

Ao mesmo tempo em que o desejo de engravidar das mulheres HIV soropositivo deve receber acolhimento nos serviços referência para DST/Aids, a ocorrência de gravidez indesejada sinaliza a importância de garantir também acesso ao planejamento familiar nestes serviços.

Os direitos reprodutivos das mulheres HIV positivo são questões de âmbito da Saúde Pública Global. A pesquisa, realizada por Regina Maria Barbosa, da Unicamp, explora aspectos do comportamento reprodutivo de mulheres infectadas pelo HIV. A partir de estudo realizado entre maio e outubro de 2004 com 439 mulheres entre 18 a 49 anos que passaram por atendimento médico em sete serviços públicos municipais de referência para DST/AIDS em São Paulo, correspondente a aproximadamente 15% das mulheres HIV soropositivo em acompanhamento nestes serviços.

Entre as 36 mulheres gestantes (8%), 58% afirmaram que a gravidez era indesejada. A média de idade, filhos e tempo de diagnóstico de infecção pelo HIV foi maior entre estas quando comparadas as que desejavam a gestação. Entre as mulheres com parceiros, menor tempo de relacionamento e discordância sorológica para o HIV estão positivamente associados ao desejo de gravidez. Entre as não grávidas, 18% expressaram o desejo de filhos no futuro. Neste grupo, a intenção de ter filhos é maior (26%) entre mulheres com maior escolaridade e que não viviam com seus parceiros (32%).

A proporção de esterilização cirúrgica entre as mulheres é 18%, sendo que 63% a realizaram depois do diagnóstico. Entre aquelas com parceiros, a realização da laqueadura após o diagnóstico esteve positivamente associada à concordância sorológica do parceiro (77%) e à coabitação (70%). Intenção de ter filhos é maior (26%) entre mulheres soropositivas com maior escolaridade e que não vivem com seus parceiros (32%)

Testagem para o HIV na Gestação

O tratamento preventivo contra a transmissão de mãe para filho (vertical) do HIV é a intervenção mais eficaz e eficiente na prevenção de contaminação da criança no parto de uma soropositiva. Implantada no país desde 1996, constitui na utilização de AZT para a gestante e o bebê, e na contra-indicação do aleitamento materno. Quando o tratamento é aplicado, a taxa de transmissão do vírus é de praticamente zero, mas a efetividade deste procedimento está ainda muito aquém do que poderia ser.

Na pesquisa realizada por Guida da Silva, da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro entre janeiro de 1999 e março de 2000, foi constatado que uma em cada cinco mulheres de 5.060 pesquisadas não conhecia seu estado sorológico para o HIV. Os motivos são diversos, a falta de solicitação do exame de HIV, a demora em sua realização, a obtenção tardia do mesmo ou a não obtenção do resultado, o que impossibilita o tratamento.

Embora uma proporção relativamente grande de mulheres tenha realizado pré-natal (92,9%), uma em cada cinco mulheres não conhecia seu estado sorológico para o HIV. Provavelmente este número é maior, pois existe tendência de responder positivamente à questão sobre o conhecimento do estado sorológico, seja por fuga do problema ou por subestimação de sua importância.

A efetividade do tratamento encontra-se seriamente comprometida na população estudada (5.060 puérperas). Para a pesquisadora é urgente a necessidade de investimentos na rede de diagnóstico laboratorial, na capacitação dos profissionais envolvidos e no conhecimento da população sobre os riscos associados à não realização da testagem para o HIV durante a gravidez.

 

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