Durante a 2ª Conferência Internacional de Inovação Tecnológica em Saúde, de 29 de outubro a 1º de novembro, em Natal, o abrasquiano Cipriano Maia concedeu entrevista ao Tribuna do Norte sobre o projeto “Sífilis Não”. O programa, que pretende diminuir a transmissão da sífilis, doença sexualmente transmissível, foi destaque na Conferência, e é uma parceria do Ministério da Saúde com o Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (LAIS/UFRN).
Cipriano é o coordenador do Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva (NESC/UFRN), que oferece apoio técnico ao projeto, envolvendo equipes de pesquisadores e 52 apoiadores, que executam ações em 72 municípios de todo o país – breve executarão em 100 – selecionados conforme tamanho da população, número de casos da doença, e regiões críticas como zonas de fronteiras. Na prática, as equipes de apoiadores conscientizam gestores sobre o tema, incentivam que recursos sejam destinados no combate da doença, coletam dados – e visam construir campanhas de educação da população e garantir penicilina, o remédio, e teste rápido para diagnóstico.
Para o professor, reprimir a sexualidade e a discussão dos problemas associados é um risco, pois pode aumentar a transmissão de doenças. Confira, abaixo, trechos da entrevista:
A incidência de sífilis no Brasil pode ser vista como epidemia?
Sim, sem dúvida. É uma problema mundial, mas a situação do Brasil é extremamente desconfortável: os números são assustadores, e sabemos que, mesmo com os dados que temos, considerando as subnotificações, a incidência da doença deve ser bem mais grave. As medidas de combate que vinham sendo implementadas não conseguiram conter o avanço da doença. Um dos propósitos é justamente investigar por que as ações não estão contendo o aumento dos casos.
Há explicações para esse avanço?
Desde entraves burocráticos, e a falta de disponibilidade do medicamento para tratamento, até a não priorização do combate, e a falta de informação. Alguns
dados são bem absurdos, como quando um paciente busca tratamento em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) que não aplica a penicilina e encaminha a pessoa para uma Unidade de Pronto Atendimento – chegando na UPA é feita uma nova consulta mesmo já tendo uma prescrição médica. Outra situação é quando uma gestante é diagnosticada e não se trata o parceiro para interromper o ciclo da contaminação. É um tema complexo, que as práticas de saúde e de gestão precisam priorizar, pois a sífilis não teve um movimento social como teve a AIDS, e há uma visão equivocada de que é uma doença “de pobre” – mas que qualquer pessoa pode se contaminar.
A gestão do novo governo Federal pode afetar o projeto a partir de 2019?
É uma questão que teremos que enfrentar, pois quanto mais se reprimir a sexualidade e a discussão dos problemas associados, pior para todas as doenças sexualmente transmissíveis. De qualquer forma os recursos já estão alocados na UFRN, isso nos dá uma garantia em termos de continuidade, mas a nova equipe do Ministério da Saúde pode dificultar a execução das ações. A UFRN sozinha não tem autonomia, e o sucesso do projeto depende dessa articulação com o MS. O diálogo é decisivo para o sucesso das ações.