A edição de novembro (vol.29 no.4) da Physis: Revista de Ciência e Saúde Coletiva abordou os debates e os sentidos produzidos durante o 8 º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, realizado em setembro, em João Pessoa, Paraíba. O presidente do Congresso, Martinho Braga e Silva, assinou o editorial 8º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde: continuidade, convergência e coerência, e destacou o Ato público realizado durante o evento: “Cerca de mil congressistas caminharam aproximadamente dois mil metros pelas ruas da capital de um estado da Região Nordeste do Brasil, em defesa de mais diversidade e democracia no Sistema Único de Saúde – SUS”. Leia abaixo o artigo na íntegra e confira a publicação na base SciELO:
Cerca de mil congressistas (CBCSHS…, 2019) caminharam aproximadamente dois mil metros pelas ruas da capital de um estado da Região Nordeste do Brasil, em defesa de mais diversidade e democracia no Sistema Único de Saúde – SUS (EM PAUTA…, 2019). Na tarde de sábado do dia 28 de setembro de 2019, quase metade dos participantes do 8º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde (CONGRESSO…, 2019) partiram da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) em direção à Praça da Paz, tornando o evento científico ainda mais lúdico, cultural, artístico e político. No dia anterior, o Congresso havia sediado uma cerimônia aguardada ansiosamente por todos: a celebração dos 40 anos da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco (ENCONTRO…, 2019). Esse misto de protesto e comemoração marcou o 8º Congresso, sediado na UFPB, em João Pessoa, entre os dias 26 e 30 de setembro de 2019, intitulado “Igualdade nas diferenças: enfrentamentos na construção compartilhada do bem-viver e o SUS”.
O 8º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde contou com 2.168 participantes, enquanto o 7º Congresso em Cuiabá, no ano de 2016, recebeu 958; o 6º, no Rio de Janeiro em 2013, acolheu 1.645 (RELATÓRIO…, 2017); o 5º, em São Paulo no ano de 2011, o fez com 1.250; e o 1º, em Curitiba, no ano de 1995 – quando ainda se chamava Congresso Brasileiro de Ciências Sociais em Saúde – 400. O crescimento do número de participantes foi acompanhado pelo aumento na quantidade de instituições de ensino superior que vêm indicando representantes para a Comissão de Ciências Sociais e Humanas em Saúde da Abrasco, organizadora do evento. Em 1995, apenas seis instituições indicaram representantes (CANESQUI, 1995). Em 2011 esse número subiu para 10 (RELATÓRIO…, 2015) e em 2014, para 20 (RELATÓRIO…, 2016), atingindo 29 em 2019 (COMPOSIÇÃO…, 2019). Essa ampliação é fruto de um esforço coletivo, inclusive de professores do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, como Madel Luz, Luiz Antonio de Castro Santos, Kenneth R. Camargo Jr., Roseni Pinheiro, Francisco Ortega e Claudia Mora, que se revezaram como representantes do Instituto na mencionada Comissão (PINHEIRO, 2013).
Esses congressos ora expressam concentração da produção científica no eixo Sul-Sudeste (IANNI et al., 2015), ora capilaridade regional das Ciências Sociais e Humanas em Saúde (TRAD, 2012), de maneira que uma das conquistas do 8º Congresso diz respeito justamente ao fato de que a imensa maioria de seus grupos temáticos (GTs) – 27 dos 29 – foi pluri-regional, ou seja, foram GTs coordenados por pessoas vinculadas a instituições localizadas em pelo menos duas das cinco regiões do Brasil, incluindo Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A diversidade regional dos GTs encontra-se em convergência com a própria configuração da Comissão de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, única das três comissões da Abrasco – as outras duas são Epidemiologia e Política, Planejamento e Gestão – com representantes de universidades das cinco regiões do país. A capilaridade, a diversidade e a descentralização regional no 8º Congresso e na Comissão representam um avanço na luta contra as iniquidades em ciência e tecnologia no Brasil, revelando a continuidade entre as últimas gestões da Comissão.
Essas e outras conquistas do 8º Congresso expressam, além de continuidade e convergência, coerência entre ideias e atos, pois o trabalho em equipe das comissões organizadoras nacional e local, do mesmo modo que da comissão científica do Congresso, viabilizou a igualdade nas diferenças em variados planos. Dentre as inovações do Congresso, destacam-se: 1) estudantes apresentaram propostas de GTs, alguns dos 29 sendo coordenados por alunos de cursos de especialização, inclusive; 2) integrantes de movimentos sociais fizeram parte da comissão científica, colaborando para a construção dos critérios para premiação dos trabalhos apresentados nos 29 GTs; e 3) foram elaborados critérios de avaliação específicos para os relatos de experiência apresentados nesses GTs, valorizando o grau de aprendizado adquirido nas vivências, bem como o exercício do pensamento crítico sobre as intervenções.
Nada disso teria sido possível sem o protagonismo da comissão organizadora local em todo o processo de construção do Congresso, da qual participaram Eymard Vasconcelos, Pedro Cruz e outros representantes da Educação Popular em Saúde da UFPB, envolvidos em projetos de extensão reconhecidos nacionalmente (VASCONCELOS; CRUZ, 2013). Os habitantes de João Pessoa ainda sofrem danos simbólicos e materiais ligados direta ou indiretamente ao cenário governamental nacional, como o preconceito regional (EXAME, 2019) e a poluição nas praias (PESQUISADORES…, 2019).
Abordar o bem-viver (ACOSTA, 2016) se torna urgente quando vivemos esses e outros desastres socioambientais, pois tal conceito emerge como uma crítica à ideia de desenvolvimento: mais do que eficiência, trata-se de suficiência, numa perspectiva voltada para a convivência em comunidade, distinta também de um bem-estar exclusivamente individual. Em meio a tanto machismo e outras tantas formas de discriminação presentes nos pronunciamentos de representantes do Governo Federal atual, nada mais necessário do que pautar o debate sobre a igualdade nas diferenças em nossos congressos.
Reunimos educadoras e estudantes, poetas e pesquisadoras, militantes e representantes dos povos indígenas na Praça da Paz de João Pessoa durante o 8º Congresso, nutrindo a esperança de que outros atos públicos venham povoar os eventos da Abrasco e de outras associações científicas brasileiras que lutam por direitos. Ainda temos muitos enfrentamentos adiante, pois é cada vez mais evidente que o mundo contemporâneo não é dos mais amistosos a uma construção compartilhada entre academia, serviço e comunidade.
Por fim, como já é praxe no Editorial do último número de Physis em cada ano, agradecemos de público a todos os pareceristas que nos auxiliaram, de novembro/2018 a outubro/2019, na difícil tarefa da editoração científica. Seus nomes estão listados a seguir. Adicionalmente, fazemos agradecimento especial à parecerista que mais se destacou nesses 12 meses, pela qualidade e quantidade de suas colaborações: Leila Senna Maia, pós-doutoranda e pesquisadora colaboradora no IMS-UERJ, que realizou nada menos que oito pareceres para nossa revista. A você, Leila, e a todos os demais revisores e autores, nosso muito obrigado!