Em sua coluna na Folha publicada em 9/12 (“Maus hábitos colocam o país entre os líderes em obesidade”), Cláudia Collucci chama a atenção dos leitores para um dos principais – e crescentes – problemas de saúde pública em nosso país: a obesidade.
Além de apresentar dados corretos e inquietantes sobre o problema, a jornalista menciona o novo Guia Alimentar para a População Brasileira, lançado recentemente pelo Ministério da Saúde, que aborda aspectos fundamentais do modo como nos relacionamos com a comida e os impactos dessa relação sobre a saúde, a cultura, os recursos naturais e as relações sociais.
Sobre este assunto, os Abrasquianos Eduardo Faerstein e Fábio Gomes redigiram o artigo ‘Falsos alimentos’ que foi publicado neste sábado 10 de janeiro, também na Folha de São Paulo. Confira na íntegra:
Tem se tornado confusa a noção do que é de fato alimento. O espaço da comida no orçamento dos brasileiros tem sido cada vez mais tomado por produtos que são chamados de alimentos, indevidamente. São supérfluos comestíveis, fabricados e promovidos de modo a aumentar progressivamente sua participação no sistema alimentar.
Para tanto, são utilizadas estratégias mercadológicas: personagens infantis no rótulo de produtos, propaganda com jingle que “gruda” na mente, sorteios, venda casada com brinquedos e oferta de porções gigantes a preços promocionais. Chega-se até ao financiamento de campanhas eleitorais e à contratação de cientistas para afirmarem que o produto faz bem.
Esses “produtos” ultra processados (ex. refrigerante, pratos prontos, guloseimas), em geral, não são versões alteradas de alimentos, e sim produtos de natureza distinta daquela dos ingredientes neles utilizados.
Apresentam composição nutricional desequilibrada, com altos teores de gordura, açúcar e/ou sal, baixo teor de fibras e alta densidade de calorias; são hiperpalatáveis (com componentes que realçam sabor, induzindo seu consumo habitual) e em geral estão prontos para imediato consumo.
Associam-se a práticas alimentares não saudáveis, como substituir refeições por lanches e comer sem atenção, excessivamente e a qualquer hora em praticamente qualquer lugar. Seu uso, já se sabe, vem contribuindo para a epidemia mundial de excesso de peso, causando aumento do diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer, entre outros problemas.
Em seu texto, a jornalista sublinha que “a obesidade ainda não entrou pra valer na agenda política do país” e questiona: “receio do enfrentamento de interesses da indústria alimentícia ou apenas desinteresse total pela saúde da população e pelas finanças públicas?”
Por tudo isso, mais do que o sugerido estimulo à força de vontade individual para mudança de hábitos, cabe insistir vigorosamente: o consumo desses produtos deve ser limitado por meio de medidas legislativas restritivas das estratégias mercadológicas e econômicas (p. ex. taxação), uma vez que esforços individuais são insuficientes contra o arsenal persuasivo, e iniciativas voluntárias do setor produtivo não são efetivas contra sua própria prática.
Somente com tais medidas será possível promover ambientes favoráveis à alimentação saudável tanto do ponto de vista nutricional como social, ambiental e cultural.