Defesa da criação da carreira médica de Estado e opiniões divididas sobre a Agência para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (Adaps) marcaram debate promovido nesta quarta-feira (11) pela comissão mista que analisa a medida provisória do Médicos pelo Brasil (MP 890/2019), programa criado em substituição ao Mais Médicos. Criada pela MP, a agência será responsável pelas regras gerais do novo programa e deverá se encarregar da contratação dos profissionais.
As maiores críticas à Adaps vieram do representante da presidência da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Heleno Corrêa, que associou a “agencialização” da administração pública a uma ameaça aos direitos sociais conquistados na Constituição de 1988. Ele condenou as ações do governo federal que promovem o esvaziamento dos conselhos sociais, transferindo suas atribuições para agências onde “o usuário não tem vez”. Na avaliação de Corrêa, a medida provisória mantém a tendência contrária à democracia participativa direta.
— De um lado, se criminaliza a gestão, de outro, se agencializa o Estado — resumiu, cobrando maior presença do Conselho Nacional de Saúde.
Heleno Corrêa defendeu a carreira médica de Estado e a importância de fundações tradicionais como a Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), que, afirmou, reduzem a necessidade de criação de novas instituições que farão “mais do mesmo”.
CLT
O presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), Lincoln Lopes Ferreira, lembrou que a carreira médica de Estado é uma importante aspiração da categoria, mas ressalvou que, sem equipamentos e condições de trabalho, o profissional não passará de um “espectador angustiado”. Ele defendeu o atendimento de saúde como política “de Estado, e não de governo” e criticou os aspectos políticos que invadem continuamente questões técnicas na ciência médica.
— A pessoa dedica seus melhores anos na formação e não tem como exercer aquilo que aprendeu. [Não sabe] se terá condições de trabalho e até se vai receber. Por isso, faltam médicos — disse.
Para Ferreira, o programa Médicos pelo Brasil representa oportunidade aos “jovens colegas”, ainda que não através da carreira clássica que esperavam. Ele afirmou que não existe solução fácil para os médicos diante da complexidade do país.
O secretário-geral da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Carlos Fernando da Silva, reconheceu os avanços do Médicos Pelo Brasil em relação aos Mais Médicos, mas opinou que o regime de contratação dos profissionais pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não é carreira e não garante a fixação dos profissionais em seus postos. Segundo estatística que citou, os médicos contratados por organizações sociais permanecem somente cinco anos em suas funções e a proposição da MP, na opinião dele, poderia ser melhorada nesse aspecto.
— O médico não necessita somente da parte financeira. Não é o salário somente que vai fixar os médicos nos rincões — afirmou.
O representante da Fenam ainda citou questões políticas locais que se sobrepõem à competência técnica e levam ao afastamento dos médicos por desentendimentos com autoridades municipais. Segundo ele, a contratação através de uma fundação, em vez de uma agência, permitiria um controle maior sobre o programa.
Defesa
O diretor da Secretaria de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde, Lucas Wollmann, defendeu a Adaps. Ele ressaltou que o Médicos pelo Brasil terá a mesma dotação orçamentária do Mais Médicos e que a agência consumirá 0,3 % destes recursos — parcela inferior à taxa de administração de qualquer organização, conforme declarou.
Wollmann disse que o programa oferece perspectivas aos médicos, que terão progressão de carreira clara e salário atrativo, com possibilidade de adicionais de desempenho. Ele acrescentou que o Médicos pelo Brasil favorece o melhor uso do dinheiro público quando aumenta a possibilidade de os municípios fixarem os profissionais.
O representante do Ministério da Saúde também declarou apoio à realização, duas vezes por ano, do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por Instituições de Educação Superior Estrangeira (Revalida). E defendeu a regra do Médicos pelo Brasil de só aceitar profissionais com diplomas devidamente revalidados. Para ele, isso remove restrições impostas pelos municípios para exercício de certas atividades.
— Liberdade profissional no Brasil para exercício de medicina, só através de diploma emitido por instituição brasileira ou através de revalidação de diploma estrangeiro — declarou.