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Estratégias e perigos do negacionismo científico são debatidos em painel da Ágora Abrasco

Pedro Martins

Uma das maiores dificuldades que se encontra nas respostas a serem dadas à pandemia de Covid-19 está no grande negacionismo a científico que paira o debate público. Questionar a ciência e seu discurso é algo que permeia a história do pensamento humano e ajuda a busca de novos conhecimentos e as descobertas de novos rumos para se seguir. Entretanto, desqualificar com suposições sem qualquer embasamento em evidências ou pesquisas pode levar a caminhos ruins. Essa postura de desestabilizar com elementos sem nenhuma evidência e suas consequências diante da pandemia foi debatida do painel “Covid-19 e negacionismo: quem tem medo da ciência?” da Ágora Abrasco realizado no dia 16 de julho. O debate contou com a presença de Kenneth Camargo (IMS/UERJ); Luis David Castiel (ENSP/Fiocruz); Sandra Caponi (SPO/UFSC); e Marta Verdi (SPB/UFSC). A integrante da Comissão de Ciências Sociais e Humanas em Saúde da Abrasco, Monica Nunes (ISC/UFBA), coordenou a atividade.

Negacionismo não é algo recente

Keneth Camargo abriu o debate abordando uma perspectiva crítica da ciência. O pesquisador falou sobre os aspectos positivos de se questionar a ciência, mas também lembrou que o negacionismo teve anteriormente artimanhas de tentar assumir um caráter científico também: “Um desafio é pegar uma ciência que é embasada, eticamente justificável e tenta combater a ciência nessa vertente do negacionismo. Um exemplo é a indústria do tabaco que criou pesquisas negando os efeitos nocivos do tabaco. Em geral isso acontece por interesse econômico”. O pesquisador apontou também que a estratégia do negacionismo atual passa por desestabilizar pontos já consensuais em ciência, como acontece em relação à pandemia: “Temos de pensar como nos utilizamos da melhor forma possível as nossas ferramentas críticas para impedir os abusos da ciência, mas também para impedir que uma ciência extremamente razoável vá pelo ralo no enfrentamento da pandemia, que é a grande crise deste século”.

Em seguida, Luis David Castiel apontou que o negacionismo não é um fenômeno novo mas que assume atualmente contornos diferenciados:”O negacionismo não é recente. Ele assumiu feições particulares neste momento em que ele entra num fenômeno magnético com as fake news. Trata-se de negar evidências fortes e trazer também a ideia de que não consenso sobre algumas coisas pré-estabelecidos”. A relação desta prática com o cenário político aponta para caminhos preocupantes, segundo Castiel: “Algumas pessoas têm tentado descrever a situação política que se vive como sendo ou tendo traços fascistas. Está virando uma fórmula que eu acho perfeitamente cabível. Uma autora, que não vou citar, fala que o negacionismo é uma prática de cunho fascista”. Por fim, o pesquisador aponta que a prática tem levado a teorias conspiratórias sem base de sustentação na realidade: “O dominador comum dos movimentos negacionistas é trazer para domínio público sem conhecimentos sustentáveis da ciência uma espécie de dúvida primordial, como se nada estivesse definido”.

Necessidade da crítica e excesso de informação compõem o debate

A diferenciação entre epistemologia crítica e negacionismo foi o ponto de partida da abordagem de Sandra Caponi. Segundo a pesquisadora, “uma epistemologia crítica tenta colocar as dificuldades inerentes a todos os conhecimentos científicos, valendo-se de outros estudos científicos, relatos de experiência ou relatos de experts e de uma série de materiais que podem contribuir para sua crítica”. Isso nada tem a ver com o negacionismo, como aponta a pesquisadora. Sandra aponta cinco características essenciais do negacionismo, que seriam: 1) identificação de conspirações; 2) uso de falsos experts; 3) seletividade de artigos que contrariam o consenso científico; 4) criação de expectativas impossíveis para as pesquisas; e 5) uso de deturpações ideológicas. Diante desse quadro, a pesquisadora acena para o problema político de tal postura: “O negacionismo se tornou perigoso em países como EUA e Brasil por ter se tornada estratégia sistemática dos governos”.

Os efeitos da infodemia e desdobramentos na ciência foram levantados por Marta Verdi: “Essa pandemia gerou uma forma de trabalho vertiginosa para entender o SARS-CoV-2″. São mais de 200 projetos de pesquisa só para formulação de vacinas”. A pesquisadora apontou que o excesso de informação torna-se, muitas vezes, uma estratégia para desinformação: “outro fenômeno se fez presente: a da profusão de informações científicas e não-científicas. É fundamental lembrar que a disseminação do conhecimento científico é uma dimensão da popularização da ciência. No entanto, nem todos os gestores foram sensíveis”. Marta também foi veemente em sua crítica à forma como o negacionismo entrou em muitos ministérios, especialmente na Saúde, Educação e Ciência e Tecnologia.

Confira a íntegra do painel na TV Abrasco:

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