Uma pandemia que não pode ser minimizada e uma população brasileira que precisa e merece ser cuidada. Novas manifestações públicas reforçam a insensatez e incoerência da fala presidencial em cadeia nacional de rádio e TV na noite de 24 de março, dessa vez encabeçada por sete ex-ministros da saúde.
Assinada por Humberto Costa (2003-2005), José Saraiva Felipe (2005-2006), José Agenor Álvares da Silva (2006-2007), José Gomes Temporão (2007-2010), Alexandre Padilha (2011-2014), Arthur Chioro (2014-2015) e Marcelo Castro (2015-2016), a nota de repúdio aponta ainda que, ao sugerir o isolamento vertical, restrito à população idosa e com comorbidades, Bolsonaro considera viável trancafiar em casa justamente as pessoas que mais precisam de ajuda e orientação, o que só os exporia mais ao permitir a livre circulação das demais pessoas, o que potencializaria a transmissão do SARS-CoV2.
“As medidas implementadas pelo Ministério da Saúde, pelos gestores da saúde, técnicos e profissionais do SUS não podem ser desrespeitadas e precisam ser defendidas. As vidas dos trabalhadores da saúde, atualmente expostas para salvar nossa população, não podem ser relativizadas em função de interesses da economia” ressalta o documento, já noticiado nos principais veículos de comunicação.
Acesse aqui o PDF e leia a nota na íntegra, abaixo:
Nota de Repúdio
Como ex-ministros de saúde expomos nossa indignação e total discordância com o pronunciamento feito pelo Presidente da República, na noite de 24 de março, em cadeia nacional de rádio e TV. Vimos a público denunciar os graves efeitos nocivos das posições defendidas pelo presidente da República que procura minimizar e tratar de forma insensata uma pandemia com essas proporções, que já provocou a morte de mais de 18 mil pessoas, no mundo, até o momento.
O Sr. Jair Bolsonaro, principal dirigente do Executivo Federal, negou as evidências científicas que vêm embasando as ações governamentais de combate à pandemia da COVID-19 em todo o mundo e que preconizam o isolamento social como ação de inquestionável relevância para enfrentar a evolução da infecção pelo coronavírus, reduzir o número de infectados e, com isso, possibilitar ganho de eficácia na organização da rede de atenção à saúde e garantir o atendimento aos casos mais graves e diminuir o número de óbitos.
Preocupado em atender interesses estritamente econômicos, propõe uma dicotomia entre o enfrentamento da crise na saúde e na economia. Os países que têm conseguido os melhores resultados são aqueles que fizeram o isolamento social, garantiram o atendimento à saúde da população e tomaram medidas para manter a renda e ativar a economia. Não há, portanto, dicotomia entre manter a atividade econômica e salvar vidas.
Ao advogar o isolamento vertical, restrito à população idosa e com comorbidades, Bolsonaro considera viável trancafiá-las em casa, sem nenhum contato com familiares, cuidadores, que passariam a circular livremente num ambiente totalmente favorável à disseminação do vírus corona. Tal postura, além de desmobilizar a população que vem fazendo sua parte, seguindo as orientações da OMS, do próprio Ministério da Saúde, dos governadores, prefeitos, imprensa e líderes do parlamento, fere também, de maneira irreconciliável, ao pacto federativo e a autonomia de seus entes.
As medidas implementadas pelo Ministério da Saúde, pelos gestores da saúde, técnicos e profissionais do SUS não podem ser desrespeitadas e precisam ser defendidas. As vidas dos trabalhadores da saúde, atualmente expostas para salvar nossa população, não podem ser relativizadas em função de interesses da economia.
Além disso, o belicoso presidente confronta e desrespeita o trabalho relevante da imprensa e de outros meios de comunicação, importantes aliados na difusão de informação e esclarecimento da população sobre a COVID-19.
Seu pronunciamento pode resultar em uma sobrecarga do sistema de saúde brasileiro de trágicas consequências, particularmente entre os grupos mais vulneráveis da sociedade.
É necessário que os líderes republicanos se juntem em torno da defesa da vida. Primeiro, para salvar as pessoas, e depois para salvar a economia.
Da nossa parte, na condição de ex-Ministros da Saúde, vamos recorrer à Organização Mundial de Saúde e à Comissão de Direitos Humanos da ONU para que acompanhem o enfrentamento da pandemia de Covid19 no Brasil.
Temos compromisso de nos engajarmos no esforço da sociedade brasileira na proteção de nossa população, independentemente de sua condição econômica e social e de sua faixa etária. Nosso dever é preservar a vida de nossos cidadãos.
26 de março de 2020
EX-MINISTROS DA SAÚDE DO BRASIL
Humberto Costa
José Saraiva Felipe
José Agenor Alvarez da Silva
José Gomes Temporão
Alexandre Padilha
Arthur Chioro
Marcelo Castro