A reunião do G7 fecha um importante ciclo de reuniões de alto nível para avaliar e propor rumos para o enfrentamento global da pandemia de Covid-19. Antecedida pela Cúpula sobre Saúde Global do G20 e a Assembleia Mundial da Saúde, ambas realizadas na segunda quinzena de maio, a Cúpula do G7 reuniu-se no fim de semana passado em Carbis Bay, Cornwall, no Reino Unido, a primeira depois da era Trump.
Um dos temas prioritários foi a pandemia. A expectativa do mundo era grande, já que ali tinham assento os chefes de Estado e de governo de sete das maiores economias do mundo, detentoras de cerca de 60% da riqueza e 35% do PIB global, e ao redor de apenas 10% da população mundial. São responsáveis também por 60% das emissões totais de carbono e 50% das doses de vacinas contra a Covid-19 contratadas até o momento. Outros temas abordados foram a crise do clima e a Cop-26, que se realizará em Glasgow, em novembro de 2021, e as taxações nacionais e global das atividades das multinacionais ao redor do planeta. Se nestes dois últimos quesitos parece que a cúpula do G7 foi bem avaliada, no caso da pandemia e da saúde global deixou muito a desejar.
Num movimento inédito, a OMS, o FMI, a OMC e o Banco Mundial, unidos, publicaram uma declaração no jornal “Washington Post” pedindo que o G7 liberasse US$ 50 bilhões para que, por intermédio da OMS, todos os países do mundo pudessem vacinar contra o coronavírus pelo menos 40% da população alvo até dezembro de 2021 e 60% até meados de 2022. Para isso, seriam necessárias cerca de 11 bilhões de doses de vacinas. Uma parcela de tais recursos seria aplicada também em equipamentos para assistência, proteção e prevenção, como oxigênio, equipamentos hospitalares e medicamentos de suporte.
Ao fim e ao cabo da Cúpula, o G7 anunciou a doação de apenas 1 bilhão de doses até o fim de 2022, longe em quantidade e prazo do originalmente solicitado. E não respondeu ao pleito dos US$ 50 bilhões, nem fez qualquer menção à flexibilização de patentes, apenas um breve e frio aceno quanto a trabalhar em parceria com outros membros da OMC para “formular soluções pragmáticas, eficazes e holísticas de longo prazo para o comércio em saúde”.
Ora, se não forem as nações mais ricas do mundo a propiciar financiamento para a vacinação, ainda que comprando as vacinas das suas próprias empresas nacionais e, portanto, deixando o dinheiro nos próprios mercados desenvolvidos, quem poderia fazê-lo? Há tempo se sabe que não há muito espaço fiscal nos orçamentos de pelo menos 100 das nações mais pobres do mundo para gastos sociais, soterradas por grandes dívidas externas e imensas demandas quanto à alimentação e condições essenciais e primárias de manutenção da vida.
A declaração sobre saúde emitida pelo G7 tem 16 parágrafos e 2.015 palavras; entre elas, não se encontra a palavra “patente”. De outro lado, o grupo foi pequeno no número de doses doadas e fez ouvidos moucos quando se tratava de aportar recursos financeiros necessários e solicitados. Contudo, se compromete, para o futuro, com a implementação de uma série de medidas, uma verdadeira aula de bons propósitos em multilateralismo e saúde pública de doenças infecciosas. Também para o futuro, se compromete com um conjunto de recomendações contidas no documento “100 Days Mission”, a serem tomadas a partir de uma declaração de uma emergência em saúde pública pela autoridade sanitária mundial, a OMS.
Difícil é crer que todas estas rutilantes proposituras de hoje, entoadas em meio às águas azuis e cristalinas de Carbis Bay, de fato se cumpram mais tarde, pois o G7 foi omisso quanto a medidas simples, concretas e reais a serem implementadas de forma urgente ainda hoje para enfrentar a pandemia que reconhece ser tão grave.
* Paulo Buss é coordenador do Centro de Relações Internacionais em Saúde (CRIS/Fiocruz); Santiago Alcázar é assessor sênior do Centro de Relações Internacionais em Saúde da Fiocruz – Publicado originalmente em O Globo, em 15/06/2021 – clique e acesse.