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Gulnar Azevedo e Silva, presidenta da Abrasco, fez uma importante participação na 309ª reunião ordinária do Conselho Nacional de Saúde (CNS), órgão colegiado responsável pela discussão, deliberação e recomendação das políticas de saúde e de ações do Ministério da Saúde (MS). A atividade aconteceu em 12 de setembro último, no plenário Omilton Visconde, em Brasília (DF).

A Abrasco foi convidada a dar sua contribuição ao debate dos desafios da assistência à saúde e os caminhos percorridos pelo SUS em 30 anos. O ponto de pauta também contou com a apresentação da médica oncologista e ex-servidora do INCA, Maria Inez Gadelha. A coordenação foi do conselheiro André Luiz de Oliveira, representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

Gulnar abriu sua participação saudando os presentes e destacando o papel do Conselho em promover o debate amplo e democrático que aponte caminhos para uma efetiva assistência à população. “O SUS está aí, é uma realidade, tanto para defendê-lo como para fazê-lo avançar”, disse a presidenta.

Com dados e argumentos consolidados e referenciados na edição comemorativa (vol.23 nº.6) de Ciência & Saúde Coletiva pelos 30 anos do Sistema, Gulnar apresentou alguns dos números que caracterizam a aplicação de recursos em saúde e o tamanho do SUS. Com o montante total do valor investido em cerca de 9,3% do Produto Interno Bruto (PIB), o setor saúde no Brasil possui a peculiar característica de, mesmo tendo um sistema único e universal, ter 54% do total dos gastos (incluindo governos, empresas e famílias) investidos no setor privado, que atende cerca de 25% da população, enquanto os 46% restantes desses mesmos gastos são empenhados no setor público, ou seja no SUS. E é justamente o SUS que garante o atendimento à maior parte da população – cerca de 75%. Tais números mostram como as coberturas e os investimentos em saúde são extremamente desiguais.

“Só ter a cobertura ou realizar o pagamento mensal aos planos não garante um bom atendimento, e com certeza os brasileiros não estão recebendo”, destacou Gulnar, frisando que, apesar do curto e crônico subfinanciamento do SUS, o sistema pode funcionar muito bem, como acontece em algumas cidades do país, fazendo com que as pessoas optem pela assistência pública. “Quando o SUS funciona bem, da forma como os nós sanitaristas defendemos, ele é tão bom e melhor do que os planos podem oferecer. Se o sistema funcionasse como na lógica de sua concepção e construção, estaríamos prestando uma assistência muito melhor”, relembrou a presidenta.

Outro número que expressa a força do SUS é o desenvolvimento da Estratégia da Saúde Família (ESF). Num intervalo de um pouco mais de 30 anos, o número de estabelecimentos de saúde passou de 21.532, em 1981, para 129.544, em 2017, crescimento puxado centralmente pelas unidades do serviço público dedicadas à Atenção Primária à Saúde (APS), como Unidades Básicas (UBS) e Clínicas da Família. O mesmo cenário é confirmado pelo crescimento do acesso, que passou de 54,7% da população, baseado nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 1998, para 71,2%, em 2013, conforme os dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS).

No entanto, foi essa área da política de saúde que sofreu um dos maiores desmontes vividos pelo SUS nos últimos dois anos, com a aprovação da nova PNAB, em 2017, que deixou a cargo de cada município o modelo e as estratégias de organização da APS. Para Gulnar, as mudanças na PNAB e a contrarreforma da Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas “são as provas de que o SUS precisa retomar seu rumo”.

Resgatando ideias de importantes nomes do Movimento Sanitário e discussões em diversos fóruns da Abrasco, a presidenta da Associação reforçou que os desafios impostos ao SUS passam mais pela reconstrução da institucionalidade do Sistema do que por discussões sobre procedimentos cotidianos. “É necessário prosseguir com a Reforma do Estado e construir um modelo de gestão que valorize um desenho institucional calcado na racionalidade da coisa pública e nas necessidades em saúde, permitindo que as gestões operem com autonomia do mercado e do Poder Executivo. Precisamos de um sistema autárquico, com maior capacidade de fiscalização e participação efetiva da sociedade na gestão, que valorize as políticas aprovadas pelas instâncias de cogestão, como o CNS, as conferências e as comissões tripartites. Precisamos também de uma legislação que reduza os cargos de confiança e de livre provimento. A discussão de tabela não é prioridade. Discute-se centavos quando o problema não está ali”, explanou Gulnar, entre outros argumentos.

Mortalidade expressa cenário de vulnerabilidades: Ao final, fez uma avaliação da queda de alguns indicadores de saúde, em especial da mortalidade infantil, citando números e constatações presentes no Especial Abrasco sobre o tema. “O componente que está aumentando na mortalidade infantil é a pós-neonatal, ou seja, mortes após 28 dias de nascimento. São óbitos que independem das condições do parto. Isso significa que as crianças estão morrendo de diarreia. E por que elas estão morrendo de uma causa evitável? É pelo desemprego, pela fome e aumento da insegurança alimentar. É pela queda nos níveis socioeconômicos, pela falta de condições daqueles que estão abaixo da linha da pobreza. São as famílias que estão passando por essas condições que estão vendo seus filhos morrerem”, disse a presidenta, relembrando que a queda da mortalidade já vinha acontecendo há 20 anos, muito antes dos governos Lula e Dilma, e que a curva começou a ser alterada entre os anos de 2015 e 2016.

“Vínhamos de um quadro anterior de muita fragilidade. Se não percebermos que, dentro desse cenário de desigualdade, qualquer mexida em programas de transferência de renda vai afetar a vida das pessoas, a gente não vai evoluir. É fundamental a luta contra a desigualdade em nosso país. Temos a clareza que é a população negra quem mais sofre – sofre pela desigualdade, pelas carências e sofre pelo racismo institucional, inclusive nos serviços de saúde”, avaliou a presidenta, ressaltando que há muito a ser feito e que, apesar do cenário, precisamos trabalhar com otimismo e esperança. “Precisamos reconhecer que o SUS, para melhorar, precisa de um esforço muito grande. Não só aprimorando a gestão, mas um esforço que passa também por repensar democraticamente como vamos trabalhar as diversas questões que aqui debatemos. A população precisa saber que o bom hospital é do SUS, que a vacina é do SUS, que a vigilância é do SUS”. Essa parte da sessão da 309ª reunião do CNS foi transmitida na rede social Facebook. Clique aqui e acesse. 

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