“O Brasil fica cada vez mais difícil, mas a Abrasco continua viva e lutando por melhores condições de vida e saúde para todas e todos os brasileiros, pelo fortalecimento do SUS e em defesa da democracia. Chegamos até aqui juntos e inteiros e com muita vontade de continuar esse trabalho”, afirma Gulnar Azevedo e Silva, epidemiologista e professora do Instituto de Medicina Social Hésio Cordeiro da UERJ, no momento em que encerra sua gestão à frente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva.
Quando a chapa “Resistir e Avançar” foi eleita, no Abrascão 2018, já havia um cenário político desfavorável com desmonte de políticas de sociais e de saúde exitosas. Mas fazia sol: os que passavam pela Tenda Marielle Franco, no campus da Fiocruz, Rio de Janeiro, sentiram o clima de muita vibração e firmaram um compromisso com a Abrasco, com a Saúde Coletiva e com a sociedade brasileira.
Gulnar se despede da presidência – mas não da Associação – e faz algumas reflexões sobre a atuação da entidade nos últimos três anos:
Comunicação Abrasco – Como você avalia a atuação da Diretoria da Abrasco 2018-2021?
Gulnar Azevedo e Silva – Fomos eleitos no Abrascão 2018, na Fiocruz – Rio de Janeiro. Foi uma semana de sol em pleno inverno carioca, e o congresso homenageava Marielle Franco, vereadora assassinada naquele mesmo ano. Foi nesse clima que fomos eleitos e assumimos a nossa gestão. O nome da nossa chapa era Resistir e Avançar, porque entendemos que resistir é pouco, nós precisávamos avançar. Ainda não conseguimos avaliar o quanto avançamos. Mas é possível dizer que resistimos bastante.
Buscamos fortalecer o diálogo e a autonomia de cada um dos GTs, Fóruns, Comitês e Comissões, mas sempre mantendo a unidade, tendo em vista que a Abrasco é uma Associação com muita história e muitas frentes de atuação. Na Diretoria, por exemplo, atuamos sem fazer nenhuma distinção entre vice-presidentes e conselheiros, em todos os momentos discutimos amplamente nossos posicionamentos e nossas ações.
Comunicação Abrasco – E como foi presidir a Associação durante a maior crise sanitária da história?
Gulnar Azevedo e Silva – Destaco dois pontos importantes, a Frente Pela Vida e a Ágora Abrasco.
Frente Pela Vida
A construção da Frente Pela Vida começou com a Marcha Pela Vida, em junho de 2020, com o apoio de mais de 600 movimentos e organizações. A partir disso, construímos o Plano Nacional de Enfrentamento à Pandemia, com 70 recomendações para autoridades políticas, sanitárias, gestores do SUS e a sociedade em geral. Houve uma participação importante na elaboração do Plano de todos os GTs da Abrasco, e das entidades que foram se somando na Frente Pela Vida. É, ainda, um documento muito atual. Lançamos, em dezembro de 2020 a Campanha Brasil Precisa do SUS – Vacina para todas e todos. Nos mantivemos em diálogo com o Congresso Nacional e com várias organizações da sociedade civil.
Também a partir da Frente iniciamos um movimento com entidades da educação e da assistência social, e fizemos o manifesto “Saúde, Educação e Assistência Social em defesa da Vida e da Democracia”, que busca orientar a comunidade escolar sobre a volta às aulas, no contexto da Covid-19.
Ágora Abrasco
A Ágora foi uma ideia inicial do nosso vice-presidente Naomar de Almeida Filho, e fizemos 114 edições – de 7 de abril de 2020 a 7 de julho de 2021. Debatemos a pandemia desde o primeiro momento, de forma interdisciplinar, sobre os mais diversos temas da Saúde Coletiva, considerando os aspectos biológicos, clínicos, ambientais, políticos, econômicos, sociais e culturais. Discutimos medicamentos e vacinas, distanciamento social, colapso do Sistema Único de Saúde, iniquidades em saúde…os debates foram (e são) muito importantes para a elaboração de novas percepções sobre o novo coronavírus. Incentivamos a discussão entre os pares e investimos na divulgação científica e no diálogo com a sociedade.
Comunicação Abrasco – É possível falar em atuação científica, na Saúde Coletiva, sem atuação política?
Gulnar Azevedo e Silva – Não. Todas as notas políticas publicadas pela Diretoria da Abrasco, são embasadas cientificamente, e todos os documentos científicos respondem às urgências que o momento político exige. Nos posicionamos em defesa do Sistema Único de Saúde e do direito universal à saúde, e produzimos conteúdos que indicam como e valorizar e aprimorar o SUS.. Em todos os documentos que produzimos sugerimos propostas concretas, que podem subsidiar o poder público e engajar toda a sociedade no processo de fortalecimento do SUS, na defesa da vida e da democracia.
O nosso posicionamento político, expresso na carta que escrevemos em parceria com outras entidades da saúde coletiva “Bolsonaro inimigo do povo”, mostrou a nossa indignação com o discurso da morte feito pelo Presidente da República em março de 2020. Desde o início da pandemia, fizemos e/ou endossamos quase duas notas políticas por semana: entendemos o nosso papel em mobilizar a sociedade e denunciar os absurdos.
Comunicação Abrasco – O que você tem a dizer para aqueles que participarão da nova Diretoria?
Gulnar Azevedo e Silva – O Brasil fica cada vez mais difícil, mas a Abrasco continua viva e lutando por melhores condições de vida e saúde para todas e todos os brasileiros, pelo fortalecimento do SUS e em defesa da democracia. Chegamos até aqui juntos e inteiros e com muita vontade de continuar esse trabalho.
Desejo tudo de bom para os que estão assumindo a nova Diretoria. A Saúde Coletiva sempre deixou claro em que lado está da história. A Abrasco desde a sua criação tem defendido incansavelmente a democracia, lutado contra a desigualdade e pelo acesso universal à saúde. O que fizemos nesses três anos é fruto de uma construção que já vem há mais de 40 anos. Nós continuamos o trabalho dos muitos colegas que vieram antes de nós, que construíram para a Abrasco um espaço muito importante de atuação para o país. Quero agradecer aos meus colegas da Diretoria, às equipes da Secretaria Executiva e a nossa Comunicação. Muito obrigada a todos vocês. Vamos seguir acreditando que o Brasil vai mudar. Não vai ser fácil, mas vai mudar.