Na última sexta-feira (5/6) a Ágora Abrasco realizou mais um evento da série de encontros transdisciplinares que visam gerar subsídio científico para a criação de um Plano Estratégico de Enfrentamento à Pandemia de Covid-19 no Brasil. O painel Covid-19: Interface clínica/epidemiologia e os cuidados em saúde promoveu um diálogo de conhecimentos da medicina, epidemiologia e gestão da saúde, com exposições de Regina Santos, Glória Teixeira, Margareth Dalcolmo e Rubens Belfort Junior. A coordenação foi de Gastão Wagner, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp e presidente da Abrasco (2015 – 2018).
Regina Santos, vice-presidente da Associação Brasileira de Enfermagem e professora da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), pontuou que a pandemia faz a sociedade refletir sobre o que significa “saúde”, já que estar sem sintomas da Covid-19 não significa estar saudável. Para ela, ampliar a visão sobre uma sociedade saudável inclui, neste momento, garantir segurança aos trabalhadores na linha de frente: “Do ponto de vista dos profissionais de enfermagem, é preciso pensar que 60% das atividades são realizadas por ele. O escopo dessas profissões é o cuidado. São os profissionais de enfermagem que permanecem 24 horas por dia nos cuidados mais complexos, mais simples, mais íntimos com as pessoas. Esperamos que o poder legislativo se debruce sobre os projetos de lei que amparam este trabalho e analisem os riscos a que estão submetidos”.
Glória Teixeira, professora do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA), fez uma fala sobre a indissociabilidade dos conhecimentos clínicos e epidemiológicos. Para a epidemiologista, a união dos saberes foi imprescindível para que a Covid-19 fosse identificada tão rapidamente, ainda na China, e depois mapeada e registrada pelo resto do mundo. Ela afirmou que, em sua trajetória, nunca tinha visto a identificação tão ágil do R0 – termo utilizado em epidemiologia para indicar o nível de contágio de uma doença infecciosa: “Não fossem os clínicos percebendo que tinha algo diferente nas crises respiratórias – e não fosse os epidemiologistas percebendo que aquilo era relacionado a um grupo de pessoas, não teríamos o diagnóstico. Em menos de 2 meses que a OMS declarou uma emergência internacional, porque a clínica e a epidemiologia estavam anunciando que isso iria se expandir, porque o R0 é muito elevado”.
Margareth Dalcolmo, pesquisadora do Centro de Referência Prof. Hélio Fraga (Fiocruz), fez um breve relato sobre a chegada da doença no Brasil, e os principais desafios em âmbito clínico. Além da subnotificação, que prejudica as pesquisas epidemiológicas, a dificuldade de se encontrar tratamento ou cura pra doença está também em seu caráter sindrômico – compromete todo o corpo humano: “Como quem trata pacientes, fomos aprendendo muito rapidamente. Não há antecedentes na nossa história como profissionais de saúde para isso, mas, num período tão curto, já sabemos, por exemplo, que a doença compromete o aparelho cardiovascular. Ainda estamos distantes de qualquer solução, e neste momento temos alguns medicamentos que têm funcionado, e que são – se não promissores, alentadores, como a transfusão de plasma de pacientes convalescentes”.
Rubens Belfort Junior, presidente da Academia Nacional de Medicina e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) , denominou o avanço de mortes por Covid-19 no Brasil como uma “crônica da morte anunciada”, já que o subfinanciamento – mais recentemente desfinanciamento – do SUS representa uma excessiva fragilidade à população: “Não podemos esquecer a importância do Sistema Único de Saúde – não apenas pros pobres. A elite brasileira também precisa do SUS, não só de suas ‘boutiques’, planos de saúde. O pobre sempre sofre mais, claro, mas todos ficam expostos à gravidade da doença. Mas nós temos diferentes Brasil’s. Sem testagem adequada, como temos critérios científicos de maior ou menor isolamento? Abre tudo, vê o que acontece, daqui a duas semanas fecha de novo? As respostas não existem, e temos que ter a humildade de dizer : Não sei.”
Assista ao debate completo, na TV Abrasco: