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Juventudes e vulnerabilidades: sessão da Ágora Abrasco dá voz aos jovens

Thereza Reis

A sessão da Ágora Abrasco de 21 de julho foi diferente, pois teve a participação de jovens como painelistas. Os convidados puderam contar sobre os desafios do cotidiano deles durante a pandemia e as perspectivas para o período pós pandemia. Vindos de diferentes realidades e regiões do país, Mariana Xavier, mestranda em Saúde Coletiva do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), co-fundadora do Santa Cruz Universitário e mediadora na Agência de Redes para a Juventude; Oreme Otumaka Ikpeng, técnico em agroecologia da Rede de Sementes do Xingu; Tâmara Rios de Sousa, sanitarista e integrante do coletivo Observa Pop Rua; e Luciano Pimenta, produtor cultural, co-fundador da iniciativa Jovens Podem e integrante dos coletivos Vira Lata e Geração que Move, foram os protagonistas do painel Juventudes e vulnerabilidades na pós pandemia: desafios e perspectivas, escancararam desigualdades e invisibilidades agudizadas pela pandemia. A sessão foi coordenada por Rogéria Nunes, professora do Departamento de Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e membro do GT Promoção da Saúde e Desenvolvimento Sustentável (GT PSDS/Abrasco).

Mariana Xavier ressaltou que a pandemia reafirma o que já existe, que o ‘gargalo’ na educação é anterior à pandemia, e que há “disparidade de acesso às oportunidades, principalmente aos jovens negros de periferia, e que “a desigualdade à educação está totalmente atrelada ao racismo, pois os jovens pretos, que estão na periferia e que morrem todos os dias, são eles que não têm acesso à educação”, disse. Para Mariana Xavier, “Se tivéssemos uma educação de qualidade, hoje, talvez os efeitos da pandemia não estariam sendo tão cruéis”.

A mestranda falou sobre a invisibilidade dos jovens e citou o adiamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para data anterior à que foi votada pelos estudantes como exemplo das desigualdades no acesso à educação. “Em votação pública sobre a data ideal para a prova, entre os inscritos, os alunos optaram pela prova em maio e a opinião dos jovens não foi levada em consideração”, explicou. As provas acontecerão em janeiro de 2021, e não em maio, como votou a maioria dos alunos.

Mulher negra da periferia e que estudou em pré-vestibular social, Mariana encerrou sua participação falando da identificação com espaços e para que mudanças efetivas possam virar realidade. “A inspiração acontece na minha relação de troca com esses outros jovens”, pontuou.

A participação de Oreme Otumaka Ikpeng demonstrou, durante a realização da sessão, a desigualdade no acesso. Com a rede de internet instável, o jovem do Xingu encontrou problemas na transmissão, o que comprometeu a participação dele no painel, revelando que a ameaça aos povos indígenas vem de muitos lados. “A saúde dos povos indígenas já é precária, e a pandemia só piorou as coisas, inclusive com ameaças no campo da política”, afirmou o ativista ambiental.

Oreme Otumaka Ikpeng contou sobre preservação do meio ambiente, proteção do território e de como a Rede de Sementes do Xingu realiza seu trabalho, com o desenvolvimento de técnicas para ajudar as comunidades locais na geração de renda. Explicando sobre segurança alimentar entre os indígenas, o técnico em agroecologia disse que existem diferentes cenários. “São várias situações em que os indígenas se encontram. A gente produz aqui na aldeia, mas tem outros que não têm terras demarcadas e que precisam de doações de cestas básicas”, ressaltou.

Sobre a pandemia do novo coronavírus, Oreme destacou que são muitas as ameaças no interior do país e que uma delas é a chegada da Covid-19. “A nossa preocupação maior é que essa doença chegue na aldeia e que dizime a comunidade. As lideranças têm falado muito em ficarmos isolados por enquanto, para depois continuarmos a luta”, concluiu.

Tâmara Rios de Sousa falou sobre o trabalho com a população de rua e a importância da escuta, do encontro e da produção do comum. “São populações vulneráveis e estar no coletivo é pensar saúde para essas pessoas, com a potência que tem na rua”, afirmou. Refletindo sobre a pandemia, a sanitarista contou sobre as dúvidas e como há agravamento de questões e mais obstáculos. “Com a pandemia, entramos em questionamentos da nossa atuação, são muitas dificuldades em coisas essenciais, como acesso à água, por exemplo”.

A integrante do Observa Pop Rua falou sobre ‘pensar saúde fora da saúde’, vulnerabilidades e o conceito de redes vivas, do professor Emerson Merhy: “São as redes que a gente estabelece como estratégia de sobrevivência”, disse.

Tâmara Rios e Mariana Xavier falaram sobre linguagem, comunicação e política de cotas no painel da Ágora Abrasco e dos desafios que enfrentam cotidianamente. “Quando entrei na universidade, comecei a falar ‘difícil” e minha mãe não me entendia”, disse Tâmara. Mariana pontuou que “quando eu escrevo, eu escrevo para que outras pessoas consigam ler”.

Luciano Pimenta contou como na periferia “a responsabilidade de educar e acolher as pessoas é maior” e que se preocupa “com muita coisa que vem sendo desmontada pelos governos, muito está sendo perdido”, disse.

O produtor cultural contou da própria experiência e que demorou a se reconhecer como periférico, vindo de uma região vulnerável. Luciano Pimenta também lembrou que a bolsa que conseguiu para estudar em uma faculdade particular e, assim, conviver com pessoas vindas de outras realidades, “foi fundamental para realizar as ações (nos coletivos) que faço hoje”.

Em tempos de pandemia, Luciano explicou que estão distribuindo cestas básicas na região, mas que enxerga vários outros problemas para a juventude, e que vão bem além da Covid-19. “Outro dia, entreguei uma cesta a um garoto de uns doze anos. Conversamos por áudio do celular e ele disse que o queria mesmo era aprender a ler e a escrever”, finalizou.

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