Nesta terça-feira, 13 de dezembro, a jornalista Claudia Colucci, publicou em sua coluna na Folha de SP, artigo sobre a falta de importância do Sistema Único de Saúde – SUS na agenda dos brasileiros. Claudia comentou ainda sobre a participação do presidente da Abrasco, professor Gastão Wagner, no workshop “Desafios da Saúde no Brasil”, promovido pela Pró-Reitoria de Pesquisa da USP, que aconteceu no Instituto de Estudos Avançados da USP. Confira o artigo na íntegra:
A saúde voltou a ocupar o lugar de onde nunca saiu de fato: a liderança dos principais problemas do país. Segundo pesquisa Datafolha publicada no domingo, 33% consideram a assistência médica a grande falha do país e 16%, a corrupção, que neste último ano havia ocupado o topo do ranking. Não que neste período a saúde tenha melhorado. Ela só foi ofuscada momentaneamente pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT) e pelas inúmeras denúncias de desvios de recursos públicos que vieram à tona com a Operação Lava Jato.
De resto, a coisa continua de mal a pior. Faltam medicamentos, alguns básicos, em toda a rede de saúde, vários serviços estão reduzindo atendimento, as filas de espera por cirurgias eletivas estão a perder de vista. Sem contar as arboviroses (dengue, zika e chikungunya) que neste ano devem bater recorde histórico, ultrapassando a marca dos 2 milhões. Isso tudo em momento em que as pessoas estão perdendo o emprego (e, consequentemente, seus planos de saúde) e indo bater na porta do SUS. Como desgraça pouca é bobagem, há também o temor com os impactos do congelamento de investimentos federais no SUS ao longo dos 20 anos de vigência da PEC 55.
O interessante é que, a despeito de liderar por anos o ranking das insatisfações dos brasileiros, a saúde não mobiliza, não enche a avenida Paulista. Talvez porque os grupos com poder de mobilização não se identificam com o SUS, pouco se importam com o seu sucateamento. Na última quinta (8), médicos sanitaristas, economistas e outros especialistas da área debateram o assunto no Instituto de Estudos Avançados da USP (Universidade de São Paulo).
Uma questão importante levantada foi a desigualdade, explicitada nas taxas de mortalidade infantil na capital paulista.
Um mapeamento da Prefeitura de São Paulo, por exemplo, aponta duas vezes mais mortes de crianças nos bairros da zona leste, mais pobres, do que em Pinheiros, de classe média alta, na zona oeste. “Qualquer pesquisa de opinião coloca corrupção e saúde entre os temas de maior importância no Brasil. A desigualdade, porém, aparece como problema de menor importância, ao contrário do que ocorre na maioria dos países”, lembrou Gastão Wagner, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas e presidente da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva).
Para ele, a total desconsideração pelo ser humano pode ser vista em cidades mais feias, sem áreas verdes, na segregação horrenda das favelas e comunidades das grandes cidades sem saneamento básico. “Isso seria resolvido com R$ 15 bilhões, segundo estudos, o que são trocados. Temos tradição de desrespeito à população”, disse.
A médica sanitarista Ligia Bahia, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, defendeu a participação dos economistas em estudos e na defesa do SUS. “Precisamos que eles se metam na saúde. Não é possível que não falem em saúde, porque é de financiamento que mais falamos; é o maior problema.” Ela criticou a isenção fiscal de gastos com a saúde, que considera vergonhosa e uma das causas mais importantes dos problemas de caixa do SUS. “E nessa crise toda, o tema não chega às mesas de debates. O governo da Irlanda acabou recentemente com a dedução fiscal na saúde. Não se trata de ser de esquerda ou de direita. Na defesa pelo SUS, precisamos da economia”, disse. Além de economistas, o sistema público de saúde precisa também de bons gestores. A diferença que eles fazem pode ser vista nas ilhas de excelência do SUS. Muitas padecem da mesma falta de financiamento de outras unidades, mas conseguem se sobressair. O SUS precisa de gestores que, sobretudo, não fechem os olhos para o desperdício e para as fraudes.
O SUS também precisa de nós, mesmo que a gente ache, por ignorância ou preconceito, que não precisa dele. Faço minhas as palavras da Ligia. Não se trata de ser de esquerda ou de direita. Trata-se de exercer a cidadania, de ter consciência das suas obrigações e direitos, lutando para que sejam colocados em prática. E isso vai muito além de vestir uma camiseta verde e amarelo.