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Mais que aceitar diversidade de gênero, é preciso agir contra o cultivo da mentalidade homofóbica – por Jairo Marques

Vilma Reis

LGBT rinbow flag and clapping hands

Hoje celebra-­se o Dia Internacional contra a Homofobia. Em 17 de maio de 1990, a Organização Mundial de Saúde – OMS retirou o homossexualismo de seu rol de distúrbios mentais, deixando de considerar essa tendência como um desvio e, ao mesmo tempo, abolindo o termo (já que, na área de saúde, o sufixo “ismo” caracteriza uma condição patológica). Assim, dizer que a homossexualidade é vício, tara ou algo doença a ser curada passou oficialmente à categoria de ignorância e preconceito. E, por isso, 17 de maio foi declarado o Dia Internacional de Combate à Homofobia, quando pessoas de todo o mundo se mobilizam para falar de diversidade e tolerância. Para participar do debate, a Abrasco repercute o artigo do jornalista Jairo Marques, jornalista, repórter de Cotidiano na Folha de SP e professor universitário. Cadeirante desde criança, mantém o blog ‘Assim como Você’ e escreve a cada duas semanas sobre aspectos da vida e de cidadania.

Eu era muito pequeno para entender aquilo. Meu irmão chegava em casa chorando, trancava-­se no quarto e um silêncio atormentador tomava conta da família. Só no dia seguinte via em seu rosto, braços e pernas marcas roxas que sempre eram provocadas por “quedas de bicicleta”.

Também não compreendia quando os meninos, que circulavam muito mais que eu pela cidade, diziam que tinham visto meu irmão com um grupo de “desmunhecadores” e riam de mim, riam dele. Minha mãe não explicava, ele sempre se calava e a violência era “lavada” com desculpas sem pé nem cabeça. De lá para cá, décadas se passaram e ainda hoje os gays seguem pagando com a dor da punição ao corpo por sua orientação sexual, por sua maneira de se manifestarem ao mundo.

A intolerância continua municiando parte da sociedade com o preconceito que culmina com agressão, com ameaça à integridade de quem tem o legítimo direito de ser quem bem entender. Embora a lacuna de caráter que fomente a homofobia tenha no convívio social suas demonstrações mais toscas e impiedosas, é na família e nas rodas de amigos que a vala de ausência de amor e respeito ao próximo começa a ser escavada e a ganhar contornos de perversão.

Em vez do dividir a bola, ela é chutada contra o “veado” (isso quando não se chuta o “veado”), em vez de se encorajar a menina que se compreende como menino, ela é castigada pelo pecado que envergonha sei lá quem, é oprimida porque valores alheios, porque o que os outros entendem como vida, são diferentes da sua forma de ser. Mesmo com algum avanço geracional e com o fortalecimento em alguns setores sociais, que possibilitam a demostração de diversos modos de expressar o gênero, gays, lésbicas, bissexuais, transexuais, transgêneros, travestis continuam sendo empurrados para grupos identitários como forma de maior proteção e aceitação.

Não se admite “gayzice” no trabalho, na rua ou em lugares de decisões “sérias” e com isso pessoas são resumidas a estereótipos que as afastam de oportunidades e as fazem ocultar de si mesmas sua personalidade. Soma­-se, então, mais contribuição para a propagação de ódios. Onde há um gay vai haver também um potencial representante do espírito da leveza de encarar a vida, da inclusão, do acolhimento à diversidade. Não é à toa que, rapidamente, casais LGBTs têm liderado listas de pais adotivos de crianças negras, de crianças já um pouco crescidas, de crianças com deficiência.

Gays costumam sempre estar à frente de iniciativas que fomentam o bem comum, que buscam o aperfeiçoamento de mazelas cometidas pelo “serumano” e que afetam o “serumano”. Acolhem velhos, marginalizados, pobres. É só observar. Mais do que aceitar a diversidade de gênero, o país precisa agir contra o cultivo da mentalidade homofóbica, que persiste matando.

Não basta dizer que se respeita o arco-­íris se a alma não for impressa em multicores. Oxalá nesta quarta-­feira, em que se celebra o Dia Internacional contra a Homofobia, escolas, famílias, grupos organizados, entidades sociais e empresas dediquem algum esforço para ensinar ou reforçar aprendizado de que qualquer ação de violência contra formas de se manifestar humano afasta a todos de dias melhores.

 

 

 

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