Junto ao lançamento oficial da campanha “Eu Ligo 180 contra a violência contra a mulher”, realizado na última quarta-feira, 4 de junho, organizações de todo o país que atuam em defesa dos direitos das mulheres aproveitaram o evento para ir até ao Congresso Nacional sensibilizar deputados e senadores em defesa da Lei 12.845/2013, que regulamenta o atendimento obrigatório a mulheres vítimas de violência sexual na rede de saúde. Os grupos aproveitaram a oportunidade para buscar convencer os parlamentares a se posicionarem contra a pressão da bancada religiosa que quer barrar e retroceder na legislação sobre o tema.
A mobilização questionou os parlamentares sobre a Portaria 415. O documento normativo, que tratava do pagamento aos procedimentos de interrupção de gravidez nos casos previstos na legislação brasileira foi publicado no Diário Oficial da União em 21 de maio e sofreu seu primeiro ataque no dia 27, quando o líder do PMDB na Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, apresentou o Projeto de Decreto Legislativo 1487/2014 para sustar os efeitos da portaria. No dia 29, o Ministério soltou nota de revogação da portaria, alegando falta de acerto com os gestores municipais e estaduais, antes da publicação. A portaria não trazia nenhuma mudança na legislação, apenas especificava que todos os procedimentos inerentes ao aborto previsto em lei (estupro, risco de morte à mulher e anencefalia do feto) passariam a ser classificados como “Interrupção da gestação/antecipação terapêutica do parto” – corrigindo uma distorção histórica que mantém tais processos classificados como “curetagem”, uma técnica muito mais simples. A norma também adequava os valores repassados pelo Ministério aos serviços de saúde pela realização do procedimento. No mesmo dia, entidades, dentre elas a Abrasco, encaminharam carta ao MS questionando esse posicionamento à contramão dos Direitos Humanos e à liberdade e à saúde reprodutiva e sexual.
Na abordagem aos senadores e deputados, as organizações distribuíram documento público destacando a importância do cumprimento da Carta Constitucional, que desde 1940, entende como direito a interrupção de gravidez decorrente de estupro. A Abrasco é signatária do documento. Leia abaixo.
Aos Senadores e Senadoras da República,
Em defesa da dignidade e da vida das mulheres brasileiras!
Contra a violência, o estupro e o abuso sexual!
Repudiamos ataques à Lei 12.845/2003, que dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual
As mulheres, em todas as faixas de idade, são as principais vítimas de violência sexual no Brasil. Na maior parte das vezes são crimes perpetrados por homens próximos, parentes ou amigos da família. Esse crime provoca, muitas vezes, a gravidez indesejada da mulher agredida, o que agrava a violência que esta já sofreu.
A Lei 12.845, de 2013, obriga o atendimento no SUS às mulheres que decidirem abortar quando a gravidez for resultante de um estupro. Esta é, para nós, uma ação humanitária e um direito humano fundamental das mulheres. Contudo, esta semana, parlamentares conservadores exercem pressão sobre o Congresso Nacional para a revogação dessa Lei, o que para nós configura ameaça de violação dos direitos humanos da mulheres e de sua dignidade.
No Brasil, desde 1940, o Código Penal exime de punibilidade o aborto resultante de estupro, mas os serviços de saúde por vezes se negam ou estão despreparados para fazer o procedimento, obrigando as mulheres vítimas de estupro a buscarem formas clandestinas e inseguras de aborto. A lei 12.845/2013 protege as mulheres que necessitam de políticas públicas de saúde e serviços de qualidade. Sua revogação colocará em risco, particularmente, a vida de mulheres mais pobres, em sua maioria negras. De modo especial violará os direitos humanos de adolescentes e jovens vitimas de abuso sexual.
Senadores e Senadoras, o Estado brasileiro precisa cumprir a legislação vigente, de maneira completa e integral. É de vossa responsabilidade apoiar e acompanhar a implementação da legislação do país.
Pela manutenção integral da Lei 12.845, de 2013 que dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual.
Sem os direitos das mulheres, os direitos não são humanos !!!
Brasília, 4 de junho de 2014
ASSINAM:
1. Abrasco. Associação Brasileira de Saúde Coletiva
2. Anis. Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero – DF
3. Associação Casa da Mulher Catarina – SC
4. CDD. Católicas Pelo Direito de Decidir – Brasil
5. CEBES. Centro Brasileiro de Estudos da Saúde
6. CFEMEA. Centro Feminista de Estudos e Assessoria – DF
7. CEMICAMP. Centro de Pesquisas em Saúde Reprodutiva de Campinas – SP
8. Comitê Estadual de Estudos da Mortalidade Materna – PE
9. CLADEM. Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher – Brasil
10. CCR. Comissão de Cidadania e Reprodução – SP
11. CFESS. Conselho Federal de Serviço Social
12. Cunhã Coletivo Feminista – PB
13. Entre Nós Assessoria, Educação e Pesquisa em Gênero e Raça – SP
14. Grupo de Teatro Loucas de Pedra Lilás – PE
15. Grupo Curumim Gestação e Parto – PE
16. Grupo de Pesquisa sobre Gênero e Masculinidades – Gema/UFPE
17. Instituto Patrícia Galvão – SP
18. Instituto Papai – PE
19. REDEH. Rede de Desenvolvimento Humano – RJ
20. Rede Iluminar de Cuidados às Vitimas de Violência Sexual – Campinas – SP
21. Relatoria do Direito Humano a Saúde Sexual e Reprodutiva – Brasil
22. SOF SempreViva Organização Feminista – SP
23. SOS CORPO Instituto Feminista para a Democracia – PE
24. Superando Barreiras Campinas – SP
Movimentos, Redes , Fóruns e Articulações nacionais e internacionais signatárias:
1. Articulação de Mulheres Brasileiras – AMB
2. Articulação de Mulheres Negras Brasileiras – AMNB
3. Consulta Popular
4. Secretaria da Mulher Trabalhadora da CUT
5. Fórum de Mulheres do Distrito Federal e Entorno
6. Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto
7. Levante Popular da Juventude
8. Liga Brasileira de Lésbicas – LBL
9. Movimento Estratégico pelo Estado Laico – MEEL
10. Movimento de Mulheres Camponesas – MMC
11. Marcha Mundial de Mulheres – MMM
12. Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos Sociais, Culturais e Ambientais – Dhesca – Brasil
13. Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
14. Rede de Homens pela Equidade de Gênero – RHEG
15. União Brasileira de Mulheres – UBM
16. União Nacional dos Estudantes – UNE