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Nelson Rodrigues dos Santos e o Movimento da Reforma Sanitária Brasileira

Em todas as reuniões do Movimento da Reforma Sanitária Brasileira ele está lá, sempre muito atento, sempre dizendo que é o mais velho da turma, sempre conseguindo a atenção de todos com seus contributos encharcados de experiência e sensibilidade. Um líder histórico tanto da luta pela democracia quanto da Reforma Sanitária, Nelson Rodrigues dos Santos é graduado em medicina e com doutorado em medicina preventiva pela Universidade de São Paulo, respectivamente em 1961 e 1967, foi professor titular de Saúde Coletiva na Universidade Estadual de Londrina e Consultor da Opas/OMS. Atualmente, o abrasquiano Nelsão é professor colaborador da Universidade Estadual de Campinas e presidente do Instituto de Direito Sanitário Aplicado – Idisa.

Durante a reunião do Movimento da Reforma Sanitária Brasileiro no 3º Congresso de Política, na manhã do dia 3 de maio, em Natal, Nelsão lembrou a todos sua opinião sobre qual é o Sistema Único de Saúde que existe no Brasil – “Nós temos o SUS da Constituição, temos o SUS pós-constitucional e temos o SUS real, que é uma mistura dos dois. O SUS constitucional é o resultado da mobilização da população, consciente dos seus direitos, querendo uma política pública de direitos de cidadania. O SUS pós-constitucional é o SUS ditado economicamente pelo FMI e socialmente pelo Banco Mundial – tem dinheiro só para políticas focais e compensatórias; o SUS pobre para pobre. Os dois SUS convivem e conflitam permanentemente”.

A Comunicação da Abrasco gravou a participação de Nelsão na reunião do MRSB, foram 15 minutos de um apanhado histórico, confira:

“Fomos deixando que o grande capital tomasse conta do Estado e o SUS é um exemplo didático disso. O SUS foi a política pública que mais avançou, que foi mais aguerrida, que mais soube politizar ao final da ditadura e na construção da Constituição. É a luta que mais está escrita e amarrada na Constituição e, no entanto, muito mais que metade do dinheiro público para o SUS vai para o setor privado. Tanto por dentro do SUS – que contrata o setor privado pagando por produção, e por fora, com o Estado subvencionando fortemente o mercado de saúde dos planos privados. A lógica do mercado prevalece dentro e fora do SUS.

Ou seja, somos grandes perdedores dentro da política que mais avançou. A questão da apropriação do Estado pela sociedade foi uma bandeira das liberdades democráticas no final da ditadura, mas a partir dos anos noventa uma outra estratégia e intelligentsia, que nós subestimamos, tomou de nós o rumo a seguir. Tomamos um porre de vitória com a Constituição e achamos que o trabalho era só aplica-la, tirar do papel e colocar na prática. Mas apanhamos. Começamos a apanhar com o Collor, apanhamos muito mais com os tucanos e continuamos igualmente apanhando até hoje! Também depois de 2003 continuaram as privatizações, o mercado de saúde dentro e fora do SUS e foram fragilizando a sociedade no campo de lutas por seus direitos, incluindo o direito á saúde pelo SUS que dá certo.

Naquela época do final da ditadura a democratização do Estado implicava em reformas, que é uma palavra das forças populares! A reforma estrutural do Estado. E o SUS era uma reforma estruturante do Estado, assim como a reforma trabalhista, agrária, fundiária, previdenciária e tributária.

Esta luta era consequência da luta pela Constituição e foi vitoriosa, mas não conseguimos efetivar estas reformas até hoje. O SUS avançou a duras penas sozinho e agora a bandeira das reformas está sendo empunhada pela direita. Perdemos e temos que fazer auto crítica na prática. Então temos que responder algumas perguntas: qual é a nossa reforma previdenciária? Qual é a nossa reforma tributária? Qual é a nossa reforma política? E a nossa reforma da saúde – que está mais no papel do que na prática?

Temos que retomar e transformar estas nossas bandeiras de reformas em poder de mobilização. Tornar pedagógicas, atraentes, e emocionantes as nossas lutas. Por exemplo, quantos de nós, que estamos na linha de frente, temos clareza que a previdência social é superavitária? Quantos de nós, em nossa militância cotidiana, politizada, organizada, dos movimentos, tem esta consciência e clareza e revolta do que estão fazendo com o nosso dinheiro arrecadado? E quantos de nós, mobilizados e organizados, estamos dispendendo por dia, do nosso cotidiano, para transformar isso numa pedagogia diária? Investindo nosso tempo para facilitar que a população se aproprie disso. E não precisa ser alfabetizado nem intelectualizado para entender o que estão fazendo com o nosso dinheiro.

Infelizmente depois de 2003 tivemos reformas apenas superficiais e reversíveis, levando em consideração só a capacidade de consumo. Perdemos a chance de avançar reformas estruturantes. E o que vamos fazer agora? Na minha opinião, trazer novamente para o movimento popular o tema das reformas estruturantes. Precisamos dizer para a sociedade que o que temos hoje ainda não é o SUS da Constituição. O que temos é um arranjo público privado e com grande predominância do domínio privado de mercado por dentro do nosso Sistema Único de Saúde.

E quanto tempo nós dispendemos da nossa luta, corações e mentes, para outras lutas fora da saúde? Conforme fomos apanhando nas últimas décadas, fomos nos encalacrando dentro do próprio SUS, as nossas bandeiras da saúde foram ocupando literalmente, todo o nosso tempo. E este encalacramento intrasetorial nos descolou da solidariedade aos demais direitos da sociedade.

Precisamos agora nos questionar: o que nós do SUS sabemos da previdência? O que nós do SUS sabemos do ajuste fiscal? O que sabemos de educação? Para compartilhar, socializar e fortalecer a luta dos companheiros e companheiras desses setores que tratam também do direito da população?”

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