Por ocasião do falecimento do neto do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva devido à meningite meningocócica, houve intenso compartilhamento nas redes sociais da matéria do portal G1, de 10 de dezembro de 2010, intitulada “Lula veta inclusão de 5 vacinas no calendário nacional”. Em face da polêmica gerada, a Abrasco manifesta seu repúdio à disseminação de notícias e argumentos que levam a um entendimento equivocado do funcionamento do Sistema Único de Saúde – SUS.
O texto cita o veto integral do projeto de lei, aprovado na Câmara dos Deputados, que previa a inclusão da vacina meningocócica conjugada C e de outras vacinas no Programa Nacional de Imunizações, que é parte do SUS. Nas redes, houve profusão de associações entre a morte da criança e a suposta ausência da vacina meningocócica conjugada C no SUS.
A título de esclarecimento, cabe recuperar reportagem anterior do mesmo portal (“SUS passa a oferecer duas novas vacinas em calendário básico”, de 1 de fevereiro de 2010), que desfaz, perfeitamente, a controvérsia: “Duas novas vacinas serão incluídas no calendário básico de vacinação do Sistema Único de Saúde (SUS). A partir de março, crianças menores de 2 anos contarão com a aplicação gratuita da pneumocócica 10-valente e, a partir de agosto, da anti-meningococo C. As vacinas poderão ser tomadas gratuitamente em postos de saúde”.
Portanto, ao contrário do que foi ventilado, não há relação entre o óbito e o veto ao projeto de lei. A decisão para incorporar a vacina em questão no calendário vacinal obrigatório já havia sido tomada com base em critérios de custo-efetividade. No sítio do Ministério da Saúde, é possível verificar o portfólio de vacinas para crianças e adolescentes, disponível na rede pública e respaldado por fundamentos científicos e epidemiológicos no âmbito do Programa Nacional de Imunizações, entre elas a Meningocócica C e a Pentavalente, que previne difteria, tétano, coqueluche, hepatite B e meningite e infecções por Haemóphilus influenzae tipo B.
Os efeitos da introdução destas vacinas foram medidos em pesquisas recentes, como a de França et al. (Revista Brasileira de Epidemiologia, 2017) e de Bierrenbach et al (Human Vaccines & Immunotherapeutics, 2018), mostrando a diminuição dos óbitos por meningite entre menores de 5 anos no país. Isso demonstra resultados concretos dos investimentos em medidas de saúde pública para problemas de relevância para a sociedade brasileira.
Políticas públicas de saúde exigem constante aporte de recursos, compatível com a sua complexidade, e aprimoramento dos instrumentos e coordenação com as demais políticas. No caso das meningites, concerne ao poder público vigiar, permanentemente, a evolução dos sorogrupos na população, uma vez que a incidência de meningites tipo B, C e outras pode mudar ao longo do tempo, de acordo com a faixa etária, o que demanda atualização do cardápio de vacinas para evitar mortes por doenças preveníveis. Além disso, a oferta tecnológica de vacinas em nível mundial e que podem ser incorporadas ao calendário brasileiro da rede pública também se aperfeiçoa.
É responsabilidade do Estado, amparada na Constituição Federal, tomar as medidas de controle e prevenção cabíveis, incorporando novas vacinas sempre que justificado e viabilizando a vacinação em massa.
Entre as políticas, é importante destacar o papel da Comissão de Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS (CONITEC), criada em 2011, que, com base em análise de evidências, assessora o SUS nas tarefas de incorporação, exclusão ou alteração de tecnologias no SUS. Trata-se de processo que permite a melhor tomada de decisão e alocação de recursos técnicos, humanos e financeiros, livre de conflitos de interesse, privilegiando, sempre, o interesse público.
Desta forma, a Abrasco reafirma o seu apoio ao SUS e defende que a oferta pública de vacinas seja fortalecida e ampliada, acompanhando a evolução tecnológica e as evidências epidemiológicas, entendendo que mais e melhores recursos são imprescindíveis para um sistema de saúde público de alta qualidade.
Alertamos ainda que a disseminação das chamadas “fake news” pode trazer sérios prejuízos ao processo de fortalecimento do SUS e à saúde da população brasileira, devendo ser vigorosamente combatida por todos.
Aproveitamos para expressar ao ex-presidente e a seus familiares, nossa solidariedade e os nossos mais profundos sentimentos pelo falecimento de seu neto Arthur Lula da Silva, de 7 anos e, ao mesmo tempo, repudiar toda e qualquer manifestação sórdida e desumana nesse momento de dor ao qual todos nós somos passíveis.