POSICIONAMENTO ABRASCO 

Nota de solidariedade à população de Manaus

Associação Brasileira de Saúde Coletiva

  • Unidade de Pronto Atendimento (UPA) José Rodrigues, no bairro Cidade Nova, zona Norte da capital amazonense - Foto: Márcio James/Amazônia Real

A Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco – vem a público apresentar sua solidariedade à população de Manaus e demais municípios do Estado do Amazonas. A gravíssima situação sanitária, que tem levado ao desespero tantas famílias e profissionais de saúde, é a repetição de situações previsíveis e que poderiam ter sido evitadas, ou pelo menos minoradas, mediante ações efetivas de reforço à rede de serviços já existentes e planos de ação que articulassem esforços do governo federal e governos locais. O que se viu, mais uma vez, foi a omissão do governo federal em assumir o papel que lhe cabe no enfrentamento da pandemia de Covid-19, mediante o fortalecimento do SUS e a adoção de parâmetros científicos para o controle da epidemia. É flagrante a carência de medidas de proteção às populações vulnerabilizadas que vivem na região que reúne os piores indicadores sociais e sanitários do país. O caos sanitário instalado em Manaus é somente a ponta visível de um iceberg, expondo mais uma vez as insuficiências da rede de saúde em todo o Amazonas, largamente apontadas pelos sanitaristas que atuam na Região Norte.

Dados oriundos do órgão estadual de vigilância em saúde evidenciam aumento de 106% no total de casos confirmados de Covid-19 no último mês. Em consequência, a ocupação de leitos de UTI cresceu exponencialmente. Em 06 de novembro, havia 167 leitos de UTI ocupados, passando para 213 em 12 de dezembro, 299 em 27 de dezembro e 466 em 03 de janeiro e culminando em 672 leitos ocupados em 14 de janeiro de 2021. Declarações do Ministro da Saúde na imprensa  apontam a existência de quase de 500 pacientes na espera de um leio que hoje não existe. Mesmo os internados não têm garantia de cuidados, pois o acirramento da crise – igualmente previsível – eclodiu no dia 14 de janeiro, gerado pela falta de oxigênio na rede hospitalar. Foram inúmeros e dramáticos os apelos de profissionais de saúde pedindo voluntários para prover ventilação manual a pacientes de UTI, na tentativa desesperada de salvar os pacientes sob seus cuidados. A média de 125 enterros diários se manifesta na tristeza e luto dos familiares.

As medidas propostas pelas autoridades são insuficientes. É urgente um plano de gestão eficiente, responsável, com monitoramento, planejamento e ajustes para a garantia da vida. A anunciada transferência de pacientes para outros estados pode ser uma alternativa válida para os que lograrem uma remoção bem sucedida. Entretanto, além de não ser sustentável, dada a sobrecarga dos serviços de saúde no país como um todo, não terá impacto no curso da epidemia. A mutação viral é um evento natural, conhecido, esperado e inevitável, e não pode ser tomada como pretexto para a inação. O relaxamento das medidas de distanciamento físico e do uso de máscaras, além da falta de isolamento de casos e contatos, podem explicar melhor este aumento de casos. As iniquidades sociais e sanitárias da Região Norte são largamente conhecidas e há muito deveriam ter sido objeto de atenção do governo federal, em particular após o pico epidêmico dos meses de abril e maio, mundialmente noticiado.  

A população do Amazonas necessita de políticas públicas efetivas que possibilitem a oferta de cuidado adequado e o controle da disseminação do vírus. As autoridades sanitárias têm o dever de apresentar um plano de expansão rápida da força de trabalho, de leitos e de insumos que garantam acesso e resolutividade no atendimento e o direito de respirar, assim como um calendário claramente definido pelo Programa Nacional de Imunização (PNI) que possa atender, com prioridade, as especificidades do espaço e dos modos de vida dos amazônidas.

A Abrasco expressa seu pesar aos familiares e seu apoio aos profissionais de saúde que heroicamente atuam na linha de frente, salvando vidas e diminuindo a dor de tantas famílias. Transformemos nossa indignação num apelo para que toda a sociedade brasileira se solidarize com as pessoas que vivem em Manaus e nos demais municípios do Amazonas. É preciso cobrar das autoridades políticas e sanitárias federais, estaduais e municipais que assumam suas responsabilidades e exerçam adequadamente o papel que lhes cabe, investindo todos os esforços possíveis para reversão desse quadro e evitando que os tristes eventos de Manaus se repitam em outros locais do país.

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