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‘O mantra Use Camisinha se esgotou’ avaliam pesquisadores

O cenário da quarta epidemia de Aids no Brasil é alarmante. Não só porque o Rio Grande do Sul encabeça essa epidemia atual, mas porque a “prevenção” de acordo com a fala unânime dos integrantes da mesa “Mudando o Foco da Prevenção da Aids na Quarta Década da Epidemia”, no VI CBCSHS, está sendo gerida de forma equivocada ou desconsiderando a complexidade dos contextos envolvidos no processo. Não se trata de orientar as pessoas a deixar de usar camisinha, mas de oficializar que as práticas que elas fazem com o gerencimaneto de riscos são formas combinadas de prevenção somadas às ações preventivas já existentes, como o preservativo.

Wilza Villela, da Unifesp (SP), foi a primeira a apresentar dados do estudo “Avanços e desafios da prevenção do HIV/Aids em mulheres heterossexuais”, mostrando uma mortalidade relacionada a uma busca tardia e o desafio de se fazer dialogar o avanço do acesso ao tratamento a essa questão. De acordo com a pesquisa, a transmissão sexual por mulheres tem o número representativo de 89% contra 65% dos homens. A epidemia se concentra em adultos jovens, entre mulheres mais empobrecidas/menos alfabetizadas. Entre mulheres, a transmissão heterossexual é responsável por 90% dos casos e 7% entre as que praticam sexo por dinheiro ou troca. Outro dado importante é quanto à maior efetividade de transmissão no sexo anal receptivo.

Quanto à prevenção, uma questão também foi unânime: “o mantra do ‘use camisinha’ se esgotou”. Ele não serve mais como estratégia de discurso de estratégias de prevenção. Para enfrentar a quarta epidemia no Brasil é preciso uma prevenção combinada, como defende Nilo Martinez Fernandes, da Fiocruz (RJ). Para ele tem que se discutir e propor políticas públicas que utilizem uma prevenção ampliada que envolve perspectivas estruturais, biomédicas e comportamentais. “Não podemos mais exigir que as pessoas ‘usem camisinha’, é preciso considerar as singularidades”, ressaltou. As combinações preventivas envolvem tanto as tecnologias de prevenção tradicionais quanto as novas, passando pela Reprodução Humana Assistida, com lavagem de esperma e inseminação artificial; a PEP Sexual, método francês de autoinseminação na mulher; a Profilaxia Pós-exposição Sexual; o Teste Anti-HIV Domiciliar (com o desafio da janela imunológica); a Profilaxia Pré-exposição Sexual; Microbicidas; e Circuncisão. “É preciso considerar essas novas formas de prevenção com as formas tradicionais”, enfatizou Martinez.

Por outro lado, os expositores destacaram a falta de informação sobre os vários processos preventivos existentes hoje contra HIV/Aids ou mesmo DST. Gerir a prevenção atualmente no Brasil ainda carrega um atraso, considerado “moralista” por todos eles e por grande parte da plateia. Veriano de Souza Terto, da UFRJ, lembrou boa parte das propagandas preventivas em que a predominância “do falar sobre o sexo e a sexualidade” estavam presentes. “Hoje não se fala mais em sexo como na época do ‘Braulio’, que nos orientava a olhar para o pênis numa relação de diálogo. E as propagandas que tentam uma abordagem mais próxima desse objetivo são vetadas, substituídas ou transformadas em discursos moralistas”, enfatizou. Estudando comportamentos de práticas sexuais desde os anos de 1980, Veriano nos mostra considerações significativas para pensar o gerenciamento de riscos feito pelas pessoas. “Desde sempre as pessoas tomam decisões e criam formas próprias de gerenciar o risco. E isso vem acontecendo a partir do momento em que se instaurou um ‘cansaço’ do discurso do preservativo. As pessoas praticam a compensação de risco, gerem estratégias de comportamentos ‘soroadaptativos’, de ‘segurança negociada’, de ‘soroposicionamento’. As práticas não mudaram depois da PreP ou PEP, elas sempre existiram”, explica.

Veriano finaliza ressaltando que as práticas sexuais desprotegidas não significam ignorância, irresponsabilidade, negligência, mas uma compensação de riscos que vem se realizando desde sempre. “Trazer o sexo e as práticas sexuais para o centro da discussão da prevenção é mais urgente, como incluir a voz das pessoas e comunidades nesse debate”, pontuou.

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