A utilização de agrotóxicos nas cadeias produtivas e seu impacto para a saúde humana, meio ambiente e comunidades foi tema da oficina “Agrotóxicos e saúde: subsídios para a vigilância popular” no Pré-Congresso do Abrascão 2018 que aconteceu nos dias 24 e 25 de julho na Uerj. De acordo com as coordenadoras da Oficina, Karen Friedrich (membro do GT Saúde e Ambiente da Abrasco, além do Ministério Público do Trabalho e Fiocruz) e ainda Aline do Monte Gurgel (Da Fiocruz Pernambuco), a Vigilância Popular nas comunidades é importante para ajudar na identificação e construção de registro de efeitos colaterais causados pela utilização dos agrotóxicos. Depressão, má formação de bebês, câncer e contaminação do sangue são alguns dos problemas que podem que podem ocorrer.
Com esses dados, é possível oferecer apoio aos afetados e cobrar soluções por parte do Governo. Participaram da discussão professores e pesquisadores de universidades federais, Fiocruz e Inca, assim como representantes e militantes de causas sociais. Aline Gurgel doutora em Saúde Pública e pesquisadora da Fiocruz, não acredita em neutralidade na ciência. “Muitas vezes o conhecimento científico é feito para subsidiar o uso de agrotóxicos, disfarçando efeitos para a saúde e desqualificando outros estudos sérios”. Por isso, ela apresenta alguns dos argumentos mais utilizados em artigos com essa finalidade.
Aline explica que estudos afirmam que a exposição a baixas taxas não causa danos. No entanto, eles não levam em consideração agrotóxicos que têm seu impacto potencializado quando em interação com outro. Também não consideram os que são mais prejudiciais para o organismo humano em pequenas doses do que em grandes. Além disso, as pesquisam focam no risco de intoxicação aguda. Assim, acabam não considerando as doenças crônicas que podem surgir décadas após a exposição.
Outro ponto levantado pela pesquisadora é referente ao uso de Equipamentos de Proteção Individual. Eles são vendidos como forma de proteger o agricultor dos agrotóxicos. No entanto, como são criados para o uso em indústria e não na lavoura, a proteção não é tão efetiva. Por fim, ela diz que hoje a lógica da ciência é a de que se não são comprovados os malefícios dos agrotóxicos, ele pode ser comercializado. Mas o certo seria o contrário: um produto só deveria ser comercializado se provado que não causa danos.
Palestrantes apresentaram ao público três casos específicos de estados que estão sofrendo com o excessivo uso de agrotóxicos. Mato Grosso, Paraná e Ceará. Sendo representante dos três estados, eles mostraram dados em slides para relatar a situação preocupante das regiões. No Mato Grosso, por exemplo, havia suspeita de todas as nascentes no Rio Xingu, um dos rios mais importantes do país, estarem contaminadas. Já no Paraná, houve tentativas de reduzir o agrotóxico para a população, incluindo com a aprovação de uma lei em 2010 para fazer toda merenda escolar das escolas públicas do Estado com comida orgânica. No entanto, na prática apenas de 13% a 19% da merenda do estado é orgânica.
E no Ceará foi relatado o aumento da incidência de câncer em trabalhadores rurais e que 97% deles estão expostos aos agrotóxicos. Sobre a vigilância popular, uma das professoras participantes na sala provocou dizendo que não precisava nem de médicos nem de arquitetos para ela existir. Apenas do povo. A maioria dos presentes concordou.
Os assuntos discutidos servirão de insumo para a construção de um curso destinado à militantes do campo, abordando os impactos para a saúde, laborais e ambientais. O debate é parte preparatória do 12º Congresso Brasileiro de Saúde, o Abrascão, que acontece de 26 a 29 de julho na Fiocruz.
Ricardo Amorim e Brenda Ferreira são estudantes da Uerj e participaram do projeto de cobertura colaborativa para o Abrascão 2018, sob a supervisão de Vilma Reis, Bruno C. Dias e Hara Flaeschen