A saúde permanece em pauta em no Brasil estimulando acirradas polêmicas. Em sua dimensão humana básica, é vislumbrada como eterna demanda estampada nas páginas da grande imprensa e em acalorados debates nas redes sociais.
Entretanto, a nossa reflexão é que o retrato desse rico processo de discussão se volta para as dificuldades de acesso das famílias a recursos como ressonâncias magnéticas, medicamentos de última geração, hospitais e especialistas, o que desvenda, na realidade, não a preocupação com a produção de saúde, mas com a doença presente e instalada.
Segundo o psicanalista inglês Donald Winnicott (1896-1971), saúde não é o oposto de doença; é vida criativa com qualidade. O desenvolvimento sustentável do país requer incluir a saúde em todas as políticas públicas, considerando suas dimensões biológica, psicológica e social para construir um ambiente facilitador à vida.
Nessa perspectiva, deve-se trabalhar sua determinação político-social priorizando ações entre os diferentes setores e a articulação de diversas políticas, como universalização do saneamento básico, melhoria da mobilidade urbana, redução da poluição nas grandes cidades, garantia da moradia digna, educação pública de qualidade, universalização do acesso à creche e a garantia de que os alimentos consumidos não estejam contaminados por pesticidas.
São necessárias, além disso, ações para que possamos viver em liberdade, segurança e paz. A epidemia de homicídios, acidentes de trânsito e suicídios que, em conjunto, vitimou mais de 100 mil pessoas em 2012, expõe o drama social brasileiro.
Essa realidade, somada ao consumo de drogas e aos desafios femininos na gestação e no parto, deve ser compreendida e enfrentada como questão de saúde pública. É preciso que haja uma mudança radical nas atuais estratégias de enfrentamento, exigindo uma participação expressiva da sociedade na construção de novas soluções.
A construção de um ambicioso projeto de educação e de informação em saúde que permita criar uma nova consciência sobre saúde pública –que envolva toda a sociedade–, centrada na promoção e na prevenção como bases de um sistema inovador, está no cerne dessa visão.
Para isso, precisamos rever o padrão de formação de nossos médicos e demais profissionais da saúde –enfrentando a fragmentação e a hiperespecialização precoces–, os aspectos da sua distribuição no território nacional e a relação contratual com o SUS (Sistema Único de Saúde).
O caminho mais inteligente para avançar na integralidade e na humanização da atenção deve considerar a constituição de uma rede que supere a gestão desarticulada da assistência. É necessário retomar o debate sobre a regionalização da saúde como base organizacional do SUS por meio do Programa de Saúde da Família.
Temos um longo caminho a percorrer. É preciso compreender essa construção como um processo político-ideológico. Dele pode resultar uma consciência na qual possamos reconhecer o valor do SUS como política pública redutora de desigualdades, patrimônio do povo e expressão de conquista da cidadania.