O caminho que a comida passa até chegar na casa de cada cidadão depende de muitas decisões, investimentos e ações políticas. Diante de uma situação de emergência, como a que vivemos com a pandemia da Covid-19, essas ações precisam de um olhar especial para garantir abastecimento para a população e também a sobrevivência daqueles que produzem a comida, especialmente os pequenos agricultores e a agricultura familiar. Esse tema já foi inclusive alvo de fake news, quando o próprio presidente da República divulgou um vídeo sobre um falso desabastecimento em Belo Horizonte no início da pandemia por aqui. E foi derrubando mitos e notícias falsas que o painel Desafios e perspectivas para a Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional frente à pandemia de Covid-19 se deu no dia 28 de maio na Ágora Abrasco. O debate foi elaborado pelo Grupo Temático Alimentação e Nutrição em Saúde Coletiva da Abrasco e foi coordenado por Anelise Rizollo (OPSAN/UnB) e contou com as participações de Valeria Burity (coordenadora da Fian Brasil), Denis Monteiro(secretário executivo da Articulação Nacional de Agroecologia – ANA) e Elisabetta Recine (OPSAN/UnB).
Valéria Burity começou o debate analisando os impactos da atual política neoliberal e do autoritarismo crescente no país nos sistemas alimentares: “Quando você traz o neoliberalismo e autoritarismo pra questão dos sistemas alimentares, o que se vê é a destruição da natureza, aumento da fome, aumento da obesidade e aquecimento global. E quem luta contra isso é reprimido como violência”. A advogada também ressaltou o cenário das políticas alimentares e o quadro em que a pandemia chega ao país: “As políticas para manutenção da agroecologia foram reduzidas pelo governo Bolsonaro, assim como os programas de segurança alimentar. Há um aumento significativo da pobreza e da extrema pobreza. É nesse cenário que a pandemia chega no Brasil”.
Após a fala de Valéria, Denis Monteiro falou sobre agricultura familiar e como os programas de alimentação do país fazem parte de nossa democracia: “Essa alimentação que temos hoje é fruto da nossa democracia e das boas políticas públicas”. O agrônomo ressaltou que a ANA focará suas ações nas políticas de aquisição e distribuição de alimentos. Ele ainda abordou as iniciativas de solidariedade, que tem sido fundamentais durante o cenário de pandemia: “As iniciativas solidárias nesse momento têm sido importante para mostrar quem se preocupa com a alimentação do país. O MST mostrou isso fazendo doações de comida para quem precisa. Essas redes precisam ser visibilizadas, pois são fundamentais para as lutas políticas que vamos travar agora”.
A última debatedora foi Elisabetta Recine, que levantou a reflexão sobre como nossos sistemas alimentares contribuíram para chegarmos no estado da pandemia: “Tem um estudo que mostra a relação dos modelo industrial de produção de alimentos e a ocorrência das pandemias. Temos uma produção tão intensiva de produtos alimentares, que leva a graves problemas”. Elisabetta também apontou a relação entre programas de aquisição de alimentos e democracia e falou sobre a importância de iniciativas contra-hegemônicas: “O novo sistema alimentar já existe. Temos experiências contra-hegemônicas importantes. O que elas precisam hoje é que o Estado tenha condições de garantir os direitos humanos e o bem comum”.
Com o debate aberto ao público, foram levantadas diversas questões sobre a importância da participação da sociedade na construção das políticas de alimentação. O atual estágio de corte de verbas e de políticas pelo governo de Jair Bolsonaro nesse campo aumentou o número de pessoas na extrema pobreza. Além disso, foi levantada também a falta de políticas públicas de abastecimento de alimentos para a população, tendo em vista que nunca tivemos isso no país. Com relação aos avanços, os debatedores foram unânimes em apontar a importância das feiras e mercados de pequenos produtores, sendo inclusive vistos como ação de resistência.
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