“A ameaça é ecológica e ambiental, mas é existencial e afetiva. Não sairemos vivos, mas também não sairemos humanos, não sairemos bichos, não sairemos natureza se optarmos por adotar uma saúde global acrítica e colonizadora”: discursou Mônica Torrenté, presidente do 9º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, na cerimônia de abertura do evento. Cerca de mil pessoas ocuparam a Concha Acústica Paulo Freire, no campus da UFPE, na noite de 31 de outubro.
Torrenté afirmou que o tema do encontro – “Emancipação e Saúde: decolonialidade, reparação e reconstrução crítica”, convida para a reflexão sobre as feridas históricas da sociedade brasileira – racismo, misoginia, desigualdade social e “a persistente colonialidade”. Ao mesmo tempo, aponta caminhos – que devem ser trilhados juntos – para a esperança, a transformação social, a promoção da saúde e da vida:
Confira o discurso de Mônica Torrenté
“Formemos uma rede de aliados, aliadas e aliades, que reúnam os nossos mais velhos dos Quilombos ou das Florestas, os nossos mestres e mestras do saber, os nossos pesquisadores e pesquisadoras de todas as partes do mundo, os nossos jovens inquietos, quicá os espíritos dos nossos encantados. Tudo isso com a certeza de que: yo tengo tantos hermanos que no los puedo contar.”
Keila Brito, presidente da Comissão Organizadora Local do 9º CSHS, reforçou as muitas mãos que construíram o evento, por acreditarem na transformação e formação política também “por dentro” da ciência. São 17 pessoas na Comissão Organizadora Nacional; 43 componentes da Comissão Científica; e 61 compondo a Comissão Organizadora Local. Ainda 108 coordenadores dos Coletivos Temáticos, e 140 monitores.
Leia o discurso completo de Keila Brito
“Desejo que durante esses dias o solo fértil pernambucano favoreça a disseminação da produção de conhecimento na área das ciências sociais e humanas na saúde coletiva e proporcione um grande encontro formativo para docentes, discentes, pesquisadores, trabalhadores do SUS e movimentos sociais”, disse Brito.
A presidente da Abrasco, Rosana Onocko, abordou a construção teórica da Saúde Coletiva, brincando que o campo surgiu do encontro da Saúde Pública com as Ciências Sociais, ou então de um “trio” , incluindo as Ciências Humanas. Ela pontuou que a as Ciências Sociais e Humanas em Saúde significam possibilidades de uma outra sociedade, um instrumento para romper os muros de segregação.
“A porosidade social que o Brasil precisa só poderá ser atingida por meio de equipamentos públicos: escolas de tempo integral e cheias de atividades culturais que permitam a legítima afirmação das diferenças culturais; eliminação dos obstáculos de acesso aos direitos sociais, estratégia necessária para o restabelecimento de espaços de dignidade, para a recuperação das histórias passadas e recentes dos inúmeros extermínios vividos pelo povo brasileiro. Reparação que deveria passar por uma ampla reforma judiciária, parar de encarcerar a juventude preta e periférica. Nenhuma destas mudanças que propomos é utópica, impossível ou não cabe no orçamento brasileiro”.
Leia o discurso na íntegra de Rosana Onocko
Representando a ministra da Saúde, a abrasquiana Isabela Cardoso, Secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, afirmou que a realização do congresso é também uma oportunidade para “Nos unirmos ao grito pela paz, e manifestar nossa indignação frente aos horrores que temos assistido na Faixa de Gaza, ao genocídio contra o povo palestino”.
Cardoso disse, ainda, no contexto brasileiro, não é simples sanar a dívida histórica e construir todas as estratégias de superação das diversas formas de violência: “O enfrentamento das desigualdades exige de nós intensos movimentos de integração, unidos em diferentes frentes para a implementação de políticas que combatam todas as formas de racismo, xenofobia e intolerâncias”.
Participaram, ainda, da mesa da abertura Alfredo Macedo Gomes, reitor da UFPE; Pedro Miguel dos Santos Neto, Diretor do Instituto Aggeu Magalhães, representando o presidente da Fiocruz; Julio Pedroza, representando a OPAS; Luciana Albuquerque, secretária municipal de Saúde de Recife, representando o prefeito da cidade; Fernando Pigatto, presidente do Conselho Nacional de Saúde; e José Gilmar Costa , representando o Conselho Federal de Enfermagem.
A cerimônia foi transmitida pela TV Abrasco, assista na íntegra: