A procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, encaminhou ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pedido de proposição de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) dos artigos 2º e 3º da Emenda Constitucional Nº 86/2015, que reformulou os valores a serem aplicados na saúde pública no Brasil.
Em janeiro de 2015, o Congresso Nacional aprovou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) Nº 358, que deu origem à Emenda Constitucional Nº 86/2015, conhecida como “emenda do orçamento impositivo”. Entre outras medidas, a emenda estabeleceu um novo piso para o custeio de ações e serviços públicos em saúde, além de ter retirado o caráter de fonte adicional de recursos do pré-sal destinados a políticas públicas na área.
Para a PFDC, as mudanças são significativamente prejudiciais ao financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS), por admitirem uma drástica redução no orçamento destinado a ações e serviços da área: “a medida viola diversos artigos da Constituição Federal, além de descumprir o dever de progressividade na implementação dos direitos sociais – assumido pelo Brasil tanto no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, quanto no Protocolo de San Salvador”, destaca Deborah Duprat.
Com a Emenda Constitucional 86 o regime de gasto mínimo na saúde passou a corresponder a 15% da receita corrente líquida da União – sendo fixados subpisos progressivos de 13,2% para o exercício de 2016; 13,7% em 2017; 14,1% em 2018; 14,5% em 2019; e 15% a partir de 2020. Somente no exercício de 2016, a perda estimada é de, no mínimo, R$10 bilhões para o custeio da saúde pública dos brasileiros.
A PFDC destaca que a emenda foi aprovada em desconformidade com o Projeto de Lei Complementar Nº 321/2013 – fruto de iniciativa popular e apresentado ao Congresso Nacional com mais de 2,2 milhões de assinaturas. O PLC buscava o fortalecimento do SUS mediante a aplicação mínima de 10% da receita corrente bruta da União em ações e serviços públicos de saúde, em contraponto com os percentuais hoje vigentes, que incidem sobre a receita corrente líquida.
Não retrocesso – Na proposta de ADI encaminhada ao procurador-geral da República, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão destaca que o artigo 198 da Constituição Federal dispõe sobre as fontes de custeio da saúde e previsão de investimento mínimo anual a cargo da União, estados e municípios. “A legislação impede retrocessos no montante de recursos investidos no SUS. Ou seja, mesmo num cenário econômico negativo, fica preservado o valor do exercício financeiro anterior”, ressalta Duprat.
A proibição de retrocessos no campo dos direitos fundamentais também está fundamentada em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que em decisões anteriores já reconheceu que a violação à proporcionalidade de obrigações do Estado ocorre não apenas quando há excesso na ação estatal, mas também quando ela se apresenta manifestamente insuficiente.
O pedido de estudo da constitucionalidade da Emenda Nº 86/2015 foi apresentado à PFDC pela procuradora Élida Graziane Pinto, do Ministério Público do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. A solicitação da PFDC será analisada pelo procurador-geral da República – a quem cabe ingressar com ações de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.