Ricardo Barros é uma ameaça ao direito à saúde e ao SUS.
Nós, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), somamos-nos às entidades médicas exigindo seu afastamento.
Mais uma vez, ao discorrer sobre problemas de funcionamento do SUS, no caso, o trabalho médico, Barros atuou de maneira demagógica e inadequada ao seu cargo. Demagógica, porque apresentou proposta simplista para um problema complexo. Controle de ponto mediante o sistema de biometria – o que exigiria uma licitação e gastos milionários – sequer arranha a crônica falta de médicos e a péssima política de pessoal do SUS. Inadequada, porque o Ministro deveria utilizar o poder de convocação do Ministério da Saúde, por ele dirigido, para construir, com a participação dos estados, municípios e representantes de usuários e de profissionais, uma nova política de pessoal para o SUS. Vale lembrar que estados e municípios têm arcado com o principal ônus em relação ao gasto com pessoal: afinal, são responsáveis pela contratação e pela gestão de 96% da força de trabalho do SUS. Em realidade, as dificuldades com os profissionais do SUS são decorrentes de pelo menos dois fatores que o ministro jamais menciona.
Primeiro: apesar se seus vinte e sete anos, os dirigentes do SUS não construíram uma política de pessoal sequer razoável. Assistimos ao caos: precarização, desrespeito aos direitos trabalhistas, péssimas condições de trabalho, ausência de estratégia para controle de resultados, descuido com a formação, fragmentação institucional e um modelo de gestão entre o perverso e o de compadrio. Todos os cargos de gestão de serviços e de programas do SUS são de livre provimento pelos políticos de plantão. Nenhum governo anterior logrou alterar essa realidade. Tudo isto tem criado um péssimo ambiente de trabalho, comprometendo o relacionamento dos trabalhadores com os usuários e com os colegas e também destruindo a sustentabilidade de projetos e de mudanças positivas.
Todos os sistemas públicos de saúde (Inglaterra, Portugal, Espanha, etc.) que lograram efetividade e eficiência na utilização do orçamento público possuem carreiras nacionais exemplares. Carreiras que combinam direitos e autonomia aos profissionais com o asseguramento da responsabilidade com o cuidado dos usuários.
No Brasil, o Ministério da Saúde deveria tomar a iniciativa de romper com essa inércia e trabalhar para a progressiva construção de uma carreira nacional para o SUS, com alguns elementos centralizados e outros descentralizados e com um financiamento compartilhado entre União, estados e municípios, criando um Fundo Nacional para Política de Pessoal do SUS. Cada ente federado aportaria a esse Fundo recursos proporcionais ao seu orçamento para a saúde. Todos os profissionais seriam servidores do SUS do Brasil. Concursos de ingresso e gestão das carreiras poderiam ser realizados pelos estados, e a gestão do trabalho, principalmente, pelos municípios, hospitais, etc.
Enfim, cabe ressaltar que é papel do Ministério da Saúde tomar a iniciativa e articular estados, municípios e atores sociais para tratar dos problemas estruturais do SUS. A inércia compromete o direito à vida de milhões de brasileiros.
Segundo: o financiamento insuficiente tem funcionado como um entrave para o desenvolvimento do SUS. Infelizmente, contudo, esse déficit vem se agravando no governo Temer pela imposição de restrições orçamentárias e quebra de estados e municípios. Essa derrocada das instituições públicas decorre tanto do período recessivo quanto de governos centralmente voltadas para assegurar o interesse da elite econômica e política. Os entes federados estão sendo obrigados a priorizar o pagamento das dívidas, indexadas por juros exorbitantes, e não a atender, em primeiro lugar, à saúde, educação, segurança e aos cuidado com as cidades.
Em consequência, o SUS vem se enfraquecendo a cada dia, a cada mês: hospitais públicos e universitários fecham leitos, restringem procedimentos diagnósticos, cirurgias e até o atendimento às urgências. A Estratégia de Saúde da Família, em várias cidades, vem perdendo profissionais que compõem suas equipes, principalmente enfermeiros e médicos. Esta maneira ardilosa de destruir uma política pública, essencial para o povo brasileiro, precisa ser denunciada e interrompida. O Ministério da Saúde e, em grande medida, autoridades sanitárias têm sido cúmplices com esse genocídio anunciado.
Convocamos os gestores éticos e comprometidos com o SUS, os profissionais de saúde, a mídia, os movimentos sociais, as igrejas e toda a sociedade para que rompamos com este pacto antissocial. Que cada pessoa, grupo, movimento, denuncie este desmonte e se mobilize para o fortalecimento do SUS.
Para encerrar esta nota ainda há que se proclamar: Por outro Presidente da República, por eleições diretas, e por outra política para o Brasil.
Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde – Cebes
25 de julho de 2017