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Projeto de Lei que mudaria o nome ‘agrotóxico’ é arquivado

Vilma Reis com informações de Amelia Gonzalez / G1

No dia 24 de março, um projeto de lei foi aprovado por unanimidade pela representação brasileira no Parlamento do Mercosul sob coordenação do senador Roberto Requião (PMDB). Se não fosse o olhar atento da sociedade civil organizada, que rapidamente pôs holofotes sobre a questão, esse mesmo PL teria sido aprovado no Senado e o nome “agrotóxico” estaria a um passo de ser substituído pela expressão “produtos fitosanitários” na legislação brasileira.

De autoria do deputado Álvaro Dias, que em janeiro deste ano se desfiliou do PSDB e passou a fazer parte do PV-PR, o projeto acabou sendo arquivado uma semana depois, pelo próprio deputado, depois de uma tremenda repercussão negativa nas redes sociais.

Pode parecer uma bobagem lutar contra a troca de uma nomenclatura, mas não é. Assim como também existem razões muito claras para que a bancada ruralista da Câmara esteja insistindo nessa substituição. Para saber exatamente o que está por trás desse imbróglio e trazer informações frescas para os leitores, a jornalista Amelia Gonzalez procurou a educadora Fran Paula, do Mato Grosso, que há cinco anos representa a ONG Fase na Campanha Permanente contra o Uso do Agrotóxico e Pala Vida. Assim que soube da aprovação do projeto no Parlamento do Mercosul, Fran Paula escreveu uma carta para o Senador Requião esclarecendo o ponto de vista da sociedade civil organizada e a encaminhou, com cem assinaturas.

Além dessa carta, toda a movimentação nas redes sociais pode ter ajudado para que o próprio deputado Álvaro Dias arquivasse o Projeto, sob alegação de que é preciso mais tempo para analisar as manifestações virtuais.

“Estamos respirando aliviados, mas não podemos deixar de ficar atentos. Porque existem outros projetos de lei que estão circulando na Câmara, no Senado, com o mesmo objetivo. Na verdade, hoje mesmo recebi uma mensagem dizendo que há um outro Projeto de Lei circulando na Câmara ainda mais perigoso. Este, pretende afastar o Ibama e a Anvisa do sistema regulatório ”, disse-me Francileia Paula de Castro, a Fran Paula, do Mato Grosso, pelo telefone.

Abaixo, parte da conversa de Amelia Gonzales e Fran Paula. A íntegra pode ser lida no site do G1.

Este espaço no Mercosul funciona como uma espécie de apoio para o setor legislativo do Brasil tomar decisões?
Fran Paula – Sim, é um espaço propositivo, de um parlamento dentro do Mercosul, que discute relações comerciais entre países que compõem o bloco. No caso do Brasil, alguns senadores assumem uma representação, como o Roberto Requião assumiu esta. O debate se deu lá dentro, eles podem aprovar algumas propostasna tentativa de forçar outros países a adotarem. Isso não quer dizer que tudo o que for aprovado lá será implementado, tem que passar antes pelo nosso sistema legislativo.

É quase uma forma de dizer: se a nível internacional já conseguimos apoio, por que não aprovar aqui?
Fran Paula – É isso. Esse Projeto de Lei, na verdade, já estava circulando há algum tempo no Senado, foi apreciado pelo Mercosul no dia 24 de março e, para nossa surpresa, foi arquivado. Mas tivemos que agir rápido para dizer a todo mundo o que está em jogo, verdadeiramente, por trás desse pedido de mudança na nomenclatura.

E o que é que está em jogo?
Fran Paula – A justificativa dos parlamentares que apoiaram a mudança é o que eles chamam de harmonização da nomenclatura desses produtos. Mas o que acontece é que o debate – e acompanhamos muitos deles durante todos esses anos de campanha – sempre buscou fazer o alinhamento com vistas ao comércio, a facilitar a circulação de mercadorias, sem levar em conta nenhum aspecto envolvendo a saúde e o ambiente. São interesses econômicos das empresas que comercializam e que exercem uma forte pressão sobre os legisladores. A intenção real é livrar a produção brasileira desse marketing negativo que é gerado pela palavra agrotóxico.

Se você me diz que a palavra agrotóxico exerce já um marketing negativo em quem compra os produtos, então é uma boa notícia para quem luta contra o uso abusivo desses produtos, não?
Fran Paula – De uma certa forma, sim. Mas tem um outro fator ainda mais forte. O Brasil, desde 2008, ocupa o lugar de maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Isso fez queimar nosso filme junto a países, sobretudo na Europa, que têm maior preocupação com os malefícios causados por esses produtos. Na verdade, a intenção com essa mudança de nomenclatura é livrar a produção rural do Brasil desse marketing negativo adquirido em anos de uso abusivo. Portanto, o debate não é nem para se regular mais o uso, para racionalizar mais. É só mesmo para mudar o nome e poder vender mais. Isso fica claro, por exemplo, no parecer do Senador Dario Berger (PMDB) aprovando a alteração do nome. Ele diz: “O uso da expressão ‘agrotóxico’ atenta contra a valorização da produção rural brasileira”, e que “O termo tem representado uma campanha de marketing negativa para a produção rural brasileira.”

De que maneira a troca de nome iria impactar os agricultores na ponta da cadeia, aqueles que usam o produto na lavoura?
Fran Paula – Os menos avisados com certeza iriam tomar poucos cuidados com o uso dos produtos que contém, na verdade, venenos ao organismo humano. Além disso, o Brasil, no Mercosul, é o país que tem uma legislação, nesse sentido, mais forte. Claro que há várias limitações para que ela seja cumprida, mas o fato é que essa lei foi fruto de muita luta da sociedade, dos ambientalistas, dos militantes da saúde e dos movimentos sociais. Uma das vitórias foi, justamente, a afirmação de lei do termo agrotóxico. Mudar essa nomenclatura mexe com todo o sistema de registro e fiscalização. Isso nos apavora.

Há outros Projetos de Lei em curso com o mesmo propósito?
Fran Paula – Sim, precisamos estar muito atentos, sempre, porque a bancada ruralista da Câmara tem 50% de deputados ligados ao agronegócio, que se interessam em flexibilizar mais a legislação para aumentar as vendas. Veja, hoje mesmo eu fiquei sabendo que há um PL circulando no Senado que pretende afastar o Ibama e a Anvisa do sistema regulatório e deixar só com os setores da agricultura.

 

 

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