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Regionalização da política de saúde: solução envolve os três níveis de governo

Hara Flaeschen

Para garantir que o Sistema Único de Saúde alcance e atenda toda a população brasileira – considerando a pluralidade dos grupos sociais, a extensão territorial e a diversidade geográfica – é preciso descentralizar os serviços e ações de saúde pelo país. Este foi o tema do segundo seminário promovido pela Abrasco em parceria com o Observatório do SUS (ENSP/Fiocruz) – “Desafios da regionalização da política de saúde no Brasil: obstáculos e alternativas” – que aconteceu no último dia 20. 


Rosana Onocko Campos, presidente da Abrasco, abriu o evento afirmando que o encontro, assim como o anterior, sobre financiamento do SUS, foi dividido em dois momentos: primeiro, mesas redondas abertas ao público. Em seguida, grupos de trabalho com pesquisadores e gestores da saúde de diversas regiões do país, com o objetivo de elaborar propostas. 

“Quando a gente fala das questões pendentes do SUS, há alguns consensos ético-políticos, como a necessidade de regionalização e de garantir mais recursos. Mas quando nos aproximamos do campo técnico, de forma mais pragmática, não há consenso sobre como tirar do papel. Precisamos pensar em alternativas”, destacou Onocko. 

Já Marco Menezes, diretor da ENSP, expôs que os seminários também produzem reflexões sobre os diversos atores que constroem o SUS – para além do Ministério da Saúde. “Qual é o papel do parlamento na gestão do dia a dia do SUS? Quando falamos de regionalização, também estamos falando desse processo. A gente tem um ponto central: como aprofundar, inovar e aperfeiçoar o controle social e a gestão participativa?”. 

A regionalização da saúde é um processo de alta complexidade

Ana Luiza Viana, coordenadora da Plataforma Região e Redes, participou da primeira mesa  “Desafios do federalismo brasileiro e os condicionantes da regionalização da política de saúde”. A pesquisadora explicou que não existe regionalização sem um movimento de descentralização: política, financeira e administrativa. “O federalismo não é descentralizado, há ciclos centralizadores também. Não é uma distribuição particular de autoridade, a autoridade é distribuída e redistribuída”. 

A regionalização da saúde é um processo de alta complexidade, e, segundo Viana, é necessário construir vários tipos de autoridade/inteligência compartilhada. Ela destacou que, desde 2011, não há uma política nacional de regionalização, mesmo com mais protagonismo dos estados: não há políticas estaduais definidas, tampouco planos, metas, prazos ou documentos orientadores.

Governo federal lança Conselho da Federação

Elaine Licio, da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, corroborou com a perspectiva de que, nos últimos anos, as mudanças na coordenação das políticas federais -, influenciadas por crises fiscais, perspectivas neoliberais e uma gestão federal menos favorável ao diálogo federativo – levou ao fortalecimento dos estados com a criação de consórcios estaduais e fóruns de governadores, sobretudo durante a pandemia de Covid-19. 

Como resposta do governo federal a esta questão, Licio anunciou o lançamento do Conselho da Federação, que, inspirado em experiências nacionais e internacionais, promoverá um espaço de diálogo – entre municípios, estados e federação – baseado em evidências, negociação e pactuação. “Não existe uma solução única, pois o problema envolve os três níveis de governo. A criação de uma perspectiva comum sobre os desafios da federação é o primeiro passo, e várias narrativas precisam ser consideradas”, explicou. 

A mesa contou, ainda, com a participação da deputada federal Ana Pimentel (PT/MG) , que integra a Frente Parlamentar em Defesa do SUS. Ela expôs a  complexidade da agenda política da saúde no parlamento, pontuando que ocupar a agenda pública com as pautas da Saúde Coletiva  “é uma responsabilidade da academia no Brasil, inclusive para contribuir com o governo federal”. Rosana Onocko coordenou o debate. 

MS anuncia Política Nacional de Atenção Especializada em Saúde

A mesa “Estratégias de regionalização: alcances e limites” reuniu José Angelo Machado, pesquisador da UFMG; Helvécio Miranda Magalhães Júnior, Secretário de Atenção Especializada à Saúde do Ministério da Saúde, e Roberta Sampaio (Coordenadora Executiva do Fortalecimento do SUS da SESAB). 

“Uma garantia nacional plena não é uma garantia nacional básica: ela se afirma como garantia para todo e qualquer brasileiro, independentemente do estado ou município em que residam. Isso implica uma força centrípeta que requer a descentralização da gestão dos prestadores de serviços de saúde para os municípios.A questão que se coloca é como prover uma atenção plena à saúde em um sistema onde a gestão é descentralizada. Nesse contexto, é crucial que o Estado assuma um papel central na coordenação”, iniciou Machado. 

O pesquisador defendeu que uma das soluções para promover essa coordenação é a criação de consórcios intermunicipais, acordos voluntários em que municípios compartilham responsabilidades. Esses consórcios podem ser autorizados pelo conjunto de membros e devem obedecer a normas nacionais relacionadas a regiões previamente definidas no estado e aprovadas. Além disso, é importante estabelecer metas físicas e financeiras para o atendimento em média e alta complexidade.

Helvécio Miranda foi aplaudido pelo público ao anunciar a instituição da Política Nacional de Atenção Especializada em Saúde para o SUS: a portaria foi publicada na manhã de 20 de outubro. Ele disse que, para melhorar o acesso à Atenção Especializada em Saúde,  não basta ampliar a oferta, é necessário intervir nos processos de organização, gestão e no modelo de financiamento desse braço do SUS. 

Uma das estratégias para diminuir a iniquidade entre os municípios, segundo ele, é pleitear que o Ministério da Saúde tenha a gestão da Comissão Nacional de Residência Médica: o órgão deve ter gerência sobre a formação dos profissionais de saúde que atuarão no SUS. 

Roberta Sampaio trouxe  a experiência do estado da Bahia, que, nos últimos anos, investiu em regionalização: “Ou a gente entende que a política eleitoral é parte do processo, ou regionalização nenhuma vai dar certo. Precisamos saber quem são os prefeitos para medir o tempo , esforço e estratégia de negociação”, contou. A mesa foi coordenada por Mariana Albuquerque, da ENSP.

Oficinas reuniram gestores e pesquisadores

Eduardo Melo, à frente do Observatório do SUS e da organização dos eventos, avaliou que as  oficinas que ocorreram na parte da tarde aprofundaram a discussão:  “A dinâmica do grupo, que contou com pesquisadores e gestores, permitiu desenvolver a análise precisando melhor as nuances de alguns nós críticos  da regionalização , conhecer melhor as experiências e, especialmente , formular algumas proposições de estratégias que, esperamos, sejam úteis para os formuladores e decisores de políticas para as regiões de saúde”.

Confira o evento completo, transmitido no Youtube da ENSP:

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