Quando a austeridade chega, as peças que sustentam a universidade, a saúde, a educação, a ciência e o meio ambiente caem, uma a uma, provocando o desabamento de toda uma sociedade. Por meio de uma grande instalação erguida na Explanada dos Ministérios e em três dias de intensa mobilização, a Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência (SBPC) e suas afiliadas, dentre elas, a Abrasco, realizaram uma série de atividades de organização e convencimento da sociedade e de pressão junto aos parlamentares para evitar um golpe de morte na produção do conhecimento científico no país.
A agenda começou com a 3ª Marcha pela Ciência, que reuniu cerca de mil pesquisadores e estudantes na Avenida Paulista, no domingo, 08 de outubro. No dia seguinte, já em Brasília, foi instalado o Fórum Permanente de Associações Afiliadas à SBPC, em reunião ocorrida na Universidade de Brasília (UnB). Cerca de 50 entidades científicas e acadêmicas, instituições representativas da área de educação e C&T nacionais e institutos de pesquisa e representantes da Frente Parlamentar em Defesa da Ciência, Tecnologia, Pesquisa e Inovação debateram estratégias de convencimento e pressão. Livros gigantes representando a universidade, a saúde, a educação, a ciência e o meio ambiente foram montados um sobre os outros, como se derrubados num “efeito dominó”. O “ato cenográfico” buscou mostrar o impacto dos cortes promovidos pela Emenda Constitucional 95/2016 sobre essas áreas essenciais ao país.
O contingenciamento dos recursos para o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e Comunicações (MCTIC) reduziu, neste 2017, o orçamento de custeio e investimento em CT&I para apenas R$ 3,2 bilhões – um terço do valor de 2014 – R$ 8,4 bilhões. O cenário para 2018 é ainda mais catastrófico. A previsão de recursos para o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) é suficiente para cobrir as despesas para o pagamento dos 100 mil bolsistas somente no primeiro semestre do ano. Os recursos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Apoio ao Pessoal do Ensino Superior (Capes) também sofreram redução de cerca de 32% na proposta do Projeto de Lei do Orçamento Anual (PLOA 2018); assim como os recursos não reembolsáveis do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que podem cair de R$ 4,5 bilhões para R$ 350 milhões, o que corresponderá a apenas 8% do valor arrecadado por esse fundo e que o governo Temer não quer aplicar conforme o decreto.
Tais números estão na “Carta aos Parlamentares Brasileiros” e foram apresentados na audiência pública realizada pela Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados na terça-feira, dia 10. Ildeu Moreira, presidente da SBPC, lembrou aos parlamentares que 23 ganhadores do prêmio Nobel enviaram uma carta ao presidente Michel Temer, alertando que os cortes podem comprometer o futuro do Brasil. “Nos envergonha que a gente veja que cientistas do exterior, desse alto quilate, tenham mais sensibilidade com a ciência brasileira que nossos governantes”, afirmou o dirigente, conforme traz a matéria da Agência Câmara Notícias. Junto à audiência, foi entregue a petição pública que exige o fim do contingenciamento, com mais de 82 mil assinaturas recolhidas pelo movimento Conhecimento sem Cortes. A petição continua aberta a novas assinaturas. Participe!
Saúde Coletiva presente: Mário Scheffer, professor do departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (DMP/FMUSP) e vice-presidente da Abrasco esteve presente às atividades e têm acompanhado de perto a movimentação. “Nós da Saúde Coletiva estamos mobilizados para apontar a diminuição no financiamento do SUS, mas também a imensa redução do orçamento público para Ciência e Tecnologia, incluindo de universidades públicas , Capes e CNPq. Todo esse cenário terá repercussão em nossos programas de pós-graduação, nas bolsas de produtividade, de mestrado e doutorado. São as nossas pesquisas – tanto as novas como as em andamento – que estão ameaçadas”.
Assim como Ildeu Moreira, Scheffer aponta que, com a sobreposição de retrocessos e de perdas de direitos, muitos estão ocupados com outras agendas. Mas faz-se necessário priorizar também a frente da Ciência, Tecnologia e Inovação. “Até mesmo a comunidade científica internacional parece mais sensibilizada do que muitos de nós com a gravidade do momento. Precisamos nos mexer. A Abrasco tem estado presente, mas é fundamental que alunos, docentes e pesquisadores dos nossos programas e cursos de Saúde Coletiva estejam engajados e em movimento nas próximas marchas pela ciência e nas ações propostas pela SBPC “, convoca o dirigente.