Em matéria publicada no jornal Folha de S. Paulo em 12 de agosto, lideranças da saúde brasileira criticam as propostas sugeridas pelo presidente do Senado Federal, senador Renan Calheiros, e abraçadas pela presidenta Dilma Roussef a respeito da cobrança de serviços por faixa de renda, determinada pelo Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) e contra a aplicação de medidas judiciais aos procedimentos de saúde ainda não homologados. Ambas as propostas constam do conjunto de medidas nomeadas de Agenda Brasil, anunciadas no dia 11.
Entrevistado por Eleonora de Lucena, José Gomes Temporão, ex-ministro da Saúde no governo Luiz Inácio Lula da Silva (2007-2010) e membro histórico da Abrasco, criticou duramente a proposta. “A proposta de cobrança no SUS é uma ideia desbaratada que não resolve nada. Politicamente é um desastre e conceitualmente é um equívoco: é radicalmente oposta ao que está na Constituição. Significa mais uma tentativa de colocar sobre as famílias brasileiras o ônus do financiamento da saúde.”
“Estado de choque” foi a expressão utilizada por Temporão para definir sua sensação sobre o pacote encaminhado pelo Senado ao Planalto.”Quando vi a proposta, achei que estava delirando, voltando aos tempos da ditadura militar, com ideias desse tipo, como as de Leonel Miranda [ministro de 1967 a 1969], que propunha a privatização de toda a saúde brasileira”.
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Temporão cita as deliberações do 11º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva – Abrascão 2015 -ao comentar que, como redigido na matéria, ” um congresso do setor pediu o aprofundamento no financiamento à saúde”. Ele reforçou a recepção negativa da proposta pelo movimento sanitário: “Soa mais como uma provocação do governo em relação à saúde pública. Não há ninguém no setor que sustente uma proposta que é absolutamente nefasta para a saúde no país”.
Em sua página pessoal numa rede social, Temporão foi além nas críticas e reforçou a citação ao Abrascão: “Lendo os tópicos relativos à saúde na tal Agenda Brasil custo a crer no que vejo. […] Uma semana após a Abrasco ter aprovado a Carta de Goiânia e de divulgar um documento que discute em profundidade os impasses do financiamento do SUS e os rumos para a saúde brasileira, o governo propor como solução para o financiamento do SUS o co-pagamento de procedimentos por faixa de renda, soa como provocação! […] Todos sabemos que uma das distorções estruturais do financiamento é a participação do gasto privado no gasto total. Essa proposta agrava ainda mais esse aspecto, além de não atacar nenhum dos problemas estruturais do financiamento da saúde no Brasil. A questão da judicialização também é fortemente impactada pela base restrita de financiamento que impede o acesso a tecnologias custo efetivas. Ou seja são duas propostas desastradas cujo único objetivo parece ser atrair a ira das entidades que defendem a saúde pública brasileira e o SUS!”
A matéria da Folha de S. Paulo ouviu também Carlos Ocké-Reis, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e membro do Conselho Consultivo do Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes), que identifica na proposta mais um movimento no sentido da mercantilização da saúde pública no país.”Introduzir a prática de compra e venda de serviço dentro do SUS significa realinhar os incentivos econômicos dos prestadores. A literatura mostra que se acaba criando uma dupla porta e se oficializa uma qualidade diferenciada: quem paga tem acesso mais rápido e melhor dentro do sistema”, declarou. Confira aqui a matéria completa.