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Uma estratégia de luta e resistência em defesa do SUS

Vilma Reis com informações de Flaviano Quaresma / IMS

“Compreendemos que essa é uma estratégia de luta e resistência em defesa do SUS”, ressaltou Gulnar Azevedo, diretora do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – IMS/ UERJ, e membro da Comissão Científica do Abrascão 2018, na abertura do debate “SUS 2018: ameaças e desafios”, que aconteceu na tarde desta quarta-feira, 15 de maio, em seu auditório. Gulnar explicou que: – “Este debate faz parte de uma programação que temos desenvolvido desde 2016, com o objetivo de pensar a conjuntura social brasileira e o SUS. Realizamos eventos em meio a exacerbada crise da UERJ, com meses sem salários, e até hoje continuamos aqui resistindo. As várias atividades realizadas no Instituto de Medicina Social foram consideradas atividades de mobilização, e este debate sobre o SUS 2018 não é diferente. Essas atividades transcendem e articulam os três departamentos do IMS porque respondem às perspectivas definidas pelo Instituto como um todo. Compreendemos que essa é uma estratégia de luta, de resistência, e principalmente estratégia de defesa do SUS”, ressaltou Gulnar.

Com moderação do pesquisador e professor Felipe Asensi (IMS/UERJ), o SUS foi debatido pelo coordenador da Comissão de Política, Planejamento e Gestão em Saúde da Abrasco, professor Eduardo Levcovitz e ainda por Ligia Bahia (IESC/UFRJ) e Cristiani Vieira Machado (ENSP/Fiocruz) que trouxeram as inúmeras problemáticas de 30 anos de um sistema único de saúde, que vem resistindo aos trancos e barrancos as investidas explícitas de desmantelamento realizadas por governantes, empresários, pela mídia e até mesmo pelo funcionalismo público.

Eduardo Levcovitz relata que “os mais antigos”, como ele, têm com certa frequência, uma sensação de fracasso porque o período de suas vidas é muito curto do ponto de vista dos processos históricos. “É claro que quando alguém resolve se dedicar à política pública, à mobilização social ou coisa do gênero, há uma certa ‘síndrome de cirurgião’, particularmente a gente que tem uma formação na área médica: eu vou cortar, vou abrir, vou costurar e está arrumado”. Essa constatação se deve ao fato dele considerar que qualquer mudança social é um processo de longo prazo. Levcovitz afirma concordar com Cristiani Vieira que no debate atual é indispensável recuperar elementos históricos para entender o SUS contemporâneo, o que os neoinstitucionalistas chamariam de dependência de trajetória. “Vinte anos atrás, quando estava terminando minha tese de doutorado no IMS, eu trabalhei com uma periodização. Por exemplo, nos anos de 1990 começava um período que eu acabei nomeando naquele momento de ‘técnico-operacional’, quando boa parte das questões institucionais, científicas e de conformação do campo estava consolidada”, conta. O pesquisador e professor do IMS ressalta que mesmo sem querer estar vinculado a uma dependência de trajetória, considera que um dos conjuntos de ameaças ao SUS de hoje vem de fatores que poderíamos chamar de históricos-estruturais constituídos no nascedouro da proposta e na sua evolução nos anos 80 e 90.

Ligia Bahia, do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro e também membro da Comissão de Política da Abrasco, começa sua participação cantando “Eu tenho tanto pra lhe falar…”, e explica que com 62 anos de idade e totalmente envolvida com o SUS, o que não faltam são palavras para falar sobre o Sistema Único de Saúde brasileiro. Mesmo assim, a pesquisadora ressaltou que para o debate “SUS 2018: ameaças e desafios”, era preciso pensar no ano de eleição para o Brasil. Sendo assim, Ligia apontou a necessidade de se conhecer o SUS contemporâneo, e lançou outro desdobramento de sua linha de pensamento que é o fato de estarmos com sérias dificuldades de vislumbrar alternativas de saída para a crise pela qual passa o Sistema Único de Saúde. “Nossa usina de ideias fechou. Entretanto, precisamos reabrir. Ampliar, renovar as perspectivas, a nossa capacidade de formulação, de propor, de incidir sobre as eleições 2018, que vão depender exatamente de como e quanto podemos ter propostas para apresentar tanto para as candidaturas majoritárias quanto para as proporcionais”, disse. Ligia também parte do contexto das incertezas e amplia o cenário de crise apontando para o cenário global e reforça o caso brasileiro em especial pelos fatos de estarmos enfrentando uma crise econômica, social, de criminalização política. “Todas as possibilidades de saída estão obstruídas. Se é uma crise política é claro que a saída é política, mas se se criminaliza a política então não tem saída pela política. Portanto, as incertezas são imensas”, ressaltou. A professora e pesquisadora do IESC disse não saber se precisamos ser marxista, neoinstitucionalista, mas saber de Saúde Coletiva, porque trata-se de um campo do conhecimento rico. “O Louis René Villermé afirmou a existência do gradiente, ou seja, de que a riqueza e a pobreza determinam as condições de saúde, esta é uma evidência científica comprovada por ele em seus estudos. E o Villermé não é marxista, juro por Deus… ou por Marx. Não precisa ser marxista para chegar a essas evidências”, pontuou.

Cristiani Vieira Machado, da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz), iniciou sua fala enfatizando que vivemos um momento de desconstrução e incertezas, muitas questões e poucas respostas. Para ela, o agravamento parte de 2016, quando há um movimento de drástica ruptura com o pacto constitucional de 1988 e ataques à democracia, aos direitos trabalhistas, aos direitos sociais, ao sistema de saúde. Sem sombra de dúvidas, uma conjuntura grave e que tem especificidades, para qual defende que vários problemas a partir desse período têm raízes anteriores e que precisam ser compreendidos. “Saúde é fundamental para o bem-estar nas sociedades e deve ser tratada como bem coletivo, na esfera do bem comum. Nesse sentido, é um direito de cidadania, direito de todos: sistemas universais, de caráter público no financiamento, provisão, sob planejamento e regulação estatal; mecanismos de participação e controle social que levem o Estado a cumprir o seu papel de redistribuição social e de contenção dos padrões individualizantes de mercado. Essa foi a proposta do SUS, defendida pelo movimento da reforma sanitária e inserida na Seguridade Social na Constituição de 1988”, afirmou. De acordo com Cristiani, em todo o período de implantação do SUS, observaram-se contradições em eixos estratégicos para a sua consolidação, como a expressão da disputa de projetos e do conflito distributivo. “É importante considerar na reflexão sobre ‘ameaças e desafios’ atuais ao SUS, as relações entre estrutura, conjuntura, agência política; as relações entre os planos internacional e nacional; e as relações entre democracia, modelo de desenvolvimento, sistema de proteção social e saúde”, ressalta. Olhando para o passado e presente, a pesquisadora da ENSP vislumbra desafios: a defesa da democracia (formal e substantiva); a defesa de um projeto de nação soberana e voltada para o bem estar dos cidadãos; a defesa do pacto constitucional de 1988; de direitos que são anteriores, como na esfera do trabalho; de direitos expandidos posteriormente, como os de grupos vulneráveis; e a defesa da Seguridade Social e do Sistema Único de Saúde, como sistema público e universal, baseado na saúde como direito de cidadania.

Confira aqui o texto, fotos e outros vídeos produzidos pelo jornalista Flaviano Qauresma (IMS / UERJ).

 

 

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