Nós, do Núcleo de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual – NAVIS, do HC-FMUSP, e do Núcleo de Ética e Direitos Humanos – NEDH, da FMUSP, declaramos o nosso total repúdio à Portaria do Ministério da Saúde no. 2.282 de 27 de agosto de 2020, que aos dispor sobre procedimento de justificação e autorização da interrupção da gravidez nos casos previstos em lei, no âmbito do Sistema Único de Saúde, torna obrigatória a notificação à autoridade policial pelo médico, demais profissionais de saúde ou responsáveis pelo estabelecimento de saúde que acolheram a paciente dos casos em que houver indícios ou confirmação do crime de estupro, no prazo de 48 horas.
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Todos os avanços conquistados ao longo dos últimos anos para o acolhimento e atendimento às vítimas de violência sexual estão ameaçados com tal afronta aos direitos sexuais e reprodutivos, e também constitucionais, dessas pessoas e da equipe de profissionais, cuja atuação é regida pelos respectivos códigos de ética, tendo como princípios a preservação do sigilo e privacidade das vítimas em uma relação de confiança.
O disposto na portaria expõe as vítimas, que chegam já constrangidas, envergonhadas e emocionalmente vulneráveis aos serviços médicos de apoio, a mais uma violência, ao fazer com que sejam revitimizadas quando encaminhadas para uma delegacia policial.
A portaria dificulta ainda o atendimento ao aborto legal previsto em lei de 1940, ao estabelecer procedimentos administrativos sequenciais que criam obstáculos ao direito de escolha da mulher.
As mulheres NÃO merecem esse ato desumano e de retrocesso no respeito à sua dignidade e na proteção dos seus direitos sexuais e reprodutivos.