“A comida de verdade é a essência da vida”, esse é um dos itens do Manifesto Final da 6ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CNSAN), que aconteceu de 11 a 14 de dezembro de 2023, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília (DF). Com o tema “Erradicar a fome e garantir direitos com Comida de Verdade, Democracia e Equidade”, o evento com mais de 2 mil participantes trouxe importantes contribuições para aprimorar políticas públicas.
A 6ª CNSAN marca não só a retomada do evento, mas a recriação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea), feita em fevereiro deste ano no governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva. As conferências deste tipo ocorrem desde 1994 e a última estava marcada para 2019, quando o ex-presidente da República Jair Messias Bolsonaro extinguiu o Consea via Media Provisória, o que causou indignação e repúdio de diversas entidades, inclusive da Abrasco.
Na mesa de abertura, mediada pela presidente do Consea, a professora e pesquisadora Elisabetta Recine, houve destaque na fala dos convidados para diversos fatores que dificultam o acesso da população a alimentos de qualidade. O professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Tiaraju Pablo D’Andrea enfatizou a difícil situação dos moradores de periferias brasileiras e os impactos na saúde dessas populações.
“A realidade das periferias urbanas é essa: come-se mal, a partir da imposição das grandes corporações no comércio local…isso causa graves desdobramentos. Várias enfermidades, que acometem a população pobre, moradora dos grandes centros, têm relação com a má alimentação. Obesidade, pressão alta, diabetes, infarto, desnutrição e falta de vitaminas, que vai ter como decorrência outras enfermidades”, afirmou.
Na abertura oficial do evento, o Governo Federal apresentou os três novos decretos que fazem parte da estratégia de segurança alimentar e nutricional. Entre as medidas estão: o Decreto nº 11.820, que institui a Política Nacional de Abastecimento Alimentar; o Decreto nº 11.821, que define as diretrizes para alimentação saudável em escolas; e o Decreto nº 11.822, que implementa a Estratégia Nacional de Alimentação Saudável nas cidades.
Ao longo dos três dias de atividades, 23 Grupos de Trabalho (GTs), discutiram estratégias para promover a produção e o acesso a alimentos. As particularidades de cada localidade foram consideradas, bem como a valorização da cultura alimentar local. Com a participação de membros do Governo Federal, pesquisadores, movimentos sociais e sociedade civil organizada, a 6ª CNSAN foi uma oportunidade para traçar estratégias e promover ações integradas, visando uma sociedade mais justa.
A professora da UERJ e coordenadora do GT Alimentação e Nutrição em Saúde Coletiva da Abrasco, Inês Rugani, celebrou a diversidade e qualidade das discussões feitas no evento e destacou as principais contribuições da Conferência.
“Os principais resultados formais são o relatório de propostas – um conjunto amplo aprovado e as 128 propostas selecionadas pelos GTs como prioritárias – e o Manifesto, uma carta política da Conferência para a sociedade. A nossa leitura de quais são as questões fundamentais e determinantes nesse cenário de fome e desigualdade…nossa visão de futuro e compromisso em fazer esse futuro acontecer”, declarou.
O Manifesto Final da 6ª CNSAN, também com contribuições das conferências livres, municipais e estaduais, foi aprovado por 2.400 delegados, na quinta-feira (14), último dia do evento. No texto, é cobrada a retomada da implementação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan). “Convocamos os poderes públicos, em parceria com organizações da sociedade civil, a fortalecer a democracia e retomar com vigor a implementação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan)”, reivindicam.
O documento indica ainda ter havido um aumento da pobreza, fome e má nutrição entre 2016 e 2022 no Brasil, e reivindica que a as três esferas de governo “garantam políticas públicas com mecanismos efetivos de prevenção, mitigação e gestão de conflitos de interesse e que assegurem o direito humano à alimentação adequada”. Ainda há destaque para a urgente necessidade de redistribuir terras para as reformas agrária e urbana, assim como a demarcação de terras indígenas e a titulação de territórios de povos e comunidades tradicionais.