Começa de maneira infeliz o período de Gilberto Occhi à frente do Ministério da Saúde. Já em sua primeira declaração, dada ontem, 02 de abril, durante a cerimônia de posse, Occhi afirmou que seguirá orientação do ministro anterior para formular um decreto que permita aos municípios darem nova utilidade às Unidades Básicas de Saúde (UBS) e às Unidades de Pronto Atendimento (UPA) construídas com recursos da União, mas ainda não em funcionamento. Com uma afirmação vaga de uso múltiplo dos equipamentos públicos, a ideia é permitir que as prefeituras façam uso diferente do qual foram tais construções foram pensadas e projetadas, ou que possa haver uso compartilhado dessas edificações. Procurado pela jornalista Lígia Formenti, setorista de saúde do jornal O Estado de S. Paulo, Gastão Wagner, presidente da Abrasco, criticou a declaração. “Uma simples ocupação não resolveria nada. Pode colocar a saúde de crianças em risco e adia a resolução de um problema histórico no País, que é a falta de acesso a serviços de atenção básica”, disse o professor da Unicamp.
Com a proximidade do prazo de descompatibilização para a disputa eleitoral de 2018, mais uma vez o Ministério da Saúde serviu de moeda de negociação e barganha para acomodação de interesses políticos. Interessado em disputar a reeleição à deputado federal, Ricardo Barros apresentou carta de demissão a Temer e da reunião saiu com uma nova missão: presidir a Comissão Mista do Orçamento no Congresso Nacional. Com a vacância da cadeira, logo surgiu o nome de Occhi para o Ministério, dando assim possibilidade de acomodar de interesses do Partido Progressista (PP). Procurado pela imprensa, ele negou inicialmente, mas o Planalto confirmou posse no último dia 31.
Nascido em Ubá (MG), Gilberto Magalhães Occhi formou-sem em direito e fez carreira como funcionário da Caixa Econômica Federal (CEF). Foi ministro das Cidades do governo Dilma Rousseff, em 2014, e, com o golpe, conduzido à presidência da CEF.
A mudança ministerial e a instrumentalização política do cargo também foram pauta do site Outra Saúde, projeto do portal Outras Palavras. A jornalista Maíra Mathias ouviu José Sestelo, pesquisador associado do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do IESC/UFRJ e vice-presidente da Abrasco. “Claro que o processo de instrumentalização não se iniciou com o golpe. O Ministério da Saúde foi objeto de barganha político-partidária no tempo do PT. Agora, não há dúvida que no governo Temer – e com o Ricardo Barros – isso tomou uma dimensão nunca dantes imaginada. No entanto, há uma diferença substantiva entre os dois períodos. O assunto ‘saúde’ passou a ser secundário na pauta do próprio Ministério e na agenda dos seus principais gestores políticos”, analisou Sestelo.
Leia abaixo a parte da matéria de O Estado de S. Paulo que traz a participação de Gastão Wagner e acesse aqui a publicação original. Clique aqui para ler a matéria O PP no controle do SUS, do site Outra Saúde.
Abrasco critica ideia de postos de saúde e creches funcionarem no mesmo prédio
A ideia de permitir que prédios construídos para Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) sejam também usados para abrigar creches e escolas foi criticada pelo presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Gastão Wagner. O ministro da Saúde, Gilberto Occhi, afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo que a ideia está em estudo no Planalto, é apoiada por ele e por seu antecessor, Ricardo Barros.
“A planta dessas obras não foi feita pensando em escolas, creches. Como permitir um uso compartilhado?”, questionou. Ele lembrou que, em alguns países, há o uso múltiplo de prédios públicos. “Mas isso foi feito de forma planejada. O que eles querem, agora, é consertar um processo que foi encaminhado de forma errada. Assim, certamente não dará certo”, completou.
Wagner, que é também professor da Unicamp, observou que os prédios construídos para ser UPAS ou UBS são espaços restritos, que dificilmente podem abrigar também crianças. “E como se pode fazer uma creche num lugar que rotineiramente recebe pessoas doentes?”
Além dos riscos para crianças, Wagner ressalta que o simples reaproveitamento dos prédios retarda ainda mais as falhas na assistência à saúde. “No Brasil falta cobertura em unidades básicas. Temos 30%, 40% das pessoas assistidas enquanto o ideal seria 80%”, observou. É esse o porcentual considerado adequado de cobertura em países que têm modelo de assistência universal, como o do Brasil.
“Uma simples ocupação não resolveria nada. Pode colocar a saúde de crianças em risco e adia a resolução de um problema histórico no País, que é a falta de acesso a serviços de atenção básica.”