“Laurita Vaz, primeira mulher a presidir o STJ, negou – durante o recesso do Judiciário– pedido para que uma lactante respondesse ao processo em casa”: a notícia é do jornal Estado de S. Paulo. A detida é ré primária e foi presa no dia 7 de janeiro, portando 8,5 gramas de maconha, um pouco menos que uma colher de sopa da erva. Ela amamenta um bebê de um mês de idade – e é mãe de mais quatro – mas, para a presidente do STJ, não é indispensável para as crianças.
Um mês depois, outro caso ganhou repercussão na mídia nacional: Jéssica Monteiro, de 24 anos, foi presa, grávida, portando 90 gramas de maconha – também ré primária. Ela entrou em trabalho de parto um dia depois da detenção e foi levada com o bebê recém-nascido para uma cela pequena e sem condições mínimas de higiene, dormindo sobre uma espuma no chão, em uma delegacia de São Paulo (G1). A princípio, teve o pedido de prisão domiciliar negado, no entanto, depois de ação da Ordem dos Advogados Brasileiros (OAB) e movimentos de direitos humanos, o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu habeas corpus (O Globo).
Amanhã, 20/02, o Supremo Tribunal Federal julgará o Habeas Corpus nº 143.641/SP, que pleiteia a revogação da prisão preventiva decretada contra todas as gestantes, puérperas ou mães com filhos de até 12 anos de idade sob sua responsabilidade ou, alternativamente, a concessão da ordem para substituir a prisão preventiva pela prisão domiciliar. A Abrasco está como amicus curiae do processo, ou seja, habilitou-se a elucidar pontos relevantes e a contribuir para a preservação do interesse público e o melhor julgamento da demanda – enquanto organização científica e política.
Um dos argumentos que embasa a petição é a pesquisa coordenada pela abrasquiana Maria do Carmo Leal, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca – ENSP/Fiocruz: “Nascer nas prisões”, o primeiro Censo brasileiro sobre a Saúde Materna e Infantil nas Prisões. Os resultados analisam casos entre agosto de 2012 e janeiro de 2014, apontando que 2% das 23.782 mulheres encarceradas encontravam-se grávidas e, no período de um ano, 272 presas tiveram seus filhos no cárcere.
Cerca de 400 crianças (das quais 370 com menos de 1 ano) viviam com suas mães nas prisões brasileiras[1]. Além disso, 90,3% das mulheres detidas com filhos não engravidaram na cadeia, isto é: não foi uma ação premeditada para que obtivessem o habeas corpus.
+ Assista ao documentário “Nascer nas prisões | Impacto Social”
[1] SIMAS, Luciana et al. “The Brazilian Jurisprudence about Motherhood in Prison”. Working Paper, Oxford human Rights Hub, vol. 2, nº 7. University of Oxford, Faculty of Law: fevereiro 2016. Disponível em http://ohrh.law.ox.ac.uk/wordpress/wp-content/uploads/2015/07/Working-Paper-Series-Volume-2-No-7.pdf.
Veja também dados apresentados em LEAL, Maria do Carmo et al. “Nascer na prisão: gestação e parto atrás das grades no Brasil”. Ciência & Saúde Coletiva, 21(7), 2016. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/csc/v21n7/1413-8123-csc-21-07-2061.pdf e http://www.scielo.br/pdf/csc/v21n7/en_1413-8123-csc-21-07-2061.pdf.